terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Comunidades do Estácio e de Santa Teresa serão as próximas a serem pacificadas

As favelas das regiões do Estácio e de Santa Teresa serão as próximas a serem pacificadas na cidade do Rio de Janeiro, afirmou hoje (25) o governador do estado, Sérgio Cabral. Neste momento, duas áreas do Rio de Janeiro estão passando pelo processo de pacificação: o Complexo do Engenho Novo e os Complexos da Penha e do Alemão, todos na zona norte do Rio.

O processo de pacificação das favelas dominadas por grupos armados ilegais começa com uma ocupação militar, comandada pelo Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar. Depois de algumas semanas de varreduras em busca de armas, drogas e criminosos, a comunidade então recebe uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).

Além das duas áreas que estão passando pelo processo de pacificação (Engenho Novo e Complexos da Penha e do Alemão), já há 13 áreas do Rio de Janeiro com Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), a maioria na zona sul e região da Tijuca, áreas mais nobres e menos violentas da cidade.

Segundo Cabral, para atender às três novas áreas que receberão UPP neste ano, serão formados 5 mil novos policiais militares até o final deste ano.

As UPPs ocupam apenas 40 das cerca de mil favelas que existem na cidade do Rio de Janeiro e que são controladas por milícias ou por traficantes de drogas, segundo apontou pesquisa recente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Mesmo com a ocupação das três novas áreas (Alemão/Penha, Engenho Novo e Estácio/Santa Teresa), ainda existirão mais de 900 favelas sob controle de criminosos armados na cidade.

*Reportagem publicada na Agência Brasil

Nelson Jobim diz que Exército é intransigente com desvios de conduta de militares no Alemão

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, afirmou hoje (25) que o Exército não vai aceitar desvios de conduta de militares que integram a Força de Pacificação dos Complexos da Penha e do Alemão, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro. Na última semana, o Exército afastou 30 militares suspeitos de roubar pertences de moradores da comunidade.

Uma sindicância foi aberta para apurar a participação de cada militar no episódio do furto. Segundo Jobim, a decisão do Exército de investigar e afastar os militares é importante, para que desvios de conduta não “contagiem” os demais militares.

“O Exército é absolutamente intransigente nesse tipo de situação. Isso precisa se tornar exemplar para os demais”, disse Nelson Jobim, durante evento no Complexo do Alemão.

O Exército ocupa o conjunto de favelas, junto com policiais fluminenses, desde o final de novembro do ano passado.

*Reportagem publicada na Agência Brasil

domingo, 16 de janeiro de 2011

PM vai prender comerciantes que cobrarem preços abusivos em Nova Friburgo

O comandante-geral da Polícia Militar do Rio de Janeiro, coronel Mário Sérgio, mandou prender todos os comerciantes que forem flagrados cobrando preços abusivos por alimentos, água e velas no município de Nova Friburgo. Segundo o comandante, ordem semelhante será repassada aos policiais de todas cidades atingidas pelas chuvas na região serrana do estado.



“Ninguém pode explorar a dor dos outros, se aproveitar da agonia da população para vender, por exemplo, um pacote de velas [que custa em torno de R$ 1,50] por R$ 10. Quem a gente encontrar fazendo isso será preso e levado diretamente ao Ministério Público”, disse o comandante.



Segundo o subchefe administrativo da Polícia Civil, delegado Fernando Albuquerque, por enquanto os policiais estão dando prioridade à identificação dos corpos e à manutenção da segurança da cidade. Mas, em um segundo momento, haverá a investigação de crimes contra o consumidor, cujas penas são de dois a cinco anos de prisão, sem fiança. Em alguns locais, segundo moradores, há galões de água que custam R$ 6 sendo vendidos por até R$ 40.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Chega de abuso policial: Somos cidadãos, não somos bandidos

Ontem, durante cobertura ao desastre de Nova Friburgo, policiais militares apontaram uma arma para minha cabeça e me deram voz de prisão. Me acusaram, junto com a equipe da TV Brasil de que estávamos espalhando o boato de que uma barragem havia se rompido na cidade.

A acusação era totalmente absurda, uma vez que, no momento em que o boato se espalhou, eu estava entrevistando o comandante fuzileiro naval no hospital de campanha que eles estavam montando dentro da prefeitura.

Eu fui evacuado da prefeitura pelos próprios fuzileiros navais, que estavam, junto com policiais, orientando a população a buscar locais altos para se salvar da suposta inundação.

A prisão aconteceu minutos depois da descoberta de que tudo não passava de boato, quando eu já tinha voltado para a prefeitura e entrevistara o secretário de Comunicação, justamente para esclarecer o fato.

Eu saía da prefeitura junto com o câmera e o auxiliar da TV Brasil da prefeitura, quando três PMs alucinados apontaram armas para nossas cabeças.

Os momentos foram rápidos, mas minha mente ficou com a imagem marcada do cano de uma pistola prateada apontada para mim, enquanto um policial cheio de ódio gritava para mim.

 VOCÊS ESTÃO PRESOS, PORRA!!! - gritou o “educado” policial.

- Mas o que está acontecen...? - Tentei perguntar.

- CALA A BOCA!!! - gritou mais uma vez o “preparado” agente do Estado, para quem vai parte do IPVA que eu pago. - FICA JUNTO DOS OUTROS (da equipe da TV Brasil, que também fora abordada).

Outros dois policiais berravam para o meu motorista e os dois funcionários da TV Brasil, enquanto, ameaçadoramente, também apontavam armas para eles.

Estava perplexo e tentei, por alguns minutos, entender por que eu, um repórter, trabalhando para informar o cidadão, estava sendo tratado como um bandido perigoso.

Minhas mãos estavam a mostra... Eu claramente estava desarmado. Minhas únicas “armas” eram um gravador de fita cassete e um bloco de anotações.

Tentei perguntar, algumas vezes, o que acontecia, mas os ignorantes agentes da “lei” me apontavam a arma e me mandavam calar a boca. Disse que era apenas um jornalista da Empresa Brasil de Comunicação. Mas não adiantou.

Um câmera da TV Globo se aproximou e um policial gritou:

- SE VOCÊ GRAVAR ESSA MERDA, EU QUEBRO ESSA PORRA!!!

Só quando uma suposta testemunha do “crime” foi tirada da viatura foi que comecei a entender o que se passava. O PM berrou (como sempre) para testemunha:

 QUEM ESTAVA EM CIMA DO CAMINHÃO ESPALHANDO O BOATO?

A testemunha, um cidadão qualquer, pego no meio da rua, apontou para o auxiliar da TV Brasil... e disse:

 Foi ele...

Naquele momento, o PM liberou a mim e a meu motorista e, na concepção dele, o caso estava esclarecido...

Por mais absurdo que possa parecer, o PM acreditou que a TV Brasil, que estava na rua em frente a prefeitura, tinha começado o boato, com base na simples afirmação qualquer de uma testemunha.

Os PMs então quiseram prender os dois funcionários da TV Brasil. Por mais que os funcionários da TV Brasil dissessem que o boato já estava sendo espalhado pelos fuzileiros e outros policiais, antes deles, isso nada adiantou. A TV Brasil, assim como os fuzileiros e outros policiais, apenas tentou ajudar a população a procurar um local seguro, sem saber que tudo não passava de boato.

Na verdade, o boato tinha começado a quilômetros dali e havia se espalhado como uma onda. Mas, para a investigação “perfeita e complexa” dos três transtornados PMs, o caso estava esclarecido e os culpados tinham sido encontrados.

Quando fui abordado com uma pistola na cabeça, como se fosse um Fernandinho Beira-Mar, de início imaginei que se tratava uma pegadinha do Mallandro, de tão grotesca que foi a cena e de tão deplorável foi a atuação daqueles agentes a quem a sociedade deu o poder de usar uma arma.

Mas, como Serginho Mallandro não apareceu fazendo Ié-Ié e nem glu-glu, tive a triste constatação de que aquilo era real. Aqueles homens a quem damos o poder de VIDA e MORTE estavam protagonizando mesmo uma cena inacreditável...

Fiquei até o fim da ocorrência no local, porque tinha certeza de que os funcionarios da co-irmã TV Brasil eram inocentes.

Em seguida , chegou um oficial, com patente superior a daqueles palhaços de farda e, sensatamente, liberou todo mundo. Aquilo era um circo doentio.

Depois de tudo resolvido, comentei com meu motorista. Cara, isso aconteceu a luz do dia, em frente a dezenas de fuzileiros navais. Se quase deram um tiro na nossa cara nessa situação, imagina o que fazem com um cidadão humilde retornando a sua casa numa favela de madrugada.

Mais tarde, coincidentemente encontrei o comandante geral da PM, na praça central de Nova Friburgo.

Imaginei que fosse uma chance de relatar aquele papelão cometido por seus subordinados mais cedo. Não esperava que ele punisse os subordinados, até porque nem anotei o nome dos babacas. Queria apenas que ele soubesse da ocorrência e que isso servisse de alerta.

Tudo que ouvi do coronel Mario Sergio foi um “aceite minhas desculpas, em nome da corporação”.

O comandante prosseguiu então:

- Mas entenda os meus homens, eles estão sob estresse...

Pensei comigo: Mas quem quer suas desculpas, comandante? Nao estou pedindo isso...

Falei então para o comandante: Mas coronel, essa abordagem dos policiais está errada. Em outra situação, isso poderia ter acabado mal, com mortes.

Falei isso para o comandante para que ele se comunicasse com o comando do Batalhão de Nova Friburgo e esse tipo de abordagem fosse corrigido.

Não queria desculpas quaisquer, apesar da humilhação, risco de ser ferido e perda de tempo que isso me causou, em meio a uma cobertura jornalística já desgastante.

Queria apenas pedir que esses PMs mudassem sua atitude incorreta e arriscada, que coloca qualquer cidadão como culpado, subvertendo a Constituição.

Mas o coronel apenas pediu desculpas e me pediu compreensão, porque, afinal, seus homens estavam estressadinhos...

Pensei: ESTRESSE e ARMA NA MÃO são ingredientes para que tudo dê errado... Mas desisti, o comandante entraria ao vivo com a Record e não queria tomar mais seu tempo.

Depois fiquei refletindo: os PMs tinham cometido uma série de erros:

1) Apontaram uma arma para nossas cabeças, sem que oferecêssemos qualquer risco a integridade deles.

2) Tiveram uma atitude inconstitucional, ao tratar os suspeitos como culpados e não como presumidos inocentes.

3) Agrediram os suspeitos verbalmente e, com a arma apontada para eles, indiretamente os ameaçou de morte.

4) Nao quiseram informar porque estávamos sendo presos e, quando perguntávamos, nos mandava calar a boca.

5) Infringiram o artigo 331 do Código Penal, por desacatar funcionários públicos no exercício de sua função. Afinal, nos identificamos como sendo funcionários da EBC, órgão da Presidência da República, e dissemos que estávamos trabalhando. Em resposta, eles apenas nos mandaram calar a boca e gritaram para a gente BAIXAR A BOLA.

Quando me questionam porque eu critico a polícia sempre quando ela atira para matar suspeitos ou quando ela agride tais pessoas, o que acabei de escrever é parte da resposta.

Não podemos dar carta branca a servidores cujo instrumento de trabalho é uma arma de fogo. Ao partir do pressuposto que qualquer pessoa é um bandido e com a autorização para matar tais suspeitos, dada pela sociedade, todos os cidadãos tornam-se potenciais vítimas disso.

Penso que é extremamente necessário que existam freios para a ação da polícia.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Considerações de um oficial da Força de Pacificação do Exército sobre a ocupação do Complexo do Alemão

Hoje fiz uma pauta no Complexo do Alemão conversei com um alto oficial da força do Exército que ocupa o conjunto de favelas. Da conversa, tirei algumas informações interessantes sobre a ocupação, iniciada no final de novembro do ano passado e consolidada no dia 22 de dezembro.

Segundo esse alto oficial:

- Ainda há bandidos armados dentro da favela;
- Bandidos continuam vendendo drogas;
- Os bandidos não controlam nenhum território dentro do Complexo do Alemão;
- As bocas-de-fumo estão funcionando de forma meio itinerante;
- Realmente houve alguns assassinatos dentro da favela;
- Realmente fora registrados disparos esporádicos de armas de fogo pelos bandidos;
- O Exército ocupa apenas o Complexo do Alemão (sem contar o Complexo da Penha) com 700 homens de forma permanente. Claro que esses homens descansam, mas o Exército mantém sempre, no mínimo, 450 homens na ativa apenas no Complexo do Alemão.
- Se juntarmos aí o Complexo da Penha, que tem uma força de homens semelhante (cerca de 700 homens, dos quais o Exército deve manter na ativa pelo menos sempre em torno de 400 a 500 soldados), o maciço é ocupado permanentemente por, no mínimo, algo em torno de 900 homens. O Exército ainda mantém uma força de ação rápida para agir no entorno do complexo, com mais algumas centenas de homens. Com isso, temos pelo menos mil homens ocupando o interior e os acessos da favela de forma permanente.
- Do ponto de vista estratégico-militar, os terrenos dos Complexos da Penha e do Alemão são considerados extremamente complexos e difíceis de ocupar.
- Os complexos apresentam, dentro de si, uma grande variedade de terrenos diferentes entre si (Grota, Nova Brasília, Fazendinha, Vila Cruzeiro etc).

Coincidentemente, eu havia escrito um post na manhã de hoje sobre as dificuldades que o terreno e os bandidos oferecerão para uma futura Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no local.

A conversa com o oficial paraquedista apenas corroborou tudo o que eu havia escrito.

Como o leitor acabou de ver, o Exército ocupa o Alemão com cerca de mil homens de forma simultânea e ainda assim, não consegue impedir que bandidos armados ajam no local.

Como a Polícia Militar não é igual ao Exército e seus homens trabalham em turnos, com direito a folgas, com o efetivo de 2.300 homens previsto para o Alemão, a Polícia Pacificadora conseguirá contar apenas com algo entre 400 e 500 homens simultaneamente no local (cerca da metade do que o Exército dispõe). O cálculo é feito com base no esquema de turnos e folgas de outras UPP da cidade.

O terreno também é extremamente difícil, é algo totalmente novo com que o Comando de Polícia Pacificadora terá que aprender a lidar, já que as outras favelas ocupadas até agora diferem bastante do Alemão e da Penha.

Enfim, será realmente complexa a tarefa da PM. Nosso governador não deveria estar cantando vitória antes do tempo. Baixa a bola, Cabral. E trabalha sem fanfarronice.

Complexo do Alemão pacificado??? Acho que não...

Bandidos continuam armados e matando moradores na favela apesar da “pacificação”


Reportagem muito boa publicada pelo Jornal O Dia, neste final de semana. A repórter Paula Sarapu (vencedora de prêmios como Tim Lopes e Vladimir Herzog) foi além do “oba-oba” que toma conta da imprensa e se aprofundou na questão da ocupação do Complexo do Alemão pelo Exército e pela polícia.

Segundo a reportagem, moradores dizem que ainda há muitos bandidos nas favelas, apesar da ocupação policial-militar e que esses mesmos criminosos estão matando pessoas com facas e pedaços de pau.

O mais impressionante, no entanto, é o fato do oficial de relações públicas da força militar, major Fabiano Carvalho, afirmar que QUASE TODAS AS NOITES nos últimos dias, os militares ouviram tiros (certamente disparados por bandidos dentro dos complexos de favelas).

“Nossa tropa escutava tiros quase todas as noites até a virada do ano e não eram tiros disparados por nós. Sabemos que ainda há muita gente por aí e a população se sente acuada [por bandidos]”, afirmou o major ao Jornal O Dia.

Há duas semanas, um homem foi encontrado morto com vários tiros numa rua de acesso à Vila Cruzeiro, uma das favelas que integram os complexos de favelas.

Pelo menos três assassinatos cometidos por bandidos da favela [digo isso para diferenciar dos assassinatos cometidos por bandidos fardados] e ocorridos dentro da comunidade, durante a ocupação, estão sendo investigados pela Delegacia de Homicídios.

Há também a informação, oriunda da própria polícia, de que o Complexo do Alemão tem um novo “chefe” (e ele não usa farda). Segundo a reportagem do Dia, um bandido já foi designado pela cúpula da facção criminosa que CONTROLA o Complexo do Alemão, para organizar as bocas-de-fumo da favela.

Isto significa que o tráfico de drogas na favela continua a funcionar de forma semi-organizada (isto é, de forma sistemática) no Complexo, apesar de nosso governador dizer que as favelas foram pacificadas.

Lembremos que os Complexos do Alemão e da Penha foram ocupados em novembro do ano passado por forças do Exército e da polícia. Pelo menos 2 mil militares e policiais ocupam neste momento os conjuntos de favelas da zona norte. Mais de 500 armas foram apreendidas. Toneladas de drogas também foram recolhidas.

Mesmo assim, bandidos continuam usando armas e vendendo drogas no território “pacificado”.

Os militares da chamada Força de Pacificação (que não tem nada a ver com a Força de Paz do Haiti, apesar da imprensa insistir nisso) devem permanecer na favela pelos próximos meses. O desejo do governador é que elas fiquem na favela até o final do ano, quando o governo do estado pretende implantar a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do Alemão.

Venho insistindo há meses, que a manutenção da ocupação do Complexo do Alemão pelas forças de segurança não será uma tarefa fácil, por uma série de fatores. Repito: uma coisa é a polícia entrar na favela (nunca duvidei que ela fosse capaz disso), outra coisa é a polícia manter a ocupação dessa favela.

Se os 2 mil militares fortemente armados, organizados sob a mais estrita hierarquia militar, equipados com veículos blindados, não conseguem evitar que, poucos dias depois da ocupação, bandidos se rearticulem e voltem a promover atos de violência na favela, por que eu acreditaria que 2 mil policiais militares da UPP conseguiriam manter o local pacificado?

Tenhamos em mente que os 2 mil policiais não ficarão o tempo inteiro no conjunto de favelas. Eles serão divididos em turnos de 400 a 500 policiais.

Os Complexos do Alemão e da Penha não se parecem em nada com os terrenos já ocupados pela Polícia Militar no Rio de Janeiro. Os dois juntos, acredito, são o maior aglomerado de pessoas do estado do Rio. Quem já entrou lá (ou tentou circunavegá-las) sabe que aquilo é um mundo. Se você duvida, acesse o Google Maps e tente traçar o perímetro dos conjuntos de favelas.

Além do tamanho, eles representam um terreno hostil. É a primeira favela do subúrbio com tráfico de drogas a ser ocupada pela polícia. Próximas aos dois complexos existem inúmeras favelas ainda dominadas por criminosos, como Juramento, Engenho da Rainha, Manguinhos e Jacaré.

As ruas do seu entorno são mal iluminadas, mal policiadas e dão acesso a várias vias expressas, como a Linha Amarela, a Avenida Pastor Martin Luther King, a Rua Uranos, a Avenida Vicente de Carvalho, a Avenida dos Democráticos e, em última instância, a Avenida Brasil.

Tais características geográficas, por si só, nos fazem crer que a polícia terá um desafio enorme pela frente. Se, neste momento, ainda “fragilizados” pelo baque da ocupação do terreno e das apreensões pela polícia, os bandidos já estão retomando seus territórios dentro dos complexos de favelas, o que esperar de daqui a um ano, quando a maior parte das armas e drogas perdidas já terão sido recuperadas pela quadrilha.

Posso estar enganado, mas tudo leva a crer que os policiais não conseguirão ter o controle efetivo de todo o maciço do Alemão/Penha, o que abrirá brecha para a implantação de “focos de bandidos”, isto é, pedaços do território controlados por criminosos armados, que continuarão promovendo a violência e ameaçando a vida dos moradores desses locais.

Patrulhas policiais poderão virar alvos de ataques e escaramuças de bandidos do próprio Complexo ou de favelas vizinhas controladas pela mesma facção criminosa (Juramento, Engenho da Rainha, Manguinhos e Jacaré).

Com o foco voltado para a manutenção do controle do Complexo do Alemão, o 16o Batalhão poderá se descuidar das vias próximas ao conjunto de favelas (se é que o 16o algum dia cuidou dessas vias), o que permitirá a continuidade de ações criminosas como “bondes” e assaltos de rua.

O Complexo do Alemão, obviamente, deixará de ser o coração do Comando Vermelho, já que a existência de 400 a 500 policiais circulando pela favela modificará a comunidade. Os bandidos poderão continuar controlando espaços dentro da favela, mas não terão mais a liberdade que tinham para circular no complexo.

Isso, no entanto, não elimina o problema. A facção criminosa poderá tanto criar um novo quartel-general em outras áreas propícias, como Jacarezinho, Manguinhos e o Complexo da Maré, quanto fazer algo pior: diluir seu poder de fogo, criando vários destacamentos (ou pequenos quartéis-generais) pelo estado.

A segunda opção seria o pior dos mundos para a segurança pública do estado, já que criaria pequenos “complexos do alemão” e pequenas “faixas de gaza” por todo o estado.

Disse, logo depois da ocupação do Complexo do Alemão, que o baque causado pelas forças de segurança ao Comando Vermelho com a operação na favela poderia ser revertido pelos criminosos em um período de tempo relativamente curto (como os 11 meses de preparação para a instalação da UPP no local).

Nesses 11 meses, disse eu, na ocasião, os bandidos poderiam recuperar todas as drogas e armas perdidas para a polícia na ocupação do Alemão e continuar a realizar suas atividades criminosas.

Disse também que, por isso, seria preciso que as autoridades públicas do estado, fizessem operações semelhantes em todas as grandes favelas do estado do Rio de Janeiro, para causar um dano mais profundo às facções criminosas fluminenses.

Em vez de apreender 500 armas, seria preciso apreender 5 mil logo de uma vez. Em vez de apreender 30 toneladas de maconha, seria necessário apreender 300 toneladas. Em vez de 300 quilos de cocaína, cinco toneladas... E por aí vai.

Não vejo a polícia fazer isso. Não vejo resultados de investigações policiais que estejam levando ao enfraquecimento dos bandidos em outras favelas do estado.

E, se a polícia não fizer isso, repito, ela estará perdendo uma oportunidade de quebrar o pescoço do tráfico de drogas e estará dando um tempo para que esses bandidos se recuperem.

Continuo esperando para ver no que vai dar toda essa algazarra em torno da ocupação do Complexo do Alemão. Assim como também mantenho meu ceticismo quanto ao sucesso dela.