Agora, uma semana depois de voltar ao Rio de Janeiro e já inteirado da ocupação do Complexo do Alemão (inclusive tendo participado da cobertura), me sinto um pouco mais a vontade de fazer novas análises da situação.
É claro que uma análise completa sobre a ocupação demanda tempo, já que, só dentro de alguns meses (ou anos) poderemos saber as consequências dessa mega operação envolvendo a polícia e as forças armadas no Complexo. O Alemão será pacificado? A polícia deixará a favela? Os bandidos voltarão a usar a comunidade como quartel-general? Só o tempo irá dizer.
Mas se me perguntarem, agora, qual o ponto mais positivo da ocupação do Complexo do Alemão, não tenho receio de responder: o grande número de armas apreendidas pelos policiais. Até o último balanço de que tive conhecimento, mais de 400 armas foram apreendidas, das quais grande parte são armas longas, como fuzis e metralhadoras.
Mais do que a ocupação do território, a prisão de criminosos ou a ecuperação de veículos roubados, a retirada de mais de 400 armas de circulação representam uma real oportunidade de redução de ocorrências criminais.
Afinal, é com as armas que os bandidos roubam, matam, intimidam, ameaçam, controlam territórios, atiram na polícia entre outras coisas. Sempre defendi que um dos grandes vilões da segurança pública no Brasil é a disseminação descontrolada de armas no país.
Por isso, quando vi, na última terça-feira, a apresentação daquela imensa quantidade de armas apreendidas, fiquei muito feliz. Também achei positivo o fato de os policiais terem apreendido mais de 30 toneladas de maconha e cocaína que seriam vendidos no próprio Complexo e, provavelmente, distribuídas para outras favelas fluminenses. Afinal, essas drogas seriam usadas para enriquecer os bandidos, comprar mais armas e corromper agentes do Estado.
Mas, por enquanto, é só o que posso comemorar em relação ao Alemão. De resto, como disse, é preciso esperar. Esperar para ver no que vai dar toda essa ação tão aplaudida pela imprensa nacional.
Gostaria também, como não poderia deixar de ser feito, de levantar algumas questões:
1) Como será feito o controle e monitoramento das armas apreendidas, para evitar que elas sejam desviadas por policiais inescrupulosos e voltem às mãos dos criminosos?
2) A ocupação do Complexo do Alemão levará pelo menos 11 meses, já que o governo do Estado pediu a permanência das forças armadas até outubro de 2011. O que será feito nesse período para desarticular as quadrilhas nas outras 1.500 favelas? Tudo bem que o Complexo do Alemão era um grande centro “nervoso” do tráfico de drogas fluminense e sua ocupação, com a grande quantidade de armas e drogas apreendidas, causa um baque imenso no Comando Vermelho.
Mas há outros “centros nervosos” de outras quadrilhas e do próprio CV, como a Rocinha (da ADA), Senador Camará/Taquaral (do TCP), Jacarezinho e Manguinhos (do próprio CV) e o Complexo da Maré (que tem várias quadrilhas).
Há ainda favelas “importantes”, como Acari, Vidigal, Complexo do Caju, Vila Kennedy, Vila Vintém, Juramento, Serrinha, Engenho da Rainha, Complexo do Lins, Vigário Geral, Parada de Lucas, São Carlos, Complexo do Rio Comprido, entre outras.
Uma apreensão de 40 toneladas de drogas e de 500 armas causa um baque grande numa quadrilha. Mas não é nada fatal para a sobrevivência desses grupos criminosos.
Falando especificamente do armamento, é claro que 500 armas são apenas uma fração daquilo que está nas mãos dos bandidos. Por mais que eu comemore (e aplauda, sempre com viés crítico) essa apreensão, tenho plena noção de que isso está longe de representar um desarmamento das quadrilhas do Rio de Janeiro. Só para ilustrar o que estou dizendo, a apreensão de 500 armas representa apenas 10% do total apreendido no estado em nove meses, entre janeiro e setembro deste ano.
Segundo o Instituto de Segurança Pública, neste período, foram apreendidas 5.485 armas no estado. Em 2009, haviam sido apreendidas 8.914 armas.
Tendo em vista que a polícia apreende apenas uma parte do que está sob posse dos bandidos, posso fazer uma projeção otimista de que haja, pelo menos, igual número de armas nas mãos de bandidos: isto é, cerca de 5.500 armas.
Há muito foco no Complexo do Alemão, mas o que a polícia está fazendo, nesse momento, para desarticular as quadrilhas que agem nas outras 1.500 favelas do estado do Rio de Janeiro? A julgar pelo número de policiais civis que estão sendo usados para garantir o cerco das entradas do Alemão, imagino que haja poucos policiais civis, nesse momento, se dedicando a sua função de investigar as outras quadrilhas.
A operação no Alemão pode até parecer um grande baque no tráfico de drogas no Rio (e eu até concordo que seja), mas se nada mais for feito para enfraquecer os bandidos que ainda atuam nas demais favelas, essa quadrilha se recuperará.
Uma quadrilha que perde R$ 100 milhões em uma semana, pode muito bem, usando seus contatos, se reabastecer de droga e recuperar esses R$ 100 milhões em 11 meses. Tampouco é difícil se rearmar.
Uns 25 carregamentos ilegais, com 20 armas (o que não é nada improvável, em se tratando de um período de 11 meses), são capazes de fazer os bandidos recuperarem o mesmo poderio bélico que tinham antes da ocupação.
Logo, seria interessante que as autoridades de segurança aproveitassem a disposição das forças armadas e a temporária fragilidade do Comando Vermelho para atacar suas outras bases principais? E por que não atacar logo as outras favelas importantes de outras facções?
Se reerguer depois da perda de um território, ainda que seja a custa de muita droga e arma apreendida, é relativamente fácil, em se tratando de uma lucrativa atividade criminosa como o tráfico de drogas. Mas se recuperar de uma perda quase total de armas, drogas e dinheiro é muito mais difícil.
Não seria preciso ocupar permanentemente nenhuma favela. Bastaria que a polícia e os militares entrassem nessas áreas, ocupassem e vasculhassem o terreno por apenas três a quatro semanas e se retirassem. Nesse esquema, talvez fosse possível atacar duas grandes favelas por mês. No final de um ano, teríamos grandes operações como a do Alemão, em 12 áreas, como a Rocinha, Maré, Jacarezinho, Manguinhos, Vidigal e Taquaral.
Também seria importante que a polícia usasse as informações coletadas na ocupação do Alemão para subsidiar suas investigações, identificar os esquemas de contrabando, rastrear os contatos dos traficantes, interceptar novos carregamentos de armas e drogas e prender todos os grandes chefões ainda soltos.
O impacto seria muito mais devastador, do que simplesmente ocupar um terreno para se implantar uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), por mais simbólico e vasto que seja esse terreno.
3) A imprensa comemorou a entrada da polícia no Complexo do Alemão como se um milagre tivesse acontecido. Nunca coloquei em questão a capacidade da polícia de entrar em qualquer território. Em 2007 e em outras ocasiões, policiais já haviam entrado e tomado o controle (ainda que em um período de tempo muito curto) do Complexo do Alemão.
Na minha humilde opinião, a dificuldade está em ocupar permanentemente o território, isto é, manter o Alemão pacificado por um período de tempo muito grande, como se propõe a UPP.
Como já falei em posts anteriores, a polícia tem extrema dificuldade em manter a UPP da Cidade de Deus (a meu ver um terreno muito mais favorável do que o Complexo da Penha/Alemão). Há dificuldades também em favelas com porte muito menor, como o Pavão/Cantagalo.
Posso me enganar (e tomara que eu me engane), mas a polícia terá extrema dificuldade em garantir um Alemão pacificado com apenas um efetivo permanente de 400 a 500 homens (o efetivo total será de mais de 2 mil homens, mas, com as folgas, apenas uma parte dos policiais estará ao mesmo tempo ocupando o local).
4) De onde sairão os mais de 2 mil homens que integrarão a UPP do Complexo do Alemão e as outras UPP que o governo do estado está prometendo? A PM tem capacidade de formar policiais em um ritmo industrial? Qual será a qualidade desses recrutas e oficiais?
5) Por mais que as forças armadas aparentem disposição em ajudar o governo do Rio, sabemos que os militares são “temperamentais” e agem de acordo com seus próprios interesses. Será do interesse do Exército manter a ocupação do Complexo do Alemão por um tempo tão prolongado quanto deseja Sérgio Cabral? Tenho minhas dúvidas.
Bem, acho que tinha mais algumas coisas para escrever, mas por enquanto acho que já basta. Se lembrar de algo mais, faço um novo post.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
excelentes questões levantadas!
ResponderExcluirExcelentes considerações. Eu compartilho do seu "realismo" e deploro que sempre haja marketeiros procurando convencer a população que possa haver omeletes sem quebrar ovos.
ResponderExcluirParabéns pelo seu blog.
Thayná e Vinicius, obrigado pelos comentários. Grande abraço
ResponderExcluirEu acho que não vai ter policiai suficientes para ocupa o complexo do alemão pq é umito grande policiais militares são tds corruptos e pelos penssameto as forças armada vao fica ate a 2016 eo da onlipiadas eles vão embora pode ate ter policiais nos telefericos mais vão ser corrupto isso vai ser igual antigamente um depeo...?
ResponderExcluir