segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Polícia ocupa o Complexo do Alemão e diz que não vai sair de lá: Um replay de 2007?

Durante toda a última semana estive fora do Brasil. Estava no Haiti, fazendo reportagens especiais sobre a população haitiana, o cólera e a preparação para as eleições gerais naquele país.

Cheguei ao Rio apenas ontem (28). E, apesar de ter tomado conhecimento sobre os últimos episódios de violência e as consequentes ações policial-militares no estado quando estava no Haiti, busquei não pensar muito no assunto, para não perder meu foco na cobertura que eu estava fazendo.

Por isso, só agora tirei um tempinho para escrever sobre o que vi e ouvi (através da imprensa) em relação a essa questão.

Como ainda não deu tempo de eu me aprofundar no assunto, farei apenas análises superficiais sobre isso..

Gostaria de escrever, em primeiro lugar, sobre as ações criminosas que antecederam a ocupação policial no Complexo do Alemão.

Pelo que vi na imprensa, o governo do Rio atribuiu os ataques de criminosos (assaltos, arrastões, incêndio de ônibus e carros etc) a um desespero dos bandidos, devido à política de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).

A meu ver, ataques que colocam um estado de joelhos estão longe de demonstrar desespero. Pelo contrário, tais ações violentas demonstram que o controle da situação não está nas mãos das autoridades, mas sim nas mãos dos bandidos.

Em posts anteriores nesse blog, eu já havia dito que a “aparente calmaria” do Rio de Janeiro poderia ter como, uma das explicações, uma determinação dos próprios bandidos de reduzir suas ações violentas (Ver "Rio termina primeiro semestre com redução 'MILAGROSA' nos principais crimes: Será que devo acreditar nisso???" e "Os dados de criminalidade do ISP: Verdade ou ficção?")
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Nesse caso, se o controle da situação estava nas mãos dos bandidos e se a violência diminuíra simplesmente porque o ímpeto violento deles havia arrefecido, então a calmaria poderia ser interrompida a qualquer momento e a cidade ser tomada por um “banho de sangue”.

Ataques violentos em série como os que aconteceram nos últimos dias, já haviam acontecido no estado em larga escala em 2002 e 2006 e, em menor escala, em diversas outras ocasiões.

Quer dizer que, em todas essas ocasiões os bandidos estavam desesperados com as ações de segurança do governo do estado? Se sim, que desespero é esse que dura oito anos e contra o qual as autoridades públicas fluminenses nada conseguem fazer?

E mais, antes da “onda de ataques” dos últimos dias, a imprensa vinha noticiando um “aumento” no número de arrastões nas ruas. Sinais dos ânimos acirrados também vinham sendo sentidos nas guerras entre quadrilhas em diversos pontos do Rio (Santa Cruz, Vila Vintém, Serrinha etc).

Não foi nenhuma surpresa ver essa “suposta onda de ataques” dos últimos dias. Isso tudo mostrava que o controle mantido pelas autoridades de segurança até o momento eram apenas aparentes.

E mais, essas autoridades (governador, secretário de segurança, comandantes e delegados de polícia) pouco fizeram para tentar ganhar o controle da situação (afinal a reeleição estava garantida).

No momento em que os verdadeiros “donos” da situação (os bandidos) acharam que deviam aumentar suas ações violentas no estado, assim eles fizeram. E as autoridades públicas nada conseguiram fazer para impedi-las. O governo do Rio teve apenas uma ação reativa (mesmo assim, alguns dias depois do início da “onda de ataques”).

A segunda coisa sobre a qual gostaria de falar é justamente sobre a resposta dada pelas autoridades para interromper as ações criminosas. Parece que estou vendo uma reprise de um filme de 2007.

Primeiro, o governador Sérgio Cabral assinou seu atestado de incompetência e se ajoelhou ao governo federal, para pedir ajuda a forças federais. Em 2007, Cabral pediu ajuda das forças armadas e da Força Nacional de Segurança. Em 2010, ele pediu ajuda novamente aos militares e à Polícia Federal.

Em 2007, o governo determinou a ocupação do Complexo do Alemão/Penha (primeiro em ações isoladas em fevereiro, depois em ações continuadas durante dois meses entre maio e julho de 2007). Em 2010, o governo determinou a ocupação do Complexo do Alemão.

Em 2007, as ações culminaram numa megaoperação envolvendo mais de mil homens das duas polícias estaduais e da Força Nacional de Segurança. Dezenove pessoas morreram.

Em 2010, uma megaoperação envolvendo dois mil homens ocupou o Complexo do Alemão. Várias pessoas morreram, ficaram feridas ou foram presas.

Em 2007, a Força Nacional de Segurança ficou por vários meses estacionada nas principais entradas do Complexo do Alemão. Em 2010, o governo do Rio diz que os militares vão permanecer por vários meses na favela.

Em 2007, canais de televisão, jornais e revistas festejaram a ação policial. Sem qualquer olhar crítico, algumas revistas como a Época e a Veja publicaram matérias de capa com títulos como “Um marco histórico no combate à violência” e “A guerra necessária para a reconstrução do Rio”.

Tais reportagens diziam que o governo do Rio estava tomando uma medida inédita, que iria acabar com a festa do tráfico no Alemão.

Em 2010 (isso mesmo, três anos depois dessas duas reportagens “históricas”), a imprensa faz o mesmo papel de idiota e festeja a operação policial (dizendo que a ação governamental é histórica), sem sequer esperar para saber os desdobramentos da ação policial. Lembrem que, depois da ação policial de 2007, o Alemão voltou a ser o quartel-general do Comando Vermelho.

Em 2007, Sérgio Cabral diz que a polícia “não vai abandonar o Complexo do Alemão”. Em 2010, Cabral diz que a “polícia não vai sair do Alemão”.

Bem... Espero que eu esteja enganado, mas imagino que estou vendo um replay de tudo que já vi em 2007. E, quem sabe, em 2013, vamos ver tudo de novo...

sábado, 13 de novembro de 2010

Receita inaugura primeira delegacia especializada em fiscalizar grandes contribuintes

A Receita Federal inaugurou ontem (12) uma delegacia especial para fiscalizar e atender as 204 maiores empresas do Rio de Janeiro. O foco da Delegacia Especial de Maiores Contribuintes são as empresas que têm faturamento anual superior a R$ 370 milhões, entre elas a estatal de energia Petrobras.

A delegacia do Rio de Janeiro é a primeira do país destinada a fiscalizar os contribuintes diferenciados, isto é, aqueles que têm maior faturamento. A Receita inaugurará, até o final do ano, unidades nas cidades de São Paulo e Belo Horizonte.

Nas outras sete superintendências da Receita, onde não haverá delegacias como essas, serão criados grupos especiais para fiscalizar o pagamento de impostos por grandes contribuintes. No total, 500 auditores ficarão responsáveis pelo trabalho em todo o país.

O objetivo, segundo o subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, Marcos Vinícius Neder, é acompanhar as 10 mil empresas e as 5 mil pessoas físicas com grande faturamento no país, que contribuem com aproximadamente 75% da arrecadação do órgão.

“Quando as grandes empresas, que têm grande capacidade contributiva, não pagam tributos, o restante da sociedade fica sobrecarregado e acaba pagando a conta. O objetivo é de justiça fiscal”, disse.

O foco principal das delegacias de maiores contribuintes é identificar possíveis tentativas dessas empresas de usar “planejamentos tributários” irregulares para pagar menos tributos, como reorganizações societárias ou o uso de paraísos fiscais. Segundo Neder, ao combater esse tipo de instrumento ilegal, é possível ter um grande crescimento na arrecadação.

“As reorganizações societárias são uma prática muito comum nos grande conglomerados no Brasil. Eles recebem investimentos, organizam a empresa, umas empresas se juntam, outras se separam. E nessas operações, muitas vezes, há o aproveitamento do ágio, que é quando se paga mais do que determinado tipo de ação vale. Esse ágio é possível de ser deduzido, reduzindo o lucro. Essas operações, às vezes, são feitas entre duas partes da mesma empresa, ou seja, o mesmo grupo econômico controla as duas pontas do negócio”, disse Neder.

Segundo ele, em 2009, a Receita Federal fez autuações contra irregularidades no país que somaram R$ 90 bilhões, dos quais R$ 55 bilhões foram contra grandes contribuintes. As novas delegacias contam com o uso de tecnologia e de auditores que receberam treinamento para fiscalizar esses contribuintes diferenciados.

*Reportagem publicada na Agência Brasil

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Confrontos na Serrinha 2: que sofram as criancinhas... do subúrbio

Mais de mil estudantes e crianças em idade pré-escolar, de duas escolas e três creches municipais, ficaram sem aula hoje na região da Serrinha, em Madureira, na zona norte da cidade do Rio, por causa do confronto continuado entre bandidos da favela e os de uma facção rival.

A suspensão das aulas é apenas mais um dos efeitos colaterais dessa disputa territorial criminosa (que ocorre há meses, sob os olhos inertes das autoridades do Estado do Rio de Janeiro).

Na manhã de hoje voltei ao entorno da Serrinha, para acompanhar a operação policial que acontecia no morro vizinho do Juramento (onde estão agrupados os bandidos que tentam invadir a Serrinha).

Os policiais foram ao Juramento para tentar prender os bandidos que a PM baleou em uma troca de tiros ontem na Serrinha e que fugiram pela mata, de volta a favela vizinha.

Cheguei à Serrinha no final da manhã. A ação policial já havia se encerrado. Portanto, não ouvi tiros (o tiro comeu mesmo mais cedo), mas tampouco vi policiamento reforçado no local. Vi apenas o caveirão passando pela Avenida Edgar Romero, já se retirando para seu descanso no quartel.

Sem encontrar policiais na área, voltei para a redação, onde telefonei para o comandante do Batalhão local (o 41o BPM, de Irajá), coronel Alexandre Fontenelle.

Fontenelle me assegurou que a Serrinha esta ocupada ha quase um mês pela Policia Militar, apesar de, nas duas vezes em que fui à favela (domingo e hoje), não ter visto uma farda azul sequer.

Enfim... A guerra continua (há meses), os bandidos jogam sua disputa sangrenta, os cidadãos fluminenses sofrem, nossas crianças ficam sem escola e o governo do estado tapa seus ouvidos, no conforto de seus gabinetes, para não escutar os tiros...

Ps.: E se esses confrontos estivessem prejudicando as aulas dos nossos caros colégios particulares da zona sul, será que nosso Estado faria ouvidos moucos que costuma fazer para nossos cidadãos do subúrbio?

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Confrontos na Serrinha: mais um capítulo de um Rio longe de ser pacificado

O Morro da Serrinha, tradicional terra do jongo em Madureira, na zona norte do Rio, tem vivido sob intensos tiroteios nos últimos dias. Essa é apenas mais uma ocorrência de violência no cotidiano do nosso Rio de Janeiro.

Cidadãos são obrigados a conviver com balas zunindo em seus ouvidos, quando não sofrem com experiências mais radicais, como projéteis perfurando seus corpos ou até mesmo tirando suas vidas.

A história desses confrontos na Serrinha começa há muitos meses atrás. Pelo menos desde o inicio do ano, duas facções rivais vem disputando o controle da venda de drogas na Serrinha. Nada diferente do que ocorre em diversos pontos do estado do Rio de Janeiro, sem que o Estado ou a sociedade tomem atitudes concretas para impedir isso.

Situação semelhante de confrontos ocorreu, por exemplo, recentemente no morro vizinho do Juramento, onde a Cruz Vermelha (entidade especializada em atuar em zonas de guerra) tem uma base.

No último domingo (31), dia do segundo turno das eleições, diante dos tiroteios que atingiram a Serrinha durante a madrugada, fui ao local para ver se isso prejudicaria a votação na região.

Fui à escola Carmela Dutra e a Univercidade na Avenida Edgard Romero. E tudo estava tranquilo. Os eleitores votavam normalmente.

Busquei saber se existiam seções eleitorais mais próximas da Serrinha, para saber se locais de votação mais perto do local de confronto haviam sido afetados pelo confronto armado.

Minha ideia era ver se o processo democrático brasileiro estava sendo atrapalhado pela falta de democracia nas áreas carentes do Rio de Janeiro. Nas eleições de 2006, já havia presenciado tal situação absurda, quando seções eleitorais do Complexo da Maré fecharam suas portas durante um tiroteio na favela.

Moradores me indicaram que havia escolas na boca da favela que funcionavam como locais de votação. Fui então até a entrada da Serrinha para tentar localizar uma seção que pudesse ter sido afetada pelos confrontos.

A busca me levou até a entrada da favela, na Rua Pescador Josino. Não encontrei o tal local de votação (encontrei apenas uma escola fechada, a Escola Municipal Darcy do Jongo), mas pude constatar mais uma vez a realidade crua das áreas controladas por criminosos no Rio de Janeiro.

Logo depois da escola, a rua era bloqueada com barricadas. Aqueles objetos jogados no meio da rua não apenas impediam que nosso carro progredisse por aquele caminho, aquilo simbolizava uma fronteira: o asfalto e a Serrinha, onde o Estado não faz questão de se fazer presente.

Eu estava um pouco nervoso por estar por ali. Afinal, poucas horas antes, duas quadrilhas haviam travado uma encarniçada disputa armada pelo território. Os nervos dos bandidos ali naquela favela estavam a flor da pele.

Eu e o motorista paramos o carro de reportagem (caracterizado com o logo da TV Brasil) pouco antes da barricada. Saí do carro e olhei em volta. Não havia sinal de qualquer local de votação naquela área.

Olhei para as barricadas e, mesmo sob aquela tensão, pude imaginar: aquelas barricadas também mostravam um outro Brasil. Enquanto 130 milhões de brasileiros escolhiam seu governante democraticamente. Além da barricada, a disputa pelo poder não se dava pelas urnas, mas pelas armas. Ali nenhum morador escolhia a autoridade local pelo voto.

Mesmo nos poucos minutos que passamos no local, tentando encontrar o tal local de votação que, segundo disseram ficava por ali, passamos a ser observados. As autoridades locais perceberam que havia ali um carro de reportagem não autorizado.

Uma moto passou ao lado do nosso carro, com dois homens (provavelmente integrantes da quadrilha local). Um deles apontou para o nosso carro e alertou o colega da nossa presença.

Percebi que corríamos risco ali. Desisti de localizar o local de votação, entrei no carro e orientei o motorista a dar meia volta e sair daquela No Man`s Land. Senti que a qualquer momento seríamos abordados ou algo pior.

Voltei para o asfalto. Na minha mente, ficava apenas refletindo sobre aquilo. “Esse é o Rio pacificado de Sergio Cabral?”

Dias antes eu tinha passado pela Vila Vintém. Também vi a mesma barricada. Já tinha feito uma reflexão semelhante. Definitivamente, com exceção de poucas favelas da Tijuca e da zona sul, nada mudou no Rio de Janeiro. O Estado e a sociedade continuam anestesiados perante essa realidade esdrúxula que permeia o estado.

E, como já disse por aqui, não é uma UPP que vai resolver o problema. A sociedade, a política, o Estado e a polícia precisam mudar. Mudar suas atitudes, seus métodos, seus padrões, suas prioridadades.

O Rio continua o mesmo. Infelizmente. Serrinha e Vila Vintém são apenas duas das mais de 1.500 favelas do Estado que vivem essa realidade.

A população não consegue enxergar isso. Pelo menos cinco milhões de pessoas não conseguiram enxergar isso e reelegeram o nosso governador, que não fez nada (ou fez muito pouco) para resolver isso. Governador esse que não coloca os pés nessas comunidades e não faz questão nenhuma de resolver o problema delas.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Especialista em segurança diz que Dilma deve investir no policial e acabar com privilégios como prisão especial e foro privilegiado

Os principais desafios na área de segurança para a presidente eleita, Dilma Rousseff, são a melhoria das condições de trabalho dos policiais, o aumento do patrulhamento das fronteiras e do litoral brasileiro e o fim de privilégios, como a prisão especial e o foro privilegiado. A avaliação é do especialista em segurança pública da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jorge da Silva.

Ele, que já foi presidente do Instituto de Segurança Pública do Rio, elogia a disposição de Dilma Rousseff de incentivar a filosofia de policiamento comunitário em todos os estados, a exemplo das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) fluminenses.

Ele acredita, no entanto, que a presidente eleita precisa se concentrar também em questões fundamentais para a melhoria da segurança pública, como as condições de trabalho dos policiais, inclusive com aumento de salário.

“Nós sabemos que hoje os policiais no Brasil ganham salários irrisórios. Existe a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 300 [que prevê aumento de salário para policiais de todo o país], que o governo federal deixou de lado. As pessoas no Brasil querem que os policiais ganhem uma miséria e sejam honestos. Aí não tem condição”, diz.

O especialista afirma ainda que o governo federal deveria focar nas suas atribuições constitucionais, como a garantia da segurança das fronteiras e da costa brasileira, para impedir a ação de criminosos nessas áreas. Para isso, Jorge da Silva defende a atuação das Forças Armadas nessas regiões ou a criação de uma polícia de fronteira, a exemplo de outros países.

Na sua opinião, o governo de Dilma também deveria defender, por meio de propostas de emenda à Constituição (PEC) ou projetos de lei, o fim de privilégios existentes para alguns cidadãos, como o foro privilegiado e a prisão especial. Junto a isso, o governo federal deveria investir na reforma do sistema penitenciário.

“O sistema penitenciário existe como um depósito de gente pobre. Para mexer nisso, é preciso acabar com esses institutos, como a prisão especial e a imunidade parlamentar. O governo precisa fazer sua parte, porque, se esperar o Congresso, o Congresso não vai fazer”, afirma.

Jorge da Silva também diz que o governo de Dilma precisaria investir numa mudança de paradigma das instituições policiais, que hoje funcionam sob uma ótica militar. “A polícia brasileira, principalmente a dos estados, atua com um ethos militarista e não policial”, disse.

*Reportagem publicada na Agência Brasil