Eu sou um grande crítico da política de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) adotada pelo governo do estado do Rio de Janeiro. Não porque eu discorde do conceito de policiamento comunitário que é adotado pelas UPP nas diversas favelas do Rio, mas, entre outras razões, por ser essa uma política seletiva que não beneficia toda a população do estado.
Mas o que gostaria de fazer aqui não é necessariamente uma crítica sobre a política das UPP, mas apenas uma reflexão sobre o conceito de polícia pacificadora. Há alguns dias, venho refletindo sobre o que é uma polícia pacificadora e sobre por que deveríamos comemorar e até mesmo incentivar uma unidade “específica” de polícia pacificadora.
Mais uma vez, não estou dizendo que sou contrário à existência de uma polícia comunitária, de uma polícia de aproximação ou de uma polícia pacificadora (como se queira chamar).
O meu objetivo aqui é exatamente o oposto. Reflitam comigo: por que comemorar a criação de uma unidade de polícia pacificadora quando todas as unidades da polícia deveriam ter como objetivo a garantia da paz?
Como venho dizendo aqui no blog, as Unidades de Polícia Pacificadora do governo do estado vêm sendo tratadas como uma mudança no paradigma das políticas de segurança do Rio de Janeiro. Mas, a meu ver, elas simbolizam exatamente o oposto. Não pelo que elas representam em si, mas pelas contradições no contexto mais amplo da segurança pública que elas expõem.
As unidades de polícia pacificadora são unidades da polícia que prezam o diálogo com a comunidade, a aproximação com o cidadão e o fim do confronto armado. São unidades que representam o braço amigo e pacífico do Estado. São unidades que representam um Estado que não quer apenas eliminar os criminosos, mas ajudar a população (pelo menos na teoria e na propaganda do governo).
Mas, ao mostrar tudo isto e ao se propagandear como uma polícia diferente, as UPP também revelam aquilo que a chamada “polícia tradicional” representa: o confronto, o não-diálogo, a distância com relação à comunidade, as balas perdidas, a brutalidade, a corrupção.
E, se as UPP representam tudo aquilo que o governo e a sociedade esperam e desejam da polícia, por que, então, todas as demais unidades da polícia agem exatamente da forma oposta? Por que a esmagadora maioria da polícia do Rio de Janeiro age diferente do conceito de polícia pacificadora? Por que toda a polícia do Rio não pode ser uma polícia pacificadora?
Fora do território das UPP (isto é, 99,9% do território fluminense) são diárias as ocorrências de confrontos policiais, de trocas de tiros, de balas perdidas, de abuso de autoridade, de brutalidade, de autos de resistência.
Entre janeiro de 2009 e abril deste ano (período de consolidação das UPP), a polícia do Rio de Janeiro matou 1.370 pessoas. Isto significa que o índice de mortes provocadas pela polícia fluminense (algo entre 8 e 9 por 100 mil habitantes) é maior do que o índice de mortes provocadas por bandidos em uma cidade do porte de Nova York. Nada diferente do que vem ocorrendo no estado nos últimos 20, 30 anos...
Estão entendendo agora, por que eu acho contraditório festejar a existência de uma UNIDADE de Polícia Pacificadora? Ao festejar isso, estamos aceitando que o restante da polícia não seja pacificadora. Ao celebrar a UPP, o governo do estado sinaliza que a grande massa de policiais civis e militares pode continuar sendo violenta.
Ao comemorar isto, estamos concordando com o governo do estado ao conceder o rótulo de “pacificadores” a apenas uma meia dúzia de policiais que integram sua política eleitoreira e ao permitir que a maioria da polícia continue apelando à violência como forma de resolver conflitos.
Enfim, não podemos aceitar (muito menos incentivar) que o governo destaque apenas uma meia dúzia de policiais para agirem “pacificamente” enquanto o restante da polícia tem carta branca para agir com violência.
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