Tudo bem que estamos em período de campanha eleitoral e que nós, brasileiros, estamos acostumados a ouvir promessas de candidatos que nunca serão cumpridas. Mas o governador e candidato à reeleição Sergio Cabral abusou na tarde de hoje (21).
Em visita à Associação Comercial de Bangu, Cabral prometeu instalar unidades de polícia pacificadora (UPP) em toda a zona oeste da cidade, se ganhar essas eleições. É uma promessa que nem Cabral acredita.
“Eu posso garantir a vocês que, nos próximos quatro anos, toda a Zona Oeste estará pacificada. É meu compromisso. Tem uma turma do contra que diz que o Cabral só pacifica a Zona Sul. Eles perderam o discurso quando fomos para a Cidade de Deus. Fomos para a Providência e todo o Centro e a Zona Portuária estão sendo restabelecidos com paz. Estamos na Tijuca: no Borel, no Morro da Formiga, no Andaraí, onde o Bope termina o trabalho e, em seguida, entra a UPP. Mas quero dizer a vocês que todas as comunidades, Vila Kennedy, Vila Vintém, serão pacificadas. Nosso governo acabou com o trato com a bandidagem”, disse Cabral, durante o evento.
Em primeiro lugar, Cabral não deve conhecer a zona oeste. Ele não conhece a extensão territorial da zona oeste. Ele desconhece o número de habitantes da região. E também parece não fazer ideia de quantas favelas e quais são as favelas que ocupam bairros como Bangu, Guaratiba, Campo Grande, Sepetiba, Santa Cruz, Paciência, Padre Miguel etc etc...
Cabral também deve desconhecer o plano estratégico das UPP, formulado por sua própria Secretaria de Segurança, que prevê a ocupação das UPP de, no máximo, algo em torno de 100 a 150 favelas (o número exato é controverso, porque a Secretaria vem dividindo as favelas em microfavelas para ampliar sua estatística UPPística, como no caso da Providência, em que a secretaria dividiu a favela em três).
Eu desconheço o número exato das favelas na zona oeste do Rio. Mas posso garantir uma coisa: são muitas. E elas são grandes (e extensas). Uma comunidade como Vila Aliança se junta com outras como a Coreia, Taquaral e Rebu, de forma que você não sabe onde começa uma e termina a outra.
A Vila Kennedy é também monstruosa (a Avenida Brasil passa no meio dela!!!). Isso só para citar as favelas ali da área de Bangu. Nem vou perder tempo enumerando os Cesarinhos, Cesarões e as dezenas de outras favelas da parte mais oeste da zona oeste...
Não preciso nem lembrar que esse é o mesmo governador que diz que vai pacificar o Complexo do Alemão, o Complexo da Maré, a Tijuca, o Centro, o subúrbio... Aliás, já ouvi da boca de Cabral, que ele colocaria UPP em TODO o ESTADO (Inclusive já escrevi isso por aqui).
Onde Cabral vai arrumar tanto policial para ocupar todo o Rio de Janeiro? Como ele vai formar tanto policial em t~ao pouco tempo (quatro anos...)? Onde vai arrumar tanto dinheiro para pagar tanto policial (lembrem-se... ele diz que não pode dar muito aumento aos servidores porque não tem dinheiro)?
Enfim, o que quero dizer é que Cabral sabe que sua promessa nunca será cumprida, como as milhões de promessas que ouvimos todos os anos, de políticos por esse Brasil afora.
Cabral não só sabe que sua promessa é vã, como sabe que está fazendo pouco caso da inteligência de seus eleitores... Mas tudo bem, porque Cabral sabe que, uma vez se reelegendo, ele não precisará cumprir nada e nem prestar contas a ninguém, porque ele não terá que se preocupar com uma nova reeleição pelos próximos anos...
quarta-feira, 21 de julho de 2010
segunda-feira, 12 de julho de 2010
Comércio de armas de fogo aumenta 70% no Brasil desde referendo de 2005
O número de armas de fogo vendidas no Brasil aumentou 70% desde a aprovação do comércio de armas em um referendo nacional, realizado em 2005. Segundo dados da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Exército, obtidos pela Agência Brasil, em 2005 foram vendidas 68 mil armas. Em 2009, esse número já chegava a 116,9 mil.
Neste ano, completam-se cinco anos desde a realização do referendo nacional, no qual a população decidiria se o comércio de armas de fogo e munição deveria ser proibido. A consulta popular havia sido prevista pelo Estatuto do Desarmamento, aprovado dois anos antes, e que impôs regras mais rígidas para o registro de armas.
No referendo, 59 milhões de pessoas optaram por manter o comércio de armas de fogo, contra apenas 33 milhões que queriam a proibição. Os dados do Exército mostram que a venda de armas no país - que havia sido reduzida 89% entre 2001 e 2004 devido ao estatuto - voltou a crescer depois do resultado do referendo.
Apesar do comércio de armas de fogo ainda ser bastante inferior ao de antes do estatuto - em 2001 foram vendidas 566 mil armas no país -, os números mostram um crescimento das vendas entre o ano do referendo e o ano passado.
O sociólogo Antonio Rangel Bandeira, especialista em controle de armas da organização não governamental Viva Rio, que defendeu a proibição do comércio na campanha de 2005, lamenta o resultado do referendo e se diz preocupado com o aumento das vendas de armas de fogo.
“O grande problema do crime é a arma pequena, que é comprada em loja ou roubada do cidadão de bem, que, por sua vez, comprou essa arma numa loja. Ao proibir o comércio, você fecharia uma das grandes fontes, para não dizer a maior fonte, que abastece a criminalidade de armas”, disse.
Já o assessor e ex-subdiretor de Fiscalização da DFPC, coronel Achiles Santos Jacinto Filho, minimiza o crescimento apresentado pelos números do Exército. Segundo ele, o crescimento nos últimos anos, que teve um pico em 2008 com a venda de 133,7 mil armas e uma leve queda em 2009, não foi tão expressivo.
O coronel acredita que o comércio de armas deverá se estabilizar e não alcançará níveis como os do início da década de 2000. “O aumento, principalmente em 2008 e 2009, se deveu a alguns fatores como a autorização para que os policiais pudessem adquirir armas do calibre .40. Então houve umas aquisições que são reflexo disso. Mas a tendência é que se mantenha uma estabilidade no comércio”, afirma o coronel.
Segundo dados do Exército, as armas mais vendidas para os cidadãos comuns são os revólveres e pistolas, nos calibres 32, 38 e 380. Já os policiais e militares adquirem mais as pistolas 9 milímetros e .40.
Os dados do Exército, que se referem às armas nacionais vendidas dentro do país, mostram a seguinte tendência: em 2001 foram vendidas 566,2 mil armas. Esse número caiu para 313,2 mil em 2002 e para 115,9 mil em 2003 (ano do estatuto), atingindo 63,6 mil no ano seguinte. Em 2005, o comércio começou a subir: 68 mil.
A trajetória de crescimento se mantém até 2008, com 81,2 mil armas vendidas em 2006, 92,7 mil em 2007 e 133,7 mil em 2008. Em 2009, as vendas caem para 116,9 mil, ou seja, 70% a mais do que em 2005.
A Agência Brasil também teve acesso aos dados de armas importadas pelo país - exceto aquelas importadas pelas Forças Armadas. O comércio de armamento importado no Brasil também mostra crescimento entre 2009 e 2005. Em 2009, o Brasil importou 3,2 mil armas, isto é, quase três vezes mais do que em 2005, quando foram importadas 1,1 mil.
Polícia Federal diz que falta integração com Exército para controle de armas
Uma determinação do Estatuto do Desarmamento - que poderia garantir maior controle da polícia sobre as armas de fogo no país - ainda não foi cumprida pelas autoridades governamentais, mesmo passados cinco anos do prazo dado pela lei.
O Decreto 5.123, de 2004, regulamentou o estatuto aprovado no ano anterior e previa que os dois sistemas de controle de armas no país - o Sistema Nacional de Armas (Sinarm) da Polícia Federal e o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma) do Exército - deveriam ser integrados até julho de 2005.
O Sinarm é responsável pelas armas de civis, das polícias Federal, Civil e Legislativa, das guardas municipais, dos agentes penitenciários e das empresas de segurança privada. Já o Sigma é responsável pelas armas das Forças Armadas, das polícias e bombeiros militares, dos órgãos da Presidência e de colecionadores, atiradores e caçadores.
A Polícia Federal (PF) diz que, como os sistemas ainda não foram integrados, não pode ter acesso a dados importantes do sistema controlado pelo Exército. Segundo a delegada da Divisão de Repressão ao Tráfico de Armas da PF, Alessandra Borba, o Exército alega que há dados confidenciais no Sigma que podem colocar em risco a segurança nacional, como o tamanho do arsenal das Forças Armadas.
Alessandra Borba diz que concorda com a confidencialidade de alguns dados, mas que há informações no Sigma que poderiam ser compartilhadas com a Polícia Federal sem qualquer problema, como os registros das armas de colecionadores, atiradores e caçadores.
“A gente entende que não tem razão o sigilo em torno desses dados. Muitas instituições não governamentais defendem que não há razão para que esses dados continuem sob o comando do Exército. Sob uma análise objetiva, essa não é uma informação que interesse à segurança nacional. Na verdade, essas pessoas são civis, em sua maioria, com posse de armas, que têm acesso a um arsenal muito maior do que o necessário e que deveriam vir para um cadastro único”, afirma Borba.
O acesso a informações sobre colecionadores, atiradores e caçadores facilitaria à Polícia Federal investigar esquemas de desvio de armas e munições, como o descoberto na Operação Chumbo Grosso. Na ação, realizada em maio deste ano no Rio Grande do Sul, os policiais desarticularam um esquema de desvio de armas por colecionadores, atiradores, clubes de tiro e armeiros - oito pessoas foram presas e mais de 500 armas foram apreendidas.
No caso dessa operação específica, a Polícia Federal dependeu de uma informação repassada pelo Exército, que suspeitou do envolvimento de um major no esquema.
Mas, segundo o coronel Achiles Santos Jacinto Filho, da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Exército, a Polícia Federal já tem acesso a alguns dados do Sigma, ainda que de forma restrita.
De acordo com o oficial, o Exército já encaminhou ao Ministério da Defesa uma proposta de integração dos dois sistemas. “Isso depende de uma portaria interministerial e essa portaria ainda não saiu. Agora, já iniciamos o contato com a Polícia Federal. Nossa intenção é ir lá, conversar com eles para tratarmos desse assunto. Mas friso que existe a integração, o que há é uma demanda da polícia que gostaria de ter mais informações”, afirma o coronel.
Sobre as armas de colecionadores, atiradores e caçadores, Achiles Santos diz que o controle permanece com o Exército porque muitas das armas dessas pessoas são de calibre restrito, cuja responsabilidade de fiscalização cabe aos militares.
Mil e quinhentos militares do Exército fiscalizam produção e comércio de armas
O controle das armas de fogo no Brasil é uma função compartilhada entre a Polícia Federal e o Exército. No entanto, a fiscalização da produção, exportação, importação e dos estabelecimentos comerciais autorizados a vender armas cabe somente ao Exército. A tarefa envolve 1.500 militares, de 270 unidades, que integram uma rede coordenada pela Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC).
De acordo com o assessor da DFPC, coronel Achiles Santos Jacinto Filho, esses militares são responsáveis por vistoriar as fábricas de armas, o comércio especializado, as operações de exportação e importação e parte das autorizações de compra de armas no país.
“A arma só sai da fábrica depois que o fiscal autoriza a circulação desse produto. E quando ela sai da fábrica, já se sabe o destino dela. Por meio do Sistema de Controle Fabril (Sicofa), sabe-se quem é o comprador dessa arma, se foi o comércio, se foi pessoa física, se ela foi exportada”, conta o coronel.
Uma vez no comércio, o Exército diz que mantém o controle da arma por meio de vistorias periódicas nas lojas para verificar os documentos, as condições de segurança, os estoques e calibres que estão sendo vendidos, uma vez que o comércio não pode vender armas de calibre restrito, utilizadas pelas Forças Armadas.
Já a função de controle da venda do comércio para o consumidor final é compartilhada com a Polícia Federal. Em geral, essa tarefa fica com a Polícia Federal, que registra as vendas no Sistema Nacional de Armas (Sinarm). Mas, em alguns casos, como a venda para colecionadores, atiradores e caçadores, o controle é do Exército, que registra as vendas pelo Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma).
O Exército diz que, com esse sistema, consegue fazer um controle efetivo das armas de fogo no país, evitando que esses produtos sejam desviados para as mãos de criminosos. Mas não é o que pensa o sociólogo Antonio Rangel Bandeira, especialista em controle de armas da organização não governamental Viva Rio.
Para Bandeira, o controle do Exército sobre as 666 lojas autorizadas a vender armas no Brasil é muito “ineficiente” e isso foi provado durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Armas, realizada em 2006 na Câmara dos Deputados. Segundo ele, a CPI mostrou que muitas armas vendidas em lojas do Rio de Janeiro acabavam nas mãos de bandidos.
“Temos um descontrole dos comerciantes de armas no Brasil. Queríamos que o controle do comércio passasse do Exército, como é hoje, para a Polícia Federal, por uma razão muito simples: isso não é função de militar, isso é função de polícia, que fiscaliza normalmente o comércio no Brasil para evitar fraude, contrabando e evitar que essas armas acabem vendidas, por baixo do pano, para a bandidagem”, disse Bandeira.
Em defesa do Exército, o coronel Achiles Santos diz que a efetividade do controle se traduz em números. Segundo ele, em 2009, por exemplo, o Exército fez mais de 16 mil vistorias em lojas, fábricas e zonas de importação e exportação de armas.
Mais de mil processos administrativos foram abertos pelo Exército por suspeitas de alguma irregularidade. De acordo com o coronel, a maioria dos processos foi aberto por conta da existência de estoques de armas e munições maiores que os permitidos nos estabelecimentos comerciais. “Isso pode resultar em multas, suspensão do registro e outras sanções previstas no decreto [5.123, de 2004, que regula o comércio de armas no Brasil].”
Em 2009, produção de armas de fogo no Brasil atingiu maior volume da década
Assim como aconteceu com o comércio de armas de fogo, as indústrias fabricantes também sentiram o impacto do Estatuto do Desarmamento, aprovado em 2003, mas se recuperaram depois do referendo de 2005 - quando a população decidiu por manter a comercialização.
Em 2003, a produção atingiu o menor volume da década: 416 mil armas, uma redução de 56,2% em relação a 2001 (951 mil). Já em 2009, a indústria bélica nacional atingiu o recorde do período, com a fabricação de 1,05 milhão de revólveres, pistolas e fuzis. Os dados foram divulgados pela Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Exército.
A aprovação do estatuto tornou mais rígidas as regras para a posse de arma de fogo por civis. Em 2004, a produção continuou baixa em relação aos anos anteriores, com 423 mil unidades fabricadas. Mas em 2005, após o referendo, a produção cresceu 27,4% em relação ao ano anterior - chegando a 539 mil armas fabricadas – e continuou crescendo em 2006 (721 mil), 2007 (917 mil) e 2008 (983 mil), até chegar a 1,05 milhão em 2009.
O Estatuto do Desarmamento também parece ter contribuído para que as indústrias de armas brasileiras - que têm na Taurus e na estatal Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel) suas principais representantes - buscassem exportar mais sua produção. Em 2001, as fábricas exportaram 40,5% de sua produção.
Em 2004, esse percentual subiu para 86% e se mantém praticamente estável até hoje. Em 2009, por exemplo, as indústrias exportaram 88,8% de sua produção.
*Reportagem originalmente publicada, em quatro partes, na Agência Brasil
Neste ano, completam-se cinco anos desde a realização do referendo nacional, no qual a população decidiria se o comércio de armas de fogo e munição deveria ser proibido. A consulta popular havia sido prevista pelo Estatuto do Desarmamento, aprovado dois anos antes, e que impôs regras mais rígidas para o registro de armas.
No referendo, 59 milhões de pessoas optaram por manter o comércio de armas de fogo, contra apenas 33 milhões que queriam a proibição. Os dados do Exército mostram que a venda de armas no país - que havia sido reduzida 89% entre 2001 e 2004 devido ao estatuto - voltou a crescer depois do resultado do referendo.
Apesar do comércio de armas de fogo ainda ser bastante inferior ao de antes do estatuto - em 2001 foram vendidas 566 mil armas no país -, os números mostram um crescimento das vendas entre o ano do referendo e o ano passado.
O sociólogo Antonio Rangel Bandeira, especialista em controle de armas da organização não governamental Viva Rio, que defendeu a proibição do comércio na campanha de 2005, lamenta o resultado do referendo e se diz preocupado com o aumento das vendas de armas de fogo.
“O grande problema do crime é a arma pequena, que é comprada em loja ou roubada do cidadão de bem, que, por sua vez, comprou essa arma numa loja. Ao proibir o comércio, você fecharia uma das grandes fontes, para não dizer a maior fonte, que abastece a criminalidade de armas”, disse.
Já o assessor e ex-subdiretor de Fiscalização da DFPC, coronel Achiles Santos Jacinto Filho, minimiza o crescimento apresentado pelos números do Exército. Segundo ele, o crescimento nos últimos anos, que teve um pico em 2008 com a venda de 133,7 mil armas e uma leve queda em 2009, não foi tão expressivo.
O coronel acredita que o comércio de armas deverá se estabilizar e não alcançará níveis como os do início da década de 2000. “O aumento, principalmente em 2008 e 2009, se deveu a alguns fatores como a autorização para que os policiais pudessem adquirir armas do calibre .40. Então houve umas aquisições que são reflexo disso. Mas a tendência é que se mantenha uma estabilidade no comércio”, afirma o coronel.
Segundo dados do Exército, as armas mais vendidas para os cidadãos comuns são os revólveres e pistolas, nos calibres 32, 38 e 380. Já os policiais e militares adquirem mais as pistolas 9 milímetros e .40.
Os dados do Exército, que se referem às armas nacionais vendidas dentro do país, mostram a seguinte tendência: em 2001 foram vendidas 566,2 mil armas. Esse número caiu para 313,2 mil em 2002 e para 115,9 mil em 2003 (ano do estatuto), atingindo 63,6 mil no ano seguinte. Em 2005, o comércio começou a subir: 68 mil.
A trajetória de crescimento se mantém até 2008, com 81,2 mil armas vendidas em 2006, 92,7 mil em 2007 e 133,7 mil em 2008. Em 2009, as vendas caem para 116,9 mil, ou seja, 70% a mais do que em 2005.
A Agência Brasil também teve acesso aos dados de armas importadas pelo país - exceto aquelas importadas pelas Forças Armadas. O comércio de armamento importado no Brasil também mostra crescimento entre 2009 e 2005. Em 2009, o Brasil importou 3,2 mil armas, isto é, quase três vezes mais do que em 2005, quando foram importadas 1,1 mil.
Polícia Federal diz que falta integração com Exército para controle de armas
Uma determinação do Estatuto do Desarmamento - que poderia garantir maior controle da polícia sobre as armas de fogo no país - ainda não foi cumprida pelas autoridades governamentais, mesmo passados cinco anos do prazo dado pela lei.
O Decreto 5.123, de 2004, regulamentou o estatuto aprovado no ano anterior e previa que os dois sistemas de controle de armas no país - o Sistema Nacional de Armas (Sinarm) da Polícia Federal e o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma) do Exército - deveriam ser integrados até julho de 2005.
O Sinarm é responsável pelas armas de civis, das polícias Federal, Civil e Legislativa, das guardas municipais, dos agentes penitenciários e das empresas de segurança privada. Já o Sigma é responsável pelas armas das Forças Armadas, das polícias e bombeiros militares, dos órgãos da Presidência e de colecionadores, atiradores e caçadores.
A Polícia Federal (PF) diz que, como os sistemas ainda não foram integrados, não pode ter acesso a dados importantes do sistema controlado pelo Exército. Segundo a delegada da Divisão de Repressão ao Tráfico de Armas da PF, Alessandra Borba, o Exército alega que há dados confidenciais no Sigma que podem colocar em risco a segurança nacional, como o tamanho do arsenal das Forças Armadas.
Alessandra Borba diz que concorda com a confidencialidade de alguns dados, mas que há informações no Sigma que poderiam ser compartilhadas com a Polícia Federal sem qualquer problema, como os registros das armas de colecionadores, atiradores e caçadores.
“A gente entende que não tem razão o sigilo em torno desses dados. Muitas instituições não governamentais defendem que não há razão para que esses dados continuem sob o comando do Exército. Sob uma análise objetiva, essa não é uma informação que interesse à segurança nacional. Na verdade, essas pessoas são civis, em sua maioria, com posse de armas, que têm acesso a um arsenal muito maior do que o necessário e que deveriam vir para um cadastro único”, afirma Borba.
O acesso a informações sobre colecionadores, atiradores e caçadores facilitaria à Polícia Federal investigar esquemas de desvio de armas e munições, como o descoberto na Operação Chumbo Grosso. Na ação, realizada em maio deste ano no Rio Grande do Sul, os policiais desarticularam um esquema de desvio de armas por colecionadores, atiradores, clubes de tiro e armeiros - oito pessoas foram presas e mais de 500 armas foram apreendidas.
No caso dessa operação específica, a Polícia Federal dependeu de uma informação repassada pelo Exército, que suspeitou do envolvimento de um major no esquema.
Mas, segundo o coronel Achiles Santos Jacinto Filho, da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Exército, a Polícia Federal já tem acesso a alguns dados do Sigma, ainda que de forma restrita.
De acordo com o oficial, o Exército já encaminhou ao Ministério da Defesa uma proposta de integração dos dois sistemas. “Isso depende de uma portaria interministerial e essa portaria ainda não saiu. Agora, já iniciamos o contato com a Polícia Federal. Nossa intenção é ir lá, conversar com eles para tratarmos desse assunto. Mas friso que existe a integração, o que há é uma demanda da polícia que gostaria de ter mais informações”, afirma o coronel.
Sobre as armas de colecionadores, atiradores e caçadores, Achiles Santos diz que o controle permanece com o Exército porque muitas das armas dessas pessoas são de calibre restrito, cuja responsabilidade de fiscalização cabe aos militares.
Mil e quinhentos militares do Exército fiscalizam produção e comércio de armas
O controle das armas de fogo no Brasil é uma função compartilhada entre a Polícia Federal e o Exército. No entanto, a fiscalização da produção, exportação, importação e dos estabelecimentos comerciais autorizados a vender armas cabe somente ao Exército. A tarefa envolve 1.500 militares, de 270 unidades, que integram uma rede coordenada pela Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC).
De acordo com o assessor da DFPC, coronel Achiles Santos Jacinto Filho, esses militares são responsáveis por vistoriar as fábricas de armas, o comércio especializado, as operações de exportação e importação e parte das autorizações de compra de armas no país.
“A arma só sai da fábrica depois que o fiscal autoriza a circulação desse produto. E quando ela sai da fábrica, já se sabe o destino dela. Por meio do Sistema de Controle Fabril (Sicofa), sabe-se quem é o comprador dessa arma, se foi o comércio, se foi pessoa física, se ela foi exportada”, conta o coronel.
Uma vez no comércio, o Exército diz que mantém o controle da arma por meio de vistorias periódicas nas lojas para verificar os documentos, as condições de segurança, os estoques e calibres que estão sendo vendidos, uma vez que o comércio não pode vender armas de calibre restrito, utilizadas pelas Forças Armadas.
Já a função de controle da venda do comércio para o consumidor final é compartilhada com a Polícia Federal. Em geral, essa tarefa fica com a Polícia Federal, que registra as vendas no Sistema Nacional de Armas (Sinarm). Mas, em alguns casos, como a venda para colecionadores, atiradores e caçadores, o controle é do Exército, que registra as vendas pelo Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma).
O Exército diz que, com esse sistema, consegue fazer um controle efetivo das armas de fogo no país, evitando que esses produtos sejam desviados para as mãos de criminosos. Mas não é o que pensa o sociólogo Antonio Rangel Bandeira, especialista em controle de armas da organização não governamental Viva Rio.
Para Bandeira, o controle do Exército sobre as 666 lojas autorizadas a vender armas no Brasil é muito “ineficiente” e isso foi provado durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Armas, realizada em 2006 na Câmara dos Deputados. Segundo ele, a CPI mostrou que muitas armas vendidas em lojas do Rio de Janeiro acabavam nas mãos de bandidos.
“Temos um descontrole dos comerciantes de armas no Brasil. Queríamos que o controle do comércio passasse do Exército, como é hoje, para a Polícia Federal, por uma razão muito simples: isso não é função de militar, isso é função de polícia, que fiscaliza normalmente o comércio no Brasil para evitar fraude, contrabando e evitar que essas armas acabem vendidas, por baixo do pano, para a bandidagem”, disse Bandeira.
Em defesa do Exército, o coronel Achiles Santos diz que a efetividade do controle se traduz em números. Segundo ele, em 2009, por exemplo, o Exército fez mais de 16 mil vistorias em lojas, fábricas e zonas de importação e exportação de armas.
Mais de mil processos administrativos foram abertos pelo Exército por suspeitas de alguma irregularidade. De acordo com o coronel, a maioria dos processos foi aberto por conta da existência de estoques de armas e munições maiores que os permitidos nos estabelecimentos comerciais. “Isso pode resultar em multas, suspensão do registro e outras sanções previstas no decreto [5.123, de 2004, que regula o comércio de armas no Brasil].”
Em 2009, produção de armas de fogo no Brasil atingiu maior volume da década
Assim como aconteceu com o comércio de armas de fogo, as indústrias fabricantes também sentiram o impacto do Estatuto do Desarmamento, aprovado em 2003, mas se recuperaram depois do referendo de 2005 - quando a população decidiu por manter a comercialização.
Em 2003, a produção atingiu o menor volume da década: 416 mil armas, uma redução de 56,2% em relação a 2001 (951 mil). Já em 2009, a indústria bélica nacional atingiu o recorde do período, com a fabricação de 1,05 milhão de revólveres, pistolas e fuzis. Os dados foram divulgados pela Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Exército.
A aprovação do estatuto tornou mais rígidas as regras para a posse de arma de fogo por civis. Em 2004, a produção continuou baixa em relação aos anos anteriores, com 423 mil unidades fabricadas. Mas em 2005, após o referendo, a produção cresceu 27,4% em relação ao ano anterior - chegando a 539 mil armas fabricadas – e continuou crescendo em 2006 (721 mil), 2007 (917 mil) e 2008 (983 mil), até chegar a 1,05 milhão em 2009.
O Estatuto do Desarmamento também parece ter contribuído para que as indústrias de armas brasileiras - que têm na Taurus e na estatal Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel) suas principais representantes - buscassem exportar mais sua produção. Em 2001, as fábricas exportaram 40,5% de sua produção.
Em 2004, esse percentual subiu para 86% e se mantém praticamente estável até hoje. Em 2009, por exemplo, as indústrias exportaram 88,8% de sua produção.
*Reportagem originalmente publicada, em quatro partes, na Agência Brasil
sexta-feira, 9 de julho de 2010
A saga da imprensa no Morro dos Prazeres: A realidade numa das mais de mil comunidades que ainda não tiveram o "privilégio" de receber uma UPP
Hoje fazendo a cobertura da visita da candidata à Presidência da República pelo PV, Marina Silva, ao Morro dos Prazeres, em Santa Teresa, pude constatar na pele, mais uma vez, que nada (ou muito pouco) mudou na segurança pública no Rio de Janeiro.
Por mais que o governo do estado propague as supostas virtudes das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) e o Instituto de Segurança Pública (ISP) diga que os índices de homícidios e roubos no estado estejam caindo vertiginosamente, a verdade é que muitas áreas do Rio de Janeiro continuam sendo controladas e oprimidas por quadrilhas armadas.
Como cheguei cedo ao Morro dos Prazeres para fazer a cobertura da visita da candidata, tive que procurar o endereço da casa onde ela inauguraria um comitê de campanha. Quem já andou em favela sabe que nomes de ruas e números de casas nem sempre são uma boa referência.
Então, comecei a rodar pela comunidade, dentro do carro de reportagem. Num determinado momento, encontrei o carro da rádio CBN que passava pelo mesmo martírio que eu, em busca do bendito endereço.
A repórter então me contou que seu carro tinha acabado de ser abordado por um bandido armado com uma pistola e que, por isso, ela estava receosa de continuar circulando pela comunidade.
Passamos então a circular em comboio, pela Rua Gomes Lopes, quando o clima começou a ficar mais tenso. Primeiro vimos mais um camarada caminhando pela calçada com uma pistola e encarando nossos carros.
Passamos por ele e, mais a frente, encontramos um grupo de quatro a cinco homens, entre os quais um portando um fuzil, que fizeram sinal para o carro onde eu estava parar. Por algum motivo, o motorista do meu carro resolveu desobedecer a ordem e continuou rodando, sem parar.
Suei frio e fiz um sinal da cruz mental, mas nada sofremos. Os bandidos logo viram que, em seguida, vinha um carro vermelho (e um pouco chamativo) com a marca da CBN e também tentaram abordá-lo. Desta vez, com sucesso.
Nosso carro parou mais na frente, para saber se algo aconteceria com a equipe da CBN. Neste momento, já me imaginava ou tendo que voltar a pé para conversar com os marginais, para resolver qualquer tipo de problema, ou tendo que ligar para a Polícia Militar, para salvar nossos colegas encrencados.
Mas, não. Em alguns segundos, o carro da CBN voltou a andar. Havíamos passado pelas “barricadas” do tráfico no Morro dos Prazeres. Posteriormente, a repórter da CBN contou que os bandidos perguntaram qual era o motivo da nossa presença em seu território. Como a repórter disse que estávamos simplesmente acompanhando Marina Silva e não “bisbilhotando” em sua área, fomos liberados.
Depois, ao deixar nossos carros, encontramos mais companheiros da imprensa, já dentro dos becos da favela, para tentar localizar Marina e sua equipe. Nesse momento, fomos abordados mais uma vez por um grupo de cinco ou seis homens em cima de uma laje.
Mas, desta vez, a abordagem foi bem amigável. Eles não perguntaram nada e, ao ver que estávamos perdidos, simplesmente nos indicaram o caminho onde poderíamos encontrar a candidata.
Bem, contei essa longa história apenas para que isto sirva como uma reflexão para todos os cidadãos do Rio de Janeiro. Apesar de toda fanfarra que a imprensa e as autoridades fazem em torno das supostas políticas de segurança inovadora adotadas pelo atual governo do Rio de Janeiro, a crua realidade nas ruas da cidade é outra.
Como disse, nada ou muito pouco mudou em relação à maioria das favelas do Rio de Janeiro. O Morro dos Prazeres, segundo planejamento do governo do estado, receberá em breve uma UPP e poderá acabar com essa “tirania” das quadrilhas armadas.
Mas levar uma UPP para o Morro dos Prazeres não mudará a realidade de outros 1.500 “morros dos prazeres” existentes em todo o estado do Rio de Janeiro, que continuarão vivendo à margem do Estado, entre o fuzil do bandido e o fuzil do policial.
Por mais que o governo do estado propague as supostas virtudes das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) e o Instituto de Segurança Pública (ISP) diga que os índices de homícidios e roubos no estado estejam caindo vertiginosamente, a verdade é que muitas áreas do Rio de Janeiro continuam sendo controladas e oprimidas por quadrilhas armadas.
Como cheguei cedo ao Morro dos Prazeres para fazer a cobertura da visita da candidata, tive que procurar o endereço da casa onde ela inauguraria um comitê de campanha. Quem já andou em favela sabe que nomes de ruas e números de casas nem sempre são uma boa referência.
Então, comecei a rodar pela comunidade, dentro do carro de reportagem. Num determinado momento, encontrei o carro da rádio CBN que passava pelo mesmo martírio que eu, em busca do bendito endereço.
A repórter então me contou que seu carro tinha acabado de ser abordado por um bandido armado com uma pistola e que, por isso, ela estava receosa de continuar circulando pela comunidade.
Passamos então a circular em comboio, pela Rua Gomes Lopes, quando o clima começou a ficar mais tenso. Primeiro vimos mais um camarada caminhando pela calçada com uma pistola e encarando nossos carros.
Passamos por ele e, mais a frente, encontramos um grupo de quatro a cinco homens, entre os quais um portando um fuzil, que fizeram sinal para o carro onde eu estava parar. Por algum motivo, o motorista do meu carro resolveu desobedecer a ordem e continuou rodando, sem parar.
Suei frio e fiz um sinal da cruz mental, mas nada sofremos. Os bandidos logo viram que, em seguida, vinha um carro vermelho (e um pouco chamativo) com a marca da CBN e também tentaram abordá-lo. Desta vez, com sucesso.
Nosso carro parou mais na frente, para saber se algo aconteceria com a equipe da CBN. Neste momento, já me imaginava ou tendo que voltar a pé para conversar com os marginais, para resolver qualquer tipo de problema, ou tendo que ligar para a Polícia Militar, para salvar nossos colegas encrencados.
Mas, não. Em alguns segundos, o carro da CBN voltou a andar. Havíamos passado pelas “barricadas” do tráfico no Morro dos Prazeres. Posteriormente, a repórter da CBN contou que os bandidos perguntaram qual era o motivo da nossa presença em seu território. Como a repórter disse que estávamos simplesmente acompanhando Marina Silva e não “bisbilhotando” em sua área, fomos liberados.
Depois, ao deixar nossos carros, encontramos mais companheiros da imprensa, já dentro dos becos da favela, para tentar localizar Marina e sua equipe. Nesse momento, fomos abordados mais uma vez por um grupo de cinco ou seis homens em cima de uma laje.
Mas, desta vez, a abordagem foi bem amigável. Eles não perguntaram nada e, ao ver que estávamos perdidos, simplesmente nos indicaram o caminho onde poderíamos encontrar a candidata.
Bem, contei essa longa história apenas para que isto sirva como uma reflexão para todos os cidadãos do Rio de Janeiro. Apesar de toda fanfarra que a imprensa e as autoridades fazem em torno das supostas políticas de segurança inovadora adotadas pelo atual governo do Rio de Janeiro, a crua realidade nas ruas da cidade é outra.
Como disse, nada ou muito pouco mudou em relação à maioria das favelas do Rio de Janeiro. O Morro dos Prazeres, segundo planejamento do governo do estado, receberá em breve uma UPP e poderá acabar com essa “tirania” das quadrilhas armadas.
Mas levar uma UPP para o Morro dos Prazeres não mudará a realidade de outros 1.500 “morros dos prazeres” existentes em todo o estado do Rio de Janeiro, que continuarão vivendo à margem do Estado, entre o fuzil do bandido e o fuzil do policial.
domingo, 4 de julho de 2010
Policiais e bandidos trocam tiros no Cantagalo: O mito do fim do controle armado ilegal nas favelas com UPP cai por terra
Um tiroteio ocorrido na madrugada deste domingo (4), no Morro do Cantagalo, joga, descarga abaixo, um grande mito propagandeado pelo governo do estado: de que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) encerram o controle armado de criminosos nas favelas em que elas são implantadas.
Um homem foi baleado na madrugada de hoje, no Morro do Cantagalo, favela controlada pela Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) desde janeiro deste ano (portanto há seis meses).
O homem teria sido baleado no momento em que policiais da UPP tentaram prender um grupo de quatro homens armados que estavam oferecendo drogas, dentro da favela.
Mas espera um pouco... Pensemos comigo: o Cantagalo tem UPP. O governador do estado, Sérgio Cabral, e o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, vivem dizendo que as UPP acabam com o controle armado ilegal nos territórios. Além disso, nossas autoridades informam que as UPP encerram os confrontos armados. Certo? Pelo menos é o que dizem Cabral e Beltrame.
Então o que faziam quatro homens armados, com drogas, dentro de uma favela supostamente controlada completamente por uma policia que, se diz, impede o controle da comunidade por criminosos? E como foi haver um tiroteio, com vítima, em uma área cujo controle total é da UPP?
Sou só eu ou tem mais gente vendo uma grande contradição em toda essa história? Pelo menos uma coisa eu vejo em tudo isso: as UPP não são aquilo que o governo quer fazer com que pareçam.
Venho escrevendo, desde o ano passado, que as UPP não são esse milagre que Cabral, Beltrame e a imprensa vêm pintando...
Na última semana mesmo, escrevi um post aqui no blog (veja abaixo) sobre as dificuldades de se implantar UPP em grandes favelas do Rio de Janeiro.
Com base nos problemas que a polícia vem enfrentando para acabar com a venda semi-organizada de drogas na Cidade de Deus (a maior favela com UPP até agora), venho insistindo que a UPP é uma estratégia inviável para grandes favelas do subúrbio da cidade do Rio (ex.: Complexo do Alemão, Complexo da Maré).
Sob o meu ponto de vista, com base no paradigma Cidade de Deus, uma ocupação militar nos moldes do Dona Marta e Chapéu Mangueira não conseguirá impedir o controle de favelas como o Complexo do Alemão por quadrilhas armadas.
A ocorrência da madrugada de hoje no Morro do Cantagalo, uma favela de porte pequeno, só reforça minha tese de que o fim da ocupação armada do Alemão poderá não ser obtida com a simples instalação de uma UPP no local.
O Cantagalo é uma favela infinitamente menor, em termos populacionais, domiciliares e de área, do que os complexos do subúrbio e zona oeste do Rio de Janeiro.
Se a UPP, após ficar seis meses instalada na favela, é incapaz de impedir o controle armado de pontos de venda de drogas no Cantagalo, é óbvio que ela não conseguirá isso no vasto Complexo do Alemão.
Mais do que acender um sinal vermelho para a Secretaria de Segurança, que aposta todas suas fichas (políticas e eleitorais) nesse modelo de segurança por controle territorial, o episódio do Morro do Cantagalo serve para revelar, à população, quão falso é o mito de eficácia das UPP.
Um homem foi baleado na madrugada de hoje, no Morro do Cantagalo, favela controlada pela Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) desde janeiro deste ano (portanto há seis meses).
O homem teria sido baleado no momento em que policiais da UPP tentaram prender um grupo de quatro homens armados que estavam oferecendo drogas, dentro da favela.
Mas espera um pouco... Pensemos comigo: o Cantagalo tem UPP. O governador do estado, Sérgio Cabral, e o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, vivem dizendo que as UPP acabam com o controle armado ilegal nos territórios. Além disso, nossas autoridades informam que as UPP encerram os confrontos armados. Certo? Pelo menos é o que dizem Cabral e Beltrame.
Então o que faziam quatro homens armados, com drogas, dentro de uma favela supostamente controlada completamente por uma policia que, se diz, impede o controle da comunidade por criminosos? E como foi haver um tiroteio, com vítima, em uma área cujo controle total é da UPP?
Sou só eu ou tem mais gente vendo uma grande contradição em toda essa história? Pelo menos uma coisa eu vejo em tudo isso: as UPP não são aquilo que o governo quer fazer com que pareçam.
Venho escrevendo, desde o ano passado, que as UPP não são esse milagre que Cabral, Beltrame e a imprensa vêm pintando...
Na última semana mesmo, escrevi um post aqui no blog (veja abaixo) sobre as dificuldades de se implantar UPP em grandes favelas do Rio de Janeiro.
Com base nos problemas que a polícia vem enfrentando para acabar com a venda semi-organizada de drogas na Cidade de Deus (a maior favela com UPP até agora), venho insistindo que a UPP é uma estratégia inviável para grandes favelas do subúrbio da cidade do Rio (ex.: Complexo do Alemão, Complexo da Maré).
Sob o meu ponto de vista, com base no paradigma Cidade de Deus, uma ocupação militar nos moldes do Dona Marta e Chapéu Mangueira não conseguirá impedir o controle de favelas como o Complexo do Alemão por quadrilhas armadas.
A ocorrência da madrugada de hoje no Morro do Cantagalo, uma favela de porte pequeno, só reforça minha tese de que o fim da ocupação armada do Alemão poderá não ser obtida com a simples instalação de uma UPP no local.
O Cantagalo é uma favela infinitamente menor, em termos populacionais, domiciliares e de área, do que os complexos do subúrbio e zona oeste do Rio de Janeiro.
Se a UPP, após ficar seis meses instalada na favela, é incapaz de impedir o controle armado de pontos de venda de drogas no Cantagalo, é óbvio que ela não conseguirá isso no vasto Complexo do Alemão.
Mais do que acender um sinal vermelho para a Secretaria de Segurança, que aposta todas suas fichas (políticas e eleitorais) nesse modelo de segurança por controle territorial, o episódio do Morro do Cantagalo serve para revelar, à população, quão falso é o mito de eficácia das UPP.
sexta-feira, 2 de julho de 2010
A feira de drogas da Cidade de Deus: Os problemas que a polícia vai enfrentar para implantar UPP em grandes favelas do subúrbio do Rio
Eu sempre critico a postura da imprensa carioca, em relação às Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Mas hoje gostaria de parabenizar o jornal O Globo pela reportagem sobre a feira das drogas na Cidade de Deus. A matéria mostra que, apesar da UPP estar lá há mais de um ano, a venda de drogas continua ocorrendo a céu aberto.
Mas, mais que isso, a reportagem nos leva a refletir sobre os desafios que as UPP terão que enfrentar para se instalar em favelas de grande porte, como a Rocinha e os Complexos do Alemão e da Maré, assim como em outras grandes favelas do subúrbio.
Como tenho sempre dito, a UPP funciona quase que “perfeitamente” em favelas pequenas e médias, justamente porque ela trabalha com a lógica da ocupação militar territorial.
Como em qualquer ocupação militar, as ações tornam-se mais difíceis quanto mais complicado é o terreno (já dizia nosso mestre Sun Tzu há séculos).
Com relação à Cidade de Deus, a impressão que tenho pelas ocorrências policiais de lá é que a venda de drogas continua forte (inclusive de forma semi-organizado, como acontece em favelas sem UPP), mas sem a exibição de armas.
Imagino até que os bandidos tenham lá suas pistolas e revólveres guardados (lembrem-se que atividades ilegais exigem, de quando em quando, a demonstração de força). Mas o show de fuzis e pistolas nas ruas parece ter acabado (ou pelo menos sido reduzido de forma expressiva).
Sobre a venda de drogas, eu sou um defensor da legalização de todos os tipos de droga, então não vejo nenhum problema na existência de um negócio como esse na favela. É claro, desde q não haja violência.
O importante dessa história toda não é a venda de drogas, mas a lição que a Secretaria de Segurança deve (ou deveria) estar tirando da ocupação militar da Cidade de Deus.
A CDD (como é carinhosamente conhecida a mundialmente famosa City of God) sempre foi uma comunidade complicada com relação à violência, mas nunca apresentou tantos problemas como o Alemão, a Maré ou a Rocinha, por exemplo.
E,se a polícia está tendo problemas em conter os criminosos lá na comunidade de Jacarepaguá, certamente terá problemas muito maiores nessas outras favelas (principalmente naquelas do subúrbio).
Na Cidade de Deus, os bandidos, de certa forma, não têm competidores. Todo o entorno é tomado por milícias. As quadrilhas de drogas rivais mais próximas estão a quilômetros de distância.
Além do mais, a UPP, também de certa forma, faz um cinturão de segurança no entorno dos pontos de venda de droga, impedindo invasões e problemas com rivais.
Se na CDD, os bandidos não exibem mais suas armas, no Alemão a história poderá ser diferente. Na favela da Penha, as feiras de drogas poderão ter que ser guardadas.
No subúrbio, as favelas são muito mais próximas umas das outras do que em Jacarepaguá. Também no subúrbio, essas comunidades estão mais dividas entre quadrilhas rivais do que na vizinhança da Cidade de Deus.
Uma feira da droga no Alemão poderá necessitar ser guardada de uma possível invasão. Além do mais, bondes de assaltantes (que precisam de armas para conseguir seu objetivo criminal) provavelmente continuarão atuando na região.
Assim, nas favelas do subúrbio, os bandidos poderão ser levados a entrar em rota de colisão com a polícia, o que gerará conflitos diários com os policiais da UPP na região.
Ainda que se coloquem 2 mil policiais no Complexo do Alemão, os criminosos poderão continuar tendo que afrontar a polícia, tanto para cometer seus delitos quanto para defender seus negócios ilícitos de bandidos rivais.
Tudo leva a crer que uma ocupação das favelas do subúrbio não será tranquila e que a UPP não deverá funcionar como na zona sul ou Tijuca (e, no fundo, o governo do Estado sabe disso, tanto é que não arriscará uma jogada como essa antes da eleição, pois os riscos de fracasso são enormes).
Costumo pensar a UPP da Cidade de Deus como um laboratório. Os problemas de lá certamente se amplificarão ao ser transpostos para as favelas mais complicadas do subúrbio.
De qualquer forma, parabéns ao Jornal O Globo, por deixar um pouco de lado a fanfarra em torno das UPP.
Mas, mais que isso, a reportagem nos leva a refletir sobre os desafios que as UPP terão que enfrentar para se instalar em favelas de grande porte, como a Rocinha e os Complexos do Alemão e da Maré, assim como em outras grandes favelas do subúrbio.
Como tenho sempre dito, a UPP funciona quase que “perfeitamente” em favelas pequenas e médias, justamente porque ela trabalha com a lógica da ocupação militar territorial.
Como em qualquer ocupação militar, as ações tornam-se mais difíceis quanto mais complicado é o terreno (já dizia nosso mestre Sun Tzu há séculos).
Com relação à Cidade de Deus, a impressão que tenho pelas ocorrências policiais de lá é que a venda de drogas continua forte (inclusive de forma semi-organizado, como acontece em favelas sem UPP), mas sem a exibição de armas.
Imagino até que os bandidos tenham lá suas pistolas e revólveres guardados (lembrem-se que atividades ilegais exigem, de quando em quando, a demonstração de força). Mas o show de fuzis e pistolas nas ruas parece ter acabado (ou pelo menos sido reduzido de forma expressiva).
Sobre a venda de drogas, eu sou um defensor da legalização de todos os tipos de droga, então não vejo nenhum problema na existência de um negócio como esse na favela. É claro, desde q não haja violência.
O importante dessa história toda não é a venda de drogas, mas a lição que a Secretaria de Segurança deve (ou deveria) estar tirando da ocupação militar da Cidade de Deus.
A CDD (como é carinhosamente conhecida a mundialmente famosa City of God) sempre foi uma comunidade complicada com relação à violência, mas nunca apresentou tantos problemas como o Alemão, a Maré ou a Rocinha, por exemplo.
E,se a polícia está tendo problemas em conter os criminosos lá na comunidade de Jacarepaguá, certamente terá problemas muito maiores nessas outras favelas (principalmente naquelas do subúrbio).
Na Cidade de Deus, os bandidos, de certa forma, não têm competidores. Todo o entorno é tomado por milícias. As quadrilhas de drogas rivais mais próximas estão a quilômetros de distância.
Além do mais, a UPP, também de certa forma, faz um cinturão de segurança no entorno dos pontos de venda de droga, impedindo invasões e problemas com rivais.
Se na CDD, os bandidos não exibem mais suas armas, no Alemão a história poderá ser diferente. Na favela da Penha, as feiras de drogas poderão ter que ser guardadas.
No subúrbio, as favelas são muito mais próximas umas das outras do que em Jacarepaguá. Também no subúrbio, essas comunidades estão mais dividas entre quadrilhas rivais do que na vizinhança da Cidade de Deus.
Uma feira da droga no Alemão poderá necessitar ser guardada de uma possível invasão. Além do mais, bondes de assaltantes (que precisam de armas para conseguir seu objetivo criminal) provavelmente continuarão atuando na região.
Assim, nas favelas do subúrbio, os bandidos poderão ser levados a entrar em rota de colisão com a polícia, o que gerará conflitos diários com os policiais da UPP na região.
Ainda que se coloquem 2 mil policiais no Complexo do Alemão, os criminosos poderão continuar tendo que afrontar a polícia, tanto para cometer seus delitos quanto para defender seus negócios ilícitos de bandidos rivais.
Tudo leva a crer que uma ocupação das favelas do subúrbio não será tranquila e que a UPP não deverá funcionar como na zona sul ou Tijuca (e, no fundo, o governo do Estado sabe disso, tanto é que não arriscará uma jogada como essa antes da eleição, pois os riscos de fracasso são enormes).
Costumo pensar a UPP da Cidade de Deus como um laboratório. Os problemas de lá certamente se amplificarão ao ser transpostos para as favelas mais complicadas do subúrbio.
De qualquer forma, parabéns ao Jornal O Globo, por deixar um pouco de lado a fanfarra em torno das UPP.
quinta-feira, 1 de julho de 2010
O que o Brasil pode aprender com a Califórnia: californianos querem legalizar maconha para reduzir déficit público do estado
O estado da Califórnia, nos Estados Unidos, pode ser pioneiro, ao legalizar o uso recreativo da maconha e taxar o comércio do produto. Os californianos marcaram um referendo para novembro deste ano, em que a população poderá decidir se quer ou não legalizar a substância.
Caso a legalização seja aprovada (e pesquisas de opinião mostram que a maior parte da população parece apoiar a iniciativa), será permitida a posse de até 28 gramas de maconha e cultivar até 2,3 metros quadrados para uso pessoal. Também será permitido aos governos locais (condados e prefeituras) regularem e taxarem o comércio da droga.
A ideia surgiu depois que a Califórnia se deu conta da grana que estava perdendo com o comércio ilegal da planta. Estima-se que bilhões de dólares circulem, anualmente, no comércio ilegal de maconha californiano, enquanto o estado amarga um déficit público de US$ 20 bilhões (R$ 36 bilhões).
Pensaram, então, os californianos: não conseguimos impedir o comércio (estamos tentando há 100 anos), o dinheiro está circulando livremente por aqui (e não ganhamos um centavo deste mercado) e estamos afundados em dívidas, por que não tirar proveito da situação e também lucrar com isso?
Os californianos estimam poder arrecadar entre US$ 2 e 3 bilhões com a taxação do comércio de maconha no estado. Economistas e administradores públicos pensem comigo: seria idiotice não aproveitar esse dinheiro, certo? Certíssimo.
Parece-me que o referendo da Califórnia será um embate entre os dois principais valores americanos: o capitalismo e o (falso)moralismo. Ganhar dinheiro com a venda de uma substância supostamente ilícita ou ignorar os ganhos em defesa de um conservadorismo pseudo-cristão?
A Califórnia já havia sido pioneira ao legalizar o uso medicinal da maconha em 1996, passo que foi seguido por outros estados norte-americanos. Sim, o mesmo país que, internacionalmente, exige que todo mundo reprima as drogas está mostrando-se, internamente, uma sociedade relativamente tolerante. Graças à pressão popular (o
referendo da Califórnia foi pedido por mais de 600 mil pessoas).
O processo californiano em direção à legalização progressiva das drogas é um caso a ser acompanhado pelos brasileiros, assim como o caso português, o holandês entre outros. O Brasil pode não só lucrar com a taxação de determinados produtos hoje considerados ilegais (sabe-se lá por que), como também reduzir os custos (financeiros, sociais e humanos) de sua guerra às drogas. Vamos ver o que acontece por lá e, quem sabe, aprender...
Caso a legalização seja aprovada (e pesquisas de opinião mostram que a maior parte da população parece apoiar a iniciativa), será permitida a posse de até 28 gramas de maconha e cultivar até 2,3 metros quadrados para uso pessoal. Também será permitido aos governos locais (condados e prefeituras) regularem e taxarem o comércio da droga.
A ideia surgiu depois que a Califórnia se deu conta da grana que estava perdendo com o comércio ilegal da planta. Estima-se que bilhões de dólares circulem, anualmente, no comércio ilegal de maconha californiano, enquanto o estado amarga um déficit público de US$ 20 bilhões (R$ 36 bilhões).
Pensaram, então, os californianos: não conseguimos impedir o comércio (estamos tentando há 100 anos), o dinheiro está circulando livremente por aqui (e não ganhamos um centavo deste mercado) e estamos afundados em dívidas, por que não tirar proveito da situação e também lucrar com isso?
Os californianos estimam poder arrecadar entre US$ 2 e 3 bilhões com a taxação do comércio de maconha no estado. Economistas e administradores públicos pensem comigo: seria idiotice não aproveitar esse dinheiro, certo? Certíssimo.
Parece-me que o referendo da Califórnia será um embate entre os dois principais valores americanos: o capitalismo e o (falso)moralismo. Ganhar dinheiro com a venda de uma substância supostamente ilícita ou ignorar os ganhos em defesa de um conservadorismo pseudo-cristão?
A Califórnia já havia sido pioneira ao legalizar o uso medicinal da maconha em 1996, passo que foi seguido por outros estados norte-americanos. Sim, o mesmo país que, internacionalmente, exige que todo mundo reprima as drogas está mostrando-se, internamente, uma sociedade relativamente tolerante. Graças à pressão popular (o
referendo da Califórnia foi pedido por mais de 600 mil pessoas).
O processo californiano em direção à legalização progressiva das drogas é um caso a ser acompanhado pelos brasileiros, assim como o caso português, o holandês entre outros. O Brasil pode não só lucrar com a taxação de determinados produtos hoje considerados ilegais (sabe-se lá por que), como também reduzir os custos (financeiros, sociais e humanos) de sua guerra às drogas. Vamos ver o que acontece por lá e, quem sabe, aprender...
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