terça-feira, 4 de maio de 2010

O Bope e a Maré: a política de colocar batalhões perto das favelas

A decisão de colocar batalhões e sedes de delegacias especializadas dentro ou próximas de favelas tem sido uma das estratégias recentes da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro. Sinceramente, tenho minhas dúvidas se isso terá um impacto positivo na redução da criminalidade do estado.

Bem, mal não vai fazer. Mas, pessoalmente, acredito que também não traz nenhum grande benefício para segurança pública, apesar do alarde que a imprensa tem feito em torno disso.

Gostaria de comentar especialmente a transferência do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar (Bope) para uma área entre o Complexo da Maré e as favelas de Ramos. Ao acompanhar as notícias de hoje (4) sobre o assunto, percebe-se que há uma tentativa de relacionar a instalação do Bope na localidade com o possível fim do domínio das favelas da Maré por criminosos.

O raciocínio é que se o Bope conseguiu manter os criminosos longe da favela de Tavares Bastos, onde está localizado o atual quartel do batalhão, os “caveiras” conseguirão fazer o mesmo com o Complexo da Maré.

Além de grosseira, a comparação entre Tavares Bastos e Complexo da Maré é incorreta. Tavares Bastos é uma favela pequena, no meio do mato, e com apenas duas entradas em plena zona sul da cidade do Rio de Janeiro. Além do mais, o quartel se localiza no alto da comunidade. Para que os homens de preto cheguem ao trabalho e se desloquem para suas operações policiais, eles precisam, na maioria das vezes, passar por dentro da favela.

Isso significa que o tráfego de policiais dentro da pequena favela de Tavares Bastos é ininterrupto, todos os dias, o dia inteiro. Manter a favela livre do controle dos criminosos é natural.

Agora vejamos a situação do Complexo da Maré. Em primeiro lugar, a Maré é um conjunto de várias favelas, que deve ser pelo menos 20 vezes maior do que Tavares Bastos. Além do mais, é uma área dividida entre várias facções criminosas. Não há um comando criminoso único.

Como há uma divisão de poderes dentro da favela, a tensão é sempre grande nessa área, com bandidos fortemente armados e confrontos armados corriqueiros. A Maré é também uma localidade estratégica para essas facções, devido à proximidade com várias vias expressas e com a Baía de Guanabara. Além do mais, há várias entradas e saídas.

E mais, já existe um batalhão da Polícia Militar dentro da favela. O 22o Batalhão fica dentro da favela (apesar de não se comunicar com ela, já que os policiais entram e saem do quartel pela Linha Vermelha). E, desde a instalação desse batalhão, não se viu nenhuma melhoria no que se refere à criminalidade na Maré.

Para completar, o Bope não ficará dentro do Complexo da Maré, o que significa que os policiais não precisarão trafegar diariamente pelas ruas da favela (assim como acontece com o Batalhão da Maré). Resumindo: como não estará o tempo inteiro presente na comunidade, sempre que precisar entrar na favela, o Bope continuará tendo que trocar tiro, assim como acontece hoje.

Logo, o que me parece é que se está usando a desculpa de deslocar o Bope para um terreno próximo ao Complexo da Maré para que o governo do estado se isente das cobranças de colocar ali uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) em breve.

Ao se questionar por que a UPP não chegou à Maré, nossas autoridades poderão responder: “Não dá para chegar a todas as favelas ao mesmo tempo, mas pelo menos colocamos o Bope ali na favela”. E a imprensa ficará satisfeita com isso.

3 comentários:

  1. Vitor,

    Parabéns pela qualidade dos textos e seja bem vindo ao clube dos blogueiros.

    Toma cuidado que isso vicia.

    Abs

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  2. "E a imprensa ficará satisfeita com isso". Ultima frase do texto, e que justifica todas as ações descritas acima dela... Ah se a imprensa fosse isenta... Ah se a imprensa cobrasse...

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  3. Valeu, Romulo... To na área já... Quando tiver alguma novidade da parada dos clubes me dá um toque...

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