Após quase nove meses do início da ocupação policial permanente no Morro da Providência, no centro da cidade do Rio, os moradores do local dizem que a vida pouco mudou nesse período. A ocupação da comunidade, que é considerada a primeira favela do Rio de Janeiro, teve início em março deste ano com uma ação do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar (Bope) e foi consolidada com a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) em abril.
Os resultados da ocupação policial são visíveis no que se refere à segurança. A reportagem da Agência Brasil percorreu ruas e vielas desde o sopé até o cume do morro sem encontrar nenhum criminoso armado, ocorrência que era comum há um ano. Os próprios moradores comemoram a chegada da polícia.
Apesar disso, a maioria das pessoas ouvidas pela Agência Brasil diz que a vida, a rotina e os problemas pouco mudaram desde a instalação da UPP. Sentada na calçada de uma travessa do Morro da Providência, uma moradora de 61 anos, que vive há 41 anos na comunidade, diz que a diferença é que agora não há tiroteios.
“Para mim, a grande diferença é que não há mais tiroteios. Nosso morro já era relativamente tranquilo. Só tinha tiroteio mesmo quando a polícia entrava para fazer operação. Na verdade, os bandidos não incomodavam muito a gente. Então, não sinto grande diferença. Além disso, ainda tem muitos usuários de crack que circulam por aqui”, disse a moradora, que não quis se identificar.
Eliana de Jesus, que vive no morro desde que nasceu, há 50 anos, concorda. “Para mim, também, a única diferença é que não há mais tiroteios. Mas fora isso, a comunidade continua a mesma, com os mesmos problemas”, conta.
Alguns moradores mostraram uma mancha escurecida no calçamento da rua. Até dias atrás, por ali corria esgoto a céu aberto, porque a rede coletora da comunidade estava entupida.
Eles contam que a Associação de Moradores entrou em contato várias vezes com as autoridades responsáveis para pedir que o problema fosse resolvido. Entretanto, nenhum dos pedidos foi atendido. Segundo eles, a rede coletora só foi desobstruída quando uma equipe de televisão foi ao local denunciar o problema. Ainda assim, quando chove, o esgoto volta a correr.
Do outro lado da comunidade, o problema é o mesmo. Numa escadaria que leva da Ladeira do Barroso até uma igrejinha no alto da favela, o esgoto desce pelos degraus, como se fosse uma cascata.
As casas também apresentam problemas. Com exceção de algumas, mais espaçosas, a maioria é caracterizada pelo tamanho reduzido, pela precariedade da edificação e pela falta de iluminação natural e ventilação. Muitas casas se amontoam sobre as outras.
É o caso do local onde mora a costureira Francisca Nascimento de Lima, 54 anos, que vive há 27 anos na favela. Ela mora de aluguel num quarto e sala na comunidade da Pedra Lisa, uma das áreas mais pobres do Morro da Providência. Em seu quarto, dormem ela, o filho excepcional, de 22 anos, e a filha de 8 anos. “O pai deles bebia muito. Preferi me separar”, conta, justificando a ausência do marido.
A costureira diz que não tem condições de morar fora da favela e que decidiu continuar morando no Morro da Providência pela proximidade com o centro da cidade. “Já tentei comprar alguma coisinha para eu morar lá fora. Mas minha renda não permite [fazer financiamento]”, disse.
Francisca estende suas roupas num varal improvisado numa rua próxima à sua casa. A casa, que fica espremida entre um paredão de rocha e outras residências, não tem nenhuma janela voltada para o exterior. Ela diz que não tem espaço, luz nem ventilação suficientes para secar as roupas dentro de casa. “Tenho medo de que roubem minhas roupas lá na rua, mas fazer o quê?”, pergunta.
Enquanto pendura as roupas no varal improvisado, ela comemora o fato de não existirem mais bandidos armados na área, mas reclama do lixo nas ruas e do vazamento de esgoto. “Só não está vazando nada agora, porque estamos sem água. Senão, você veria o esgoto correndo por aqui”, afirma.
Do outro lado do morro, a senhora de 61 anos que não quis se identificar lamenta ainda a ausência de equipamentos de saúde próximos à sua casa. “Sou hipertensa e só tem um posto de saúde aqui perto, mas você não consegue atendimento, não consegue remédio. Tem que esperar desistência [de outro paciente]”, afirma.
A dona de casa Joana D’arc Reinick, 48 anos, mora há 21 anos no Morro da Providência. Ela divide a casa com seis pessoas da família e engrossa o coro daqueles que dizem que pouca coisa mudou na comunidade. “Nossa grande carência aqui é médica. Estamos completamente isolados. Se a pessoa não tiver um plano de saúde não consegue nada. O Hospital Souza Aguiar [localizado próximo dali] só atende agora emergência mesmo”, disse.
Segundo a Secretaria Municipal de Habitação, um grande projeto de urbanização do Morro da Providência está sendo licitado. Com o custo de R$ 119 milhões, o projeto prevê a construção de 264 casas para reassentar moradores de áreas de risco, sobretudo na Pedra Lisa, além do alargamento de ruas e da instalação de um teleférico e de um plano inclinado para facilitar a circulação de pessoas. Está prevista ainda a criação de uma creche para 170 crianças, de um centro esportivo e de um centro de trabalho e renda.
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, a região do Morro da Providência é servida por um posto de saúde no bairro vizinho do Santo Cristo. Há projetos de construção, em 2011, de uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) no centro, que poderá atender aos moradores da comunidade, e a implantação de uma clínica de saúde da família na área.
Já a Secretaria Estadual de Assistência Social informou que tem vários projetos previstos no programa UPP Social. Entre as medidas previstas está a implantação de um centro para a juventude, no ano que vem, a regularização do fornecimento de água, a legalização de empresas, a capacitação de jovens e a coleta domiciliar de lixo.
Considerada a primeira favela do Rio de Janeiro, o Morro da Providência foi ocupado no final do século 19 por ex-combatentes da Guerra de Canudos. Em seu antigo nome, Morro da Favela, está a origem do substantivo usado hoje para dar nome às comunidades carentes do Brasil.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
Abusos e ilegalidades cometidos por policiais no Alemão são alvos de 50 investigações
A Secretaria de Segurança informou que já abriu 50 investigações para apurar denúncias de abusos e crimes cometidos por policiais desde o início da ocupação do Complexo do Alemão, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro. Segundo a secretaria, as investigações necessitam de um prazo mais longo que o usual devido “à fragilidade de testemunhos e provas apresentadas”.
Nesta semana, seis organizações não governamentais apresentaram denúncias referentes à atuação de policiais no conjunto de favelas, que citam ocorrências de roubos, extorsões, ocorrências de tortura, desvio de armas e drogas apreendidas e até execuções de suspeitos. O relatório foi encaminhado à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA).
Segundo as denúncias, coletadas pelas ONGs com moradores da comunidade, policiais promoveram uma verdadeira “caça ao tesouro”, roubando dinheiro, joias e pertences dos criminosos e de moradores. Também há informações de que policiais não apresentaram oficialmente armas e drogas apreendidas, para poder repassá-las a grupos criminosos, como milícias.
Entre as denúncias, também há informações de que os policiais tenham praticado execuções sumárias de suspeitos. As ONGs reclamam que não houve perícias criminais para investigar adequadamente essas mortes. Tampouco foram divulgados os números de presos ou mortos.
As organizações não governamentais dizem que há uma “caixa-preta” no governo do estado do Rio, em relação às operações policiais no Alemão, e comparam a ação deste ano com a de 2007, quando houve 19 mortos, alguns com sinais de execução.
Segundo as ONGs, não adianta culpar individualmente o policial que cometeu erros, já que o problema reside no modelo da polícia e nas falhas do Estado que possibilitam os abusos dos policiais. Elas pedem, portanto, que seja retomado o debate sobre a reforma das polícias.
A Agência Brasil solicitou à Secretaria de Segurança o número de mortos e presos na ocupação do Complexo do Alemão, mas não obteve resposta. A secretaria também não quis comentar as denúncias feitas pelas ONGs.
Em nota, a secretaria informou apenas que o secretário José Mariano Beltrame pediu à Defensoria Pública do Estado, que atendesse às queixas da população local. Segundo a nota, reuniões frequentes têm sido realizadas para avaliar o trabalho da polícia e melhorar o controle.
“A ocupação do Alemão livrou nada menos que 130 mil pessoas da influência direta dos traficantes. Outras 250 mil, que moram na vizinhança, foram beneficiadas. As denúncias serão apuradas, mas o projeto das UPPs [unidades de Polícia Pacificadora] não tem volta”, diz a nota.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
Nesta semana, seis organizações não governamentais apresentaram denúncias referentes à atuação de policiais no conjunto de favelas, que citam ocorrências de roubos, extorsões, ocorrências de tortura, desvio de armas e drogas apreendidas e até execuções de suspeitos. O relatório foi encaminhado à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA).
Segundo as denúncias, coletadas pelas ONGs com moradores da comunidade, policiais promoveram uma verdadeira “caça ao tesouro”, roubando dinheiro, joias e pertences dos criminosos e de moradores. Também há informações de que policiais não apresentaram oficialmente armas e drogas apreendidas, para poder repassá-las a grupos criminosos, como milícias.
Entre as denúncias, também há informações de que os policiais tenham praticado execuções sumárias de suspeitos. As ONGs reclamam que não houve perícias criminais para investigar adequadamente essas mortes. Tampouco foram divulgados os números de presos ou mortos.
As organizações não governamentais dizem que há uma “caixa-preta” no governo do estado do Rio, em relação às operações policiais no Alemão, e comparam a ação deste ano com a de 2007, quando houve 19 mortos, alguns com sinais de execução.
Segundo as ONGs, não adianta culpar individualmente o policial que cometeu erros, já que o problema reside no modelo da polícia e nas falhas do Estado que possibilitam os abusos dos policiais. Elas pedem, portanto, que seja retomado o debate sobre a reforma das polícias.
A Agência Brasil solicitou à Secretaria de Segurança o número de mortos e presos na ocupação do Complexo do Alemão, mas não obteve resposta. A secretaria também não quis comentar as denúncias feitas pelas ONGs.
Em nota, a secretaria informou apenas que o secretário José Mariano Beltrame pediu à Defensoria Pública do Estado, que atendesse às queixas da população local. Segundo a nota, reuniões frequentes têm sido realizadas para avaliar o trabalho da polícia e melhorar o controle.
“A ocupação do Alemão livrou nada menos que 130 mil pessoas da influência direta dos traficantes. Outras 250 mil, que moram na vizinhança, foram beneficiadas. As denúncias serão apuradas, mas o projeto das UPPs [unidades de Polícia Pacificadora] não tem volta”, diz a nota.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
Ministro da Defesa e governador assinam acordo para início das ações do Exército dentro dos Complexos do Alemão e da Penha
O Ministério da Defesa e o governo do Rio firmam amanhã (23) acordo para a organização e o emprego da força de pacificação do Exército nos complexos do Alemão e da Penha. O acordo será assinado pelo ministro Nelson Jobim, pelo comandante do Exército, general Enzo Peri, e pelo governador fluminense, Sergio Cabral.
A polícia do Rio e o Exército fazem operações no Complexo do Alemão desde o fim de novembro. Por enquanto, a atuação dos militares das Forças Armadas está restrita à ocupação dos acessos à favela e à revista de carros e suspeitos nesses locais.
A partir da assinatura do acordo, a força de pacificação, que será comandada pelo Exército e contará com o apoio das polícias Civil e Militar do Rio, poderá começar a atuar. Com a nova força constituída, o Exército passará a ocupar o interior dos complexos do Alemão e da Penha, com poder de revistar e prender suspeitos em flagrante.
A polícia ficará responsável pelo cumprimento de mandados de busca e apreensão dentro de residências suspeitas, no interior das duas comunidades. A objetivo é manter a força de pacificação até a instalação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) nas comunidades, prevista para outubro de 2011.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
A polícia do Rio e o Exército fazem operações no Complexo do Alemão desde o fim de novembro. Por enquanto, a atuação dos militares das Forças Armadas está restrita à ocupação dos acessos à favela e à revista de carros e suspeitos nesses locais.
A partir da assinatura do acordo, a força de pacificação, que será comandada pelo Exército e contará com o apoio das polícias Civil e Militar do Rio, poderá começar a atuar. Com a nova força constituída, o Exército passará a ocupar o interior dos complexos do Alemão e da Penha, com poder de revistar e prender suspeitos em flagrante.
A polícia ficará responsável pelo cumprimento de mandados de busca e apreensão dentro de residências suspeitas, no interior das duas comunidades. A objetivo é manter a força de pacificação até a instalação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) nas comunidades, prevista para outubro de 2011.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
É preciso esperar para ver o que vai acontecer: algumas considerações sobre a ocupação do Complexo do Alemão
Agora, uma semana depois de voltar ao Rio de Janeiro e já inteirado da ocupação do Complexo do Alemão (inclusive tendo participado da cobertura), me sinto um pouco mais a vontade de fazer novas análises da situação.
É claro que uma análise completa sobre a ocupação demanda tempo, já que, só dentro de alguns meses (ou anos) poderemos saber as consequências dessa mega operação envolvendo a polícia e as forças armadas no Complexo. O Alemão será pacificado? A polícia deixará a favela? Os bandidos voltarão a usar a comunidade como quartel-general? Só o tempo irá dizer.
Mas se me perguntarem, agora, qual o ponto mais positivo da ocupação do Complexo do Alemão, não tenho receio de responder: o grande número de armas apreendidas pelos policiais. Até o último balanço de que tive conhecimento, mais de 400 armas foram apreendidas, das quais grande parte são armas longas, como fuzis e metralhadoras.
Mais do que a ocupação do território, a prisão de criminosos ou a ecuperação de veículos roubados, a retirada de mais de 400 armas de circulação representam uma real oportunidade de redução de ocorrências criminais.
Afinal, é com as armas que os bandidos roubam, matam, intimidam, ameaçam, controlam territórios, atiram na polícia entre outras coisas. Sempre defendi que um dos grandes vilões da segurança pública no Brasil é a disseminação descontrolada de armas no país.
Por isso, quando vi, na última terça-feira, a apresentação daquela imensa quantidade de armas apreendidas, fiquei muito feliz. Também achei positivo o fato de os policiais terem apreendido mais de 30 toneladas de maconha e cocaína que seriam vendidos no próprio Complexo e, provavelmente, distribuídas para outras favelas fluminenses. Afinal, essas drogas seriam usadas para enriquecer os bandidos, comprar mais armas e corromper agentes do Estado.
Mas, por enquanto, é só o que posso comemorar em relação ao Alemão. De resto, como disse, é preciso esperar. Esperar para ver no que vai dar toda essa ação tão aplaudida pela imprensa nacional.
Gostaria também, como não poderia deixar de ser feito, de levantar algumas questões:
1) Como será feito o controle e monitoramento das armas apreendidas, para evitar que elas sejam desviadas por policiais inescrupulosos e voltem às mãos dos criminosos?
2) A ocupação do Complexo do Alemão levará pelo menos 11 meses, já que o governo do Estado pediu a permanência das forças armadas até outubro de 2011. O que será feito nesse período para desarticular as quadrilhas nas outras 1.500 favelas? Tudo bem que o Complexo do Alemão era um grande centro “nervoso” do tráfico de drogas fluminense e sua ocupação, com a grande quantidade de armas e drogas apreendidas, causa um baque imenso no Comando Vermelho.
Mas há outros “centros nervosos” de outras quadrilhas e do próprio CV, como a Rocinha (da ADA), Senador Camará/Taquaral (do TCP), Jacarezinho e Manguinhos (do próprio CV) e o Complexo da Maré (que tem várias quadrilhas).
Há ainda favelas “importantes”, como Acari, Vidigal, Complexo do Caju, Vila Kennedy, Vila Vintém, Juramento, Serrinha, Engenho da Rainha, Complexo do Lins, Vigário Geral, Parada de Lucas, São Carlos, Complexo do Rio Comprido, entre outras.
Uma apreensão de 40 toneladas de drogas e de 500 armas causa um baque grande numa quadrilha. Mas não é nada fatal para a sobrevivência desses grupos criminosos.
Falando especificamente do armamento, é claro que 500 armas são apenas uma fração daquilo que está nas mãos dos bandidos. Por mais que eu comemore (e aplauda, sempre com viés crítico) essa apreensão, tenho plena noção de que isso está longe de representar um desarmamento das quadrilhas do Rio de Janeiro. Só para ilustrar o que estou dizendo, a apreensão de 500 armas representa apenas 10% do total apreendido no estado em nove meses, entre janeiro e setembro deste ano.
Segundo o Instituto de Segurança Pública, neste período, foram apreendidas 5.485 armas no estado. Em 2009, haviam sido apreendidas 8.914 armas.
Tendo em vista que a polícia apreende apenas uma parte do que está sob posse dos bandidos, posso fazer uma projeção otimista de que haja, pelo menos, igual número de armas nas mãos de bandidos: isto é, cerca de 5.500 armas.
Há muito foco no Complexo do Alemão, mas o que a polícia está fazendo, nesse momento, para desarticular as quadrilhas que agem nas outras 1.500 favelas do estado do Rio de Janeiro? A julgar pelo número de policiais civis que estão sendo usados para garantir o cerco das entradas do Alemão, imagino que haja poucos policiais civis, nesse momento, se dedicando a sua função de investigar as outras quadrilhas.
A operação no Alemão pode até parecer um grande baque no tráfico de drogas no Rio (e eu até concordo que seja), mas se nada mais for feito para enfraquecer os bandidos que ainda atuam nas demais favelas, essa quadrilha se recuperará.
Uma quadrilha que perde R$ 100 milhões em uma semana, pode muito bem, usando seus contatos, se reabastecer de droga e recuperar esses R$ 100 milhões em 11 meses. Tampouco é difícil se rearmar.
Uns 25 carregamentos ilegais, com 20 armas (o que não é nada improvável, em se tratando de um período de 11 meses), são capazes de fazer os bandidos recuperarem o mesmo poderio bélico que tinham antes da ocupação.
Logo, seria interessante que as autoridades de segurança aproveitassem a disposição das forças armadas e a temporária fragilidade do Comando Vermelho para atacar suas outras bases principais? E por que não atacar logo as outras favelas importantes de outras facções?
Se reerguer depois da perda de um território, ainda que seja a custa de muita droga e arma apreendida, é relativamente fácil, em se tratando de uma lucrativa atividade criminosa como o tráfico de drogas. Mas se recuperar de uma perda quase total de armas, drogas e dinheiro é muito mais difícil.
Não seria preciso ocupar permanentemente nenhuma favela. Bastaria que a polícia e os militares entrassem nessas áreas, ocupassem e vasculhassem o terreno por apenas três a quatro semanas e se retirassem. Nesse esquema, talvez fosse possível atacar duas grandes favelas por mês. No final de um ano, teríamos grandes operações como a do Alemão, em 12 áreas, como a Rocinha, Maré, Jacarezinho, Manguinhos, Vidigal e Taquaral.
Também seria importante que a polícia usasse as informações coletadas na ocupação do Alemão para subsidiar suas investigações, identificar os esquemas de contrabando, rastrear os contatos dos traficantes, interceptar novos carregamentos de armas e drogas e prender todos os grandes chefões ainda soltos.
O impacto seria muito mais devastador, do que simplesmente ocupar um terreno para se implantar uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), por mais simbólico e vasto que seja esse terreno.
3) A imprensa comemorou a entrada da polícia no Complexo do Alemão como se um milagre tivesse acontecido. Nunca coloquei em questão a capacidade da polícia de entrar em qualquer território. Em 2007 e em outras ocasiões, policiais já haviam entrado e tomado o controle (ainda que em um período de tempo muito curto) do Complexo do Alemão.
Na minha humilde opinião, a dificuldade está em ocupar permanentemente o território, isto é, manter o Alemão pacificado por um período de tempo muito grande, como se propõe a UPP.
Como já falei em posts anteriores, a polícia tem extrema dificuldade em manter a UPP da Cidade de Deus (a meu ver um terreno muito mais favorável do que o Complexo da Penha/Alemão). Há dificuldades também em favelas com porte muito menor, como o Pavão/Cantagalo.
Posso me enganar (e tomara que eu me engane), mas a polícia terá extrema dificuldade em garantir um Alemão pacificado com apenas um efetivo permanente de 400 a 500 homens (o efetivo total será de mais de 2 mil homens, mas, com as folgas, apenas uma parte dos policiais estará ao mesmo tempo ocupando o local).
4) De onde sairão os mais de 2 mil homens que integrarão a UPP do Complexo do Alemão e as outras UPP que o governo do estado está prometendo? A PM tem capacidade de formar policiais em um ritmo industrial? Qual será a qualidade desses recrutas e oficiais?
5) Por mais que as forças armadas aparentem disposição em ajudar o governo do Rio, sabemos que os militares são “temperamentais” e agem de acordo com seus próprios interesses. Será do interesse do Exército manter a ocupação do Complexo do Alemão por um tempo tão prolongado quanto deseja Sérgio Cabral? Tenho minhas dúvidas.
Bem, acho que tinha mais algumas coisas para escrever, mas por enquanto acho que já basta. Se lembrar de algo mais, faço um novo post.
É claro que uma análise completa sobre a ocupação demanda tempo, já que, só dentro de alguns meses (ou anos) poderemos saber as consequências dessa mega operação envolvendo a polícia e as forças armadas no Complexo. O Alemão será pacificado? A polícia deixará a favela? Os bandidos voltarão a usar a comunidade como quartel-general? Só o tempo irá dizer.
Mas se me perguntarem, agora, qual o ponto mais positivo da ocupação do Complexo do Alemão, não tenho receio de responder: o grande número de armas apreendidas pelos policiais. Até o último balanço de que tive conhecimento, mais de 400 armas foram apreendidas, das quais grande parte são armas longas, como fuzis e metralhadoras.
Mais do que a ocupação do território, a prisão de criminosos ou a ecuperação de veículos roubados, a retirada de mais de 400 armas de circulação representam uma real oportunidade de redução de ocorrências criminais.
Afinal, é com as armas que os bandidos roubam, matam, intimidam, ameaçam, controlam territórios, atiram na polícia entre outras coisas. Sempre defendi que um dos grandes vilões da segurança pública no Brasil é a disseminação descontrolada de armas no país.
Por isso, quando vi, na última terça-feira, a apresentação daquela imensa quantidade de armas apreendidas, fiquei muito feliz. Também achei positivo o fato de os policiais terem apreendido mais de 30 toneladas de maconha e cocaína que seriam vendidos no próprio Complexo e, provavelmente, distribuídas para outras favelas fluminenses. Afinal, essas drogas seriam usadas para enriquecer os bandidos, comprar mais armas e corromper agentes do Estado.
Mas, por enquanto, é só o que posso comemorar em relação ao Alemão. De resto, como disse, é preciso esperar. Esperar para ver no que vai dar toda essa ação tão aplaudida pela imprensa nacional.
Gostaria também, como não poderia deixar de ser feito, de levantar algumas questões:
1) Como será feito o controle e monitoramento das armas apreendidas, para evitar que elas sejam desviadas por policiais inescrupulosos e voltem às mãos dos criminosos?
2) A ocupação do Complexo do Alemão levará pelo menos 11 meses, já que o governo do Estado pediu a permanência das forças armadas até outubro de 2011. O que será feito nesse período para desarticular as quadrilhas nas outras 1.500 favelas? Tudo bem que o Complexo do Alemão era um grande centro “nervoso” do tráfico de drogas fluminense e sua ocupação, com a grande quantidade de armas e drogas apreendidas, causa um baque imenso no Comando Vermelho.
Mas há outros “centros nervosos” de outras quadrilhas e do próprio CV, como a Rocinha (da ADA), Senador Camará/Taquaral (do TCP), Jacarezinho e Manguinhos (do próprio CV) e o Complexo da Maré (que tem várias quadrilhas).
Há ainda favelas “importantes”, como Acari, Vidigal, Complexo do Caju, Vila Kennedy, Vila Vintém, Juramento, Serrinha, Engenho da Rainha, Complexo do Lins, Vigário Geral, Parada de Lucas, São Carlos, Complexo do Rio Comprido, entre outras.
Uma apreensão de 40 toneladas de drogas e de 500 armas causa um baque grande numa quadrilha. Mas não é nada fatal para a sobrevivência desses grupos criminosos.
Falando especificamente do armamento, é claro que 500 armas são apenas uma fração daquilo que está nas mãos dos bandidos. Por mais que eu comemore (e aplauda, sempre com viés crítico) essa apreensão, tenho plena noção de que isso está longe de representar um desarmamento das quadrilhas do Rio de Janeiro. Só para ilustrar o que estou dizendo, a apreensão de 500 armas representa apenas 10% do total apreendido no estado em nove meses, entre janeiro e setembro deste ano.
Segundo o Instituto de Segurança Pública, neste período, foram apreendidas 5.485 armas no estado. Em 2009, haviam sido apreendidas 8.914 armas.
Tendo em vista que a polícia apreende apenas uma parte do que está sob posse dos bandidos, posso fazer uma projeção otimista de que haja, pelo menos, igual número de armas nas mãos de bandidos: isto é, cerca de 5.500 armas.
Há muito foco no Complexo do Alemão, mas o que a polícia está fazendo, nesse momento, para desarticular as quadrilhas que agem nas outras 1.500 favelas do estado do Rio de Janeiro? A julgar pelo número de policiais civis que estão sendo usados para garantir o cerco das entradas do Alemão, imagino que haja poucos policiais civis, nesse momento, se dedicando a sua função de investigar as outras quadrilhas.
A operação no Alemão pode até parecer um grande baque no tráfico de drogas no Rio (e eu até concordo que seja), mas se nada mais for feito para enfraquecer os bandidos que ainda atuam nas demais favelas, essa quadrilha se recuperará.
Uma quadrilha que perde R$ 100 milhões em uma semana, pode muito bem, usando seus contatos, se reabastecer de droga e recuperar esses R$ 100 milhões em 11 meses. Tampouco é difícil se rearmar.
Uns 25 carregamentos ilegais, com 20 armas (o que não é nada improvável, em se tratando de um período de 11 meses), são capazes de fazer os bandidos recuperarem o mesmo poderio bélico que tinham antes da ocupação.
Logo, seria interessante que as autoridades de segurança aproveitassem a disposição das forças armadas e a temporária fragilidade do Comando Vermelho para atacar suas outras bases principais? E por que não atacar logo as outras favelas importantes de outras facções?
Se reerguer depois da perda de um território, ainda que seja a custa de muita droga e arma apreendida, é relativamente fácil, em se tratando de uma lucrativa atividade criminosa como o tráfico de drogas. Mas se recuperar de uma perda quase total de armas, drogas e dinheiro é muito mais difícil.
Não seria preciso ocupar permanentemente nenhuma favela. Bastaria que a polícia e os militares entrassem nessas áreas, ocupassem e vasculhassem o terreno por apenas três a quatro semanas e se retirassem. Nesse esquema, talvez fosse possível atacar duas grandes favelas por mês. No final de um ano, teríamos grandes operações como a do Alemão, em 12 áreas, como a Rocinha, Maré, Jacarezinho, Manguinhos, Vidigal e Taquaral.
Também seria importante que a polícia usasse as informações coletadas na ocupação do Alemão para subsidiar suas investigações, identificar os esquemas de contrabando, rastrear os contatos dos traficantes, interceptar novos carregamentos de armas e drogas e prender todos os grandes chefões ainda soltos.
O impacto seria muito mais devastador, do que simplesmente ocupar um terreno para se implantar uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), por mais simbólico e vasto que seja esse terreno.
3) A imprensa comemorou a entrada da polícia no Complexo do Alemão como se um milagre tivesse acontecido. Nunca coloquei em questão a capacidade da polícia de entrar em qualquer território. Em 2007 e em outras ocasiões, policiais já haviam entrado e tomado o controle (ainda que em um período de tempo muito curto) do Complexo do Alemão.
Na minha humilde opinião, a dificuldade está em ocupar permanentemente o território, isto é, manter o Alemão pacificado por um período de tempo muito grande, como se propõe a UPP.
Como já falei em posts anteriores, a polícia tem extrema dificuldade em manter a UPP da Cidade de Deus (a meu ver um terreno muito mais favorável do que o Complexo da Penha/Alemão). Há dificuldades também em favelas com porte muito menor, como o Pavão/Cantagalo.
Posso me enganar (e tomara que eu me engane), mas a polícia terá extrema dificuldade em garantir um Alemão pacificado com apenas um efetivo permanente de 400 a 500 homens (o efetivo total será de mais de 2 mil homens, mas, com as folgas, apenas uma parte dos policiais estará ao mesmo tempo ocupando o local).
4) De onde sairão os mais de 2 mil homens que integrarão a UPP do Complexo do Alemão e as outras UPP que o governo do estado está prometendo? A PM tem capacidade de formar policiais em um ritmo industrial? Qual será a qualidade desses recrutas e oficiais?
5) Por mais que as forças armadas aparentem disposição em ajudar o governo do Rio, sabemos que os militares são “temperamentais” e agem de acordo com seus próprios interesses. Será do interesse do Exército manter a ocupação do Complexo do Alemão por um tempo tão prolongado quanto deseja Sérgio Cabral? Tenho minhas dúvidas.
Bem, acho que tinha mais algumas coisas para escrever, mas por enquanto acho que já basta. Se lembrar de algo mais, faço um novo post.
sábado, 4 de dezembro de 2010
Força unificada vai ocupar todo o maciço dos complexos da Penha e do Alemão
O Exército vai passar a fazer, dentro dos próximos dias, a ocupação de todo o maciço dos complexos da Penha e do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro. Para esse trabalho, será constituída uma força de paz unificada, comandada por um oficial do Exército, formada por militares e pela polícia do Rio.
Os militares terão o poder de fazer patrulhamentos, revista de suspeitos e prisões em flagrante, mas não poderão entrar em residências. Os trabalhos de busca e apreensão ficarão por conta de policiais civis e militares. Já a Aeronáutica e a Marinha ficarão de prontidão para apoiar o Exército com os recursos necessários.
As decisões foram tomadas hoje (4) em reunião do ministro da Defesa, Nelson Jobim, com o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e publicadas em uma diretriz ministerial.
“Tínhamos uma missão específica de patrulhamento e proteção do perímetro. As operações de ocupação [do Complexo do Alemão] eram de responsabilidade das autoridades estaduais. Agora isso será feito por uma força unificada, integrada por militares e policiais. O que é importante é que nós temos claramente a plena integração entre as autoridades estaduais e as autoridades federais, com suas respectivas forças militares e policiais”, disse o ministro Nelson Jobim, que não quis adiantar quando a operação terá início e nem o número de militares a ser empregado.
Apesar de o governador ter pedido a permanência dos militares até outubro de 2011, a diretriz não fixa um prazo. O documento prevê que, a cada 30 dias, seja feita uma avaliação pelo Ministério da Defesa e pelo governo do Rio de Janeiro da necessidade de continuar as operações.
Os militares participam da ocupação do Complexo do Alemão desde a semana passada junto com as polícias estaduais. No entanto, o trabalho do Exército, por enquanto, está restrito à realização de um cerco às entradas do conjunto de favelas, com 800 homens. O Complexo da Penha, localizado no mesmo maciço do Alemão e que também será alvo de ocupação da força de paz, ainda não está ocupado.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
Os militares terão o poder de fazer patrulhamentos, revista de suspeitos e prisões em flagrante, mas não poderão entrar em residências. Os trabalhos de busca e apreensão ficarão por conta de policiais civis e militares. Já a Aeronáutica e a Marinha ficarão de prontidão para apoiar o Exército com os recursos necessários.
As decisões foram tomadas hoje (4) em reunião do ministro da Defesa, Nelson Jobim, com o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e publicadas em uma diretriz ministerial.
“Tínhamos uma missão específica de patrulhamento e proteção do perímetro. As operações de ocupação [do Complexo do Alemão] eram de responsabilidade das autoridades estaduais. Agora isso será feito por uma força unificada, integrada por militares e policiais. O que é importante é que nós temos claramente a plena integração entre as autoridades estaduais e as autoridades federais, com suas respectivas forças militares e policiais”, disse o ministro Nelson Jobim, que não quis adiantar quando a operação terá início e nem o número de militares a ser empregado.
Apesar de o governador ter pedido a permanência dos militares até outubro de 2011, a diretriz não fixa um prazo. O documento prevê que, a cada 30 dias, seja feita uma avaliação pelo Ministério da Defesa e pelo governo do Rio de Janeiro da necessidade de continuar as operações.
Os militares participam da ocupação do Complexo do Alemão desde a semana passada junto com as polícias estaduais. No entanto, o trabalho do Exército, por enquanto, está restrito à realização de um cerco às entradas do conjunto de favelas, com 800 homens. O Complexo da Penha, localizado no mesmo maciço do Alemão e que também será alvo de ocupação da força de paz, ainda não está ocupado.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
Polícia ocupa o Complexo do Alemão e diz que não vai sair de lá: Um replay de 2007?
Durante toda a última semana estive fora do Brasil. Estava no Haiti, fazendo reportagens especiais sobre a população haitiana, o cólera e a preparação para as eleições gerais naquele país.
Cheguei ao Rio apenas ontem (28). E, apesar de ter tomado conhecimento sobre os últimos episódios de violência e as consequentes ações policial-militares no estado quando estava no Haiti, busquei não pensar muito no assunto, para não perder meu foco na cobertura que eu estava fazendo.
Por isso, só agora tirei um tempinho para escrever sobre o que vi e ouvi (através da imprensa) em relação a essa questão.
Como ainda não deu tempo de eu me aprofundar no assunto, farei apenas análises superficiais sobre isso..
Gostaria de escrever, em primeiro lugar, sobre as ações criminosas que antecederam a ocupação policial no Complexo do Alemão.
Pelo que vi na imprensa, o governo do Rio atribuiu os ataques de criminosos (assaltos, arrastões, incêndio de ônibus e carros etc) a um desespero dos bandidos, devido à política de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).
A meu ver, ataques que colocam um estado de joelhos estão longe de demonstrar desespero. Pelo contrário, tais ações violentas demonstram que o controle da situação não está nas mãos das autoridades, mas sim nas mãos dos bandidos.
Em posts anteriores nesse blog, eu já havia dito que a “aparente calmaria” do Rio de Janeiro poderia ter como, uma das explicações, uma determinação dos próprios bandidos de reduzir suas ações violentas (Ver "Rio termina primeiro semestre com redução 'MILAGROSA' nos principais crimes: Será que devo acreditar nisso???" e "Os dados de criminalidade do ISP: Verdade ou ficção?")
.
Nesse caso, se o controle da situação estava nas mãos dos bandidos e se a violência diminuíra simplesmente porque o ímpeto violento deles havia arrefecido, então a calmaria poderia ser interrompida a qualquer momento e a cidade ser tomada por um “banho de sangue”.
Ataques violentos em série como os que aconteceram nos últimos dias, já haviam acontecido no estado em larga escala em 2002 e 2006 e, em menor escala, em diversas outras ocasiões.
Quer dizer que, em todas essas ocasiões os bandidos estavam desesperados com as ações de segurança do governo do estado? Se sim, que desespero é esse que dura oito anos e contra o qual as autoridades públicas fluminenses nada conseguem fazer?
E mais, antes da “onda de ataques” dos últimos dias, a imprensa vinha noticiando um “aumento” no número de arrastões nas ruas. Sinais dos ânimos acirrados também vinham sendo sentidos nas guerras entre quadrilhas em diversos pontos do Rio (Santa Cruz, Vila Vintém, Serrinha etc).
Não foi nenhuma surpresa ver essa “suposta onda de ataques” dos últimos dias. Isso tudo mostrava que o controle mantido pelas autoridades de segurança até o momento eram apenas aparentes.
E mais, essas autoridades (governador, secretário de segurança, comandantes e delegados de polícia) pouco fizeram para tentar ganhar o controle da situação (afinal a reeleição estava garantida).
No momento em que os verdadeiros “donos” da situação (os bandidos) acharam que deviam aumentar suas ações violentas no estado, assim eles fizeram. E as autoridades públicas nada conseguiram fazer para impedi-las. O governo do Rio teve apenas uma ação reativa (mesmo assim, alguns dias depois do início da “onda de ataques”).
A segunda coisa sobre a qual gostaria de falar é justamente sobre a resposta dada pelas autoridades para interromper as ações criminosas. Parece que estou vendo uma reprise de um filme de 2007.
Primeiro, o governador Sérgio Cabral assinou seu atestado de incompetência e se ajoelhou ao governo federal, para pedir ajuda a forças federais. Em 2007, Cabral pediu ajuda das forças armadas e da Força Nacional de Segurança. Em 2010, ele pediu ajuda novamente aos militares e à Polícia Federal.
Em 2007, o governo determinou a ocupação do Complexo do Alemão/Penha (primeiro em ações isoladas em fevereiro, depois em ações continuadas durante dois meses entre maio e julho de 2007). Em 2010, o governo determinou a ocupação do Complexo do Alemão.
Em 2007, as ações culminaram numa megaoperação envolvendo mais de mil homens das duas polícias estaduais e da Força Nacional de Segurança. Dezenove pessoas morreram.
Em 2010, uma megaoperação envolvendo dois mil homens ocupou o Complexo do Alemão. Várias pessoas morreram, ficaram feridas ou foram presas.
Em 2007, a Força Nacional de Segurança ficou por vários meses estacionada nas principais entradas do Complexo do Alemão. Em 2010, o governo do Rio diz que os militares vão permanecer por vários meses na favela.
Em 2007, canais de televisão, jornais e revistas festejaram a ação policial. Sem qualquer olhar crítico, algumas revistas como a Época e a Veja publicaram matérias de capa com títulos como “Um marco histórico no combate à violência” e “A guerra necessária para a reconstrução do Rio”.
Tais reportagens diziam que o governo do Rio estava tomando uma medida inédita, que iria acabar com a festa do tráfico no Alemão.
Em 2010 (isso mesmo, três anos depois dessas duas reportagens “históricas”), a imprensa faz o mesmo papel de idiota e festeja a operação policial (dizendo que a ação governamental é histórica), sem sequer esperar para saber os desdobramentos da ação policial. Lembrem que, depois da ação policial de 2007, o Alemão voltou a ser o quartel-general do Comando Vermelho.
Em 2007, Sérgio Cabral diz que a polícia “não vai abandonar o Complexo do Alemão”. Em 2010, Cabral diz que a “polícia não vai sair do Alemão”.
Bem... Espero que eu esteja enganado, mas imagino que estou vendo um replay de tudo que já vi em 2007. E, quem sabe, em 2013, vamos ver tudo de novo...
Cheguei ao Rio apenas ontem (28). E, apesar de ter tomado conhecimento sobre os últimos episódios de violência e as consequentes ações policial-militares no estado quando estava no Haiti, busquei não pensar muito no assunto, para não perder meu foco na cobertura que eu estava fazendo.
Por isso, só agora tirei um tempinho para escrever sobre o que vi e ouvi (através da imprensa) em relação a essa questão.
Como ainda não deu tempo de eu me aprofundar no assunto, farei apenas análises superficiais sobre isso..
Gostaria de escrever, em primeiro lugar, sobre as ações criminosas que antecederam a ocupação policial no Complexo do Alemão.
Pelo que vi na imprensa, o governo do Rio atribuiu os ataques de criminosos (assaltos, arrastões, incêndio de ônibus e carros etc) a um desespero dos bandidos, devido à política de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).
A meu ver, ataques que colocam um estado de joelhos estão longe de demonstrar desespero. Pelo contrário, tais ações violentas demonstram que o controle da situação não está nas mãos das autoridades, mas sim nas mãos dos bandidos.
Em posts anteriores nesse blog, eu já havia dito que a “aparente calmaria” do Rio de Janeiro poderia ter como, uma das explicações, uma determinação dos próprios bandidos de reduzir suas ações violentas (Ver "Rio termina primeiro semestre com redução 'MILAGROSA' nos principais crimes: Será que devo acreditar nisso???" e "Os dados de criminalidade do ISP: Verdade ou ficção?")
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Nesse caso, se o controle da situação estava nas mãos dos bandidos e se a violência diminuíra simplesmente porque o ímpeto violento deles havia arrefecido, então a calmaria poderia ser interrompida a qualquer momento e a cidade ser tomada por um “banho de sangue”.
Ataques violentos em série como os que aconteceram nos últimos dias, já haviam acontecido no estado em larga escala em 2002 e 2006 e, em menor escala, em diversas outras ocasiões.
Quer dizer que, em todas essas ocasiões os bandidos estavam desesperados com as ações de segurança do governo do estado? Se sim, que desespero é esse que dura oito anos e contra o qual as autoridades públicas fluminenses nada conseguem fazer?
E mais, antes da “onda de ataques” dos últimos dias, a imprensa vinha noticiando um “aumento” no número de arrastões nas ruas. Sinais dos ânimos acirrados também vinham sendo sentidos nas guerras entre quadrilhas em diversos pontos do Rio (Santa Cruz, Vila Vintém, Serrinha etc).
Não foi nenhuma surpresa ver essa “suposta onda de ataques” dos últimos dias. Isso tudo mostrava que o controle mantido pelas autoridades de segurança até o momento eram apenas aparentes.
E mais, essas autoridades (governador, secretário de segurança, comandantes e delegados de polícia) pouco fizeram para tentar ganhar o controle da situação (afinal a reeleição estava garantida).
No momento em que os verdadeiros “donos” da situação (os bandidos) acharam que deviam aumentar suas ações violentas no estado, assim eles fizeram. E as autoridades públicas nada conseguiram fazer para impedi-las. O governo do Rio teve apenas uma ação reativa (mesmo assim, alguns dias depois do início da “onda de ataques”).
A segunda coisa sobre a qual gostaria de falar é justamente sobre a resposta dada pelas autoridades para interromper as ações criminosas. Parece que estou vendo uma reprise de um filme de 2007.
Primeiro, o governador Sérgio Cabral assinou seu atestado de incompetência e se ajoelhou ao governo federal, para pedir ajuda a forças federais. Em 2007, Cabral pediu ajuda das forças armadas e da Força Nacional de Segurança. Em 2010, ele pediu ajuda novamente aos militares e à Polícia Federal.
Em 2007, o governo determinou a ocupação do Complexo do Alemão/Penha (primeiro em ações isoladas em fevereiro, depois em ações continuadas durante dois meses entre maio e julho de 2007). Em 2010, o governo determinou a ocupação do Complexo do Alemão.
Em 2007, as ações culminaram numa megaoperação envolvendo mais de mil homens das duas polícias estaduais e da Força Nacional de Segurança. Dezenove pessoas morreram.
Em 2010, uma megaoperação envolvendo dois mil homens ocupou o Complexo do Alemão. Várias pessoas morreram, ficaram feridas ou foram presas.
Em 2007, a Força Nacional de Segurança ficou por vários meses estacionada nas principais entradas do Complexo do Alemão. Em 2010, o governo do Rio diz que os militares vão permanecer por vários meses na favela.
Em 2007, canais de televisão, jornais e revistas festejaram a ação policial. Sem qualquer olhar crítico, algumas revistas como a Época e a Veja publicaram matérias de capa com títulos como “Um marco histórico no combate à violência” e “A guerra necessária para a reconstrução do Rio”.
Tais reportagens diziam que o governo do Rio estava tomando uma medida inédita, que iria acabar com a festa do tráfico no Alemão.
Em 2010 (isso mesmo, três anos depois dessas duas reportagens “históricas”), a imprensa faz o mesmo papel de idiota e festeja a operação policial (dizendo que a ação governamental é histórica), sem sequer esperar para saber os desdobramentos da ação policial. Lembrem que, depois da ação policial de 2007, o Alemão voltou a ser o quartel-general do Comando Vermelho.
Em 2007, Sérgio Cabral diz que a polícia “não vai abandonar o Complexo do Alemão”. Em 2010, Cabral diz que a “polícia não vai sair do Alemão”.
Bem... Espero que eu esteja enganado, mas imagino que estou vendo um replay de tudo que já vi em 2007. E, quem sabe, em 2013, vamos ver tudo de novo...
sábado, 13 de novembro de 2010
Receita inaugura primeira delegacia especializada em fiscalizar grandes contribuintes
A Receita Federal inaugurou ontem (12) uma delegacia especial para fiscalizar e atender as 204 maiores empresas do Rio de Janeiro. O foco da Delegacia Especial de Maiores Contribuintes são as empresas que têm faturamento anual superior a R$ 370 milhões, entre elas a estatal de energia Petrobras.
A delegacia do Rio de Janeiro é a primeira do país destinada a fiscalizar os contribuintes diferenciados, isto é, aqueles que têm maior faturamento. A Receita inaugurará, até o final do ano, unidades nas cidades de São Paulo e Belo Horizonte.
Nas outras sete superintendências da Receita, onde não haverá delegacias como essas, serão criados grupos especiais para fiscalizar o pagamento de impostos por grandes contribuintes. No total, 500 auditores ficarão responsáveis pelo trabalho em todo o país.
O objetivo, segundo o subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, Marcos Vinícius Neder, é acompanhar as 10 mil empresas e as 5 mil pessoas físicas com grande faturamento no país, que contribuem com aproximadamente 75% da arrecadação do órgão.
“Quando as grandes empresas, que têm grande capacidade contributiva, não pagam tributos, o restante da sociedade fica sobrecarregado e acaba pagando a conta. O objetivo é de justiça fiscal”, disse.
O foco principal das delegacias de maiores contribuintes é identificar possíveis tentativas dessas empresas de usar “planejamentos tributários” irregulares para pagar menos tributos, como reorganizações societárias ou o uso de paraísos fiscais. Segundo Neder, ao combater esse tipo de instrumento ilegal, é possível ter um grande crescimento na arrecadação.
“As reorganizações societárias são uma prática muito comum nos grande conglomerados no Brasil. Eles recebem investimentos, organizam a empresa, umas empresas se juntam, outras se separam. E nessas operações, muitas vezes, há o aproveitamento do ágio, que é quando se paga mais do que determinado tipo de ação vale. Esse ágio é possível de ser deduzido, reduzindo o lucro. Essas operações, às vezes, são feitas entre duas partes da mesma empresa, ou seja, o mesmo grupo econômico controla as duas pontas do negócio”, disse Neder.
Segundo ele, em 2009, a Receita Federal fez autuações contra irregularidades no país que somaram R$ 90 bilhões, dos quais R$ 55 bilhões foram contra grandes contribuintes. As novas delegacias contam com o uso de tecnologia e de auditores que receberam treinamento para fiscalizar esses contribuintes diferenciados.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
A delegacia do Rio de Janeiro é a primeira do país destinada a fiscalizar os contribuintes diferenciados, isto é, aqueles que têm maior faturamento. A Receita inaugurará, até o final do ano, unidades nas cidades de São Paulo e Belo Horizonte.
Nas outras sete superintendências da Receita, onde não haverá delegacias como essas, serão criados grupos especiais para fiscalizar o pagamento de impostos por grandes contribuintes. No total, 500 auditores ficarão responsáveis pelo trabalho em todo o país.
O objetivo, segundo o subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, Marcos Vinícius Neder, é acompanhar as 10 mil empresas e as 5 mil pessoas físicas com grande faturamento no país, que contribuem com aproximadamente 75% da arrecadação do órgão.
“Quando as grandes empresas, que têm grande capacidade contributiva, não pagam tributos, o restante da sociedade fica sobrecarregado e acaba pagando a conta. O objetivo é de justiça fiscal”, disse.
O foco principal das delegacias de maiores contribuintes é identificar possíveis tentativas dessas empresas de usar “planejamentos tributários” irregulares para pagar menos tributos, como reorganizações societárias ou o uso de paraísos fiscais. Segundo Neder, ao combater esse tipo de instrumento ilegal, é possível ter um grande crescimento na arrecadação.
“As reorganizações societárias são uma prática muito comum nos grande conglomerados no Brasil. Eles recebem investimentos, organizam a empresa, umas empresas se juntam, outras se separam. E nessas operações, muitas vezes, há o aproveitamento do ágio, que é quando se paga mais do que determinado tipo de ação vale. Esse ágio é possível de ser deduzido, reduzindo o lucro. Essas operações, às vezes, são feitas entre duas partes da mesma empresa, ou seja, o mesmo grupo econômico controla as duas pontas do negócio”, disse Neder.
Segundo ele, em 2009, a Receita Federal fez autuações contra irregularidades no país que somaram R$ 90 bilhões, dos quais R$ 55 bilhões foram contra grandes contribuintes. As novas delegacias contam com o uso de tecnologia e de auditores que receberam treinamento para fiscalizar esses contribuintes diferenciados.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
Confrontos na Serrinha 2: que sofram as criancinhas... do subúrbio
Mais de mil estudantes e crianças em idade pré-escolar, de duas escolas e três creches municipais, ficaram sem aula hoje na região da Serrinha, em Madureira, na zona norte da cidade do Rio, por causa do confronto continuado entre bandidos da favela e os de uma facção rival.
A suspensão das aulas é apenas mais um dos efeitos colaterais dessa disputa territorial criminosa (que ocorre há meses, sob os olhos inertes das autoridades do Estado do Rio de Janeiro).
Na manhã de hoje voltei ao entorno da Serrinha, para acompanhar a operação policial que acontecia no morro vizinho do Juramento (onde estão agrupados os bandidos que tentam invadir a Serrinha).
Os policiais foram ao Juramento para tentar prender os bandidos que a PM baleou em uma troca de tiros ontem na Serrinha e que fugiram pela mata, de volta a favela vizinha.
Cheguei à Serrinha no final da manhã. A ação policial já havia se encerrado. Portanto, não ouvi tiros (o tiro comeu mesmo mais cedo), mas tampouco vi policiamento reforçado no local. Vi apenas o caveirão passando pela Avenida Edgar Romero, já se retirando para seu descanso no quartel.
Sem encontrar policiais na área, voltei para a redação, onde telefonei para o comandante do Batalhão local (o 41o BPM, de Irajá), coronel Alexandre Fontenelle.
Fontenelle me assegurou que a Serrinha esta ocupada ha quase um mês pela Policia Militar, apesar de, nas duas vezes em que fui à favela (domingo e hoje), não ter visto uma farda azul sequer.
Enfim... A guerra continua (há meses), os bandidos jogam sua disputa sangrenta, os cidadãos fluminenses sofrem, nossas crianças ficam sem escola e o governo do estado tapa seus ouvidos, no conforto de seus gabinetes, para não escutar os tiros...
Ps.: E se esses confrontos estivessem prejudicando as aulas dos nossos caros colégios particulares da zona sul, será que nosso Estado faria ouvidos moucos que costuma fazer para nossos cidadãos do subúrbio?
A suspensão das aulas é apenas mais um dos efeitos colaterais dessa disputa territorial criminosa (que ocorre há meses, sob os olhos inertes das autoridades do Estado do Rio de Janeiro).
Na manhã de hoje voltei ao entorno da Serrinha, para acompanhar a operação policial que acontecia no morro vizinho do Juramento (onde estão agrupados os bandidos que tentam invadir a Serrinha).
Os policiais foram ao Juramento para tentar prender os bandidos que a PM baleou em uma troca de tiros ontem na Serrinha e que fugiram pela mata, de volta a favela vizinha.
Cheguei à Serrinha no final da manhã. A ação policial já havia se encerrado. Portanto, não ouvi tiros (o tiro comeu mesmo mais cedo), mas tampouco vi policiamento reforçado no local. Vi apenas o caveirão passando pela Avenida Edgar Romero, já se retirando para seu descanso no quartel.
Sem encontrar policiais na área, voltei para a redação, onde telefonei para o comandante do Batalhão local (o 41o BPM, de Irajá), coronel Alexandre Fontenelle.
Fontenelle me assegurou que a Serrinha esta ocupada ha quase um mês pela Policia Militar, apesar de, nas duas vezes em que fui à favela (domingo e hoje), não ter visto uma farda azul sequer.
Enfim... A guerra continua (há meses), os bandidos jogam sua disputa sangrenta, os cidadãos fluminenses sofrem, nossas crianças ficam sem escola e o governo do estado tapa seus ouvidos, no conforto de seus gabinetes, para não escutar os tiros...
Ps.: E se esses confrontos estivessem prejudicando as aulas dos nossos caros colégios particulares da zona sul, será que nosso Estado faria ouvidos moucos que costuma fazer para nossos cidadãos do subúrbio?
terça-feira, 2 de novembro de 2010
Confrontos na Serrinha: mais um capítulo de um Rio longe de ser pacificado
O Morro da Serrinha, tradicional terra do jongo em Madureira, na zona norte do Rio, tem vivido sob intensos tiroteios nos últimos dias. Essa é apenas mais uma ocorrência de violência no cotidiano do nosso Rio de Janeiro.
Cidadãos são obrigados a conviver com balas zunindo em seus ouvidos, quando não sofrem com experiências mais radicais, como projéteis perfurando seus corpos ou até mesmo tirando suas vidas.
A história desses confrontos na Serrinha começa há muitos meses atrás. Pelo menos desde o inicio do ano, duas facções rivais vem disputando o controle da venda de drogas na Serrinha. Nada diferente do que ocorre em diversos pontos do estado do Rio de Janeiro, sem que o Estado ou a sociedade tomem atitudes concretas para impedir isso.
Situação semelhante de confrontos ocorreu, por exemplo, recentemente no morro vizinho do Juramento, onde a Cruz Vermelha (entidade especializada em atuar em zonas de guerra) tem uma base.
No último domingo (31), dia do segundo turno das eleições, diante dos tiroteios que atingiram a Serrinha durante a madrugada, fui ao local para ver se isso prejudicaria a votação na região.
Fui à escola Carmela Dutra e a Univercidade na Avenida Edgard Romero. E tudo estava tranquilo. Os eleitores votavam normalmente.
Busquei saber se existiam seções eleitorais mais próximas da Serrinha, para saber se locais de votação mais perto do local de confronto haviam sido afetados pelo confronto armado.
Minha ideia era ver se o processo democrático brasileiro estava sendo atrapalhado pela falta de democracia nas áreas carentes do Rio de Janeiro. Nas eleições de 2006, já havia presenciado tal situação absurda, quando seções eleitorais do Complexo da Maré fecharam suas portas durante um tiroteio na favela.
Moradores me indicaram que havia escolas na boca da favela que funcionavam como locais de votação. Fui então até a entrada da Serrinha para tentar localizar uma seção que pudesse ter sido afetada pelos confrontos.
A busca me levou até a entrada da favela, na Rua Pescador Josino. Não encontrei o tal local de votação (encontrei apenas uma escola fechada, a Escola Municipal Darcy do Jongo), mas pude constatar mais uma vez a realidade crua das áreas controladas por criminosos no Rio de Janeiro.
Logo depois da escola, a rua era bloqueada com barricadas. Aqueles objetos jogados no meio da rua não apenas impediam que nosso carro progredisse por aquele caminho, aquilo simbolizava uma fronteira: o asfalto e a Serrinha, onde o Estado não faz questão de se fazer presente.
Eu estava um pouco nervoso por estar por ali. Afinal, poucas horas antes, duas quadrilhas haviam travado uma encarniçada disputa armada pelo território. Os nervos dos bandidos ali naquela favela estavam a flor da pele.
Eu e o motorista paramos o carro de reportagem (caracterizado com o logo da TV Brasil) pouco antes da barricada. Saí do carro e olhei em volta. Não havia sinal de qualquer local de votação naquela área.
Olhei para as barricadas e, mesmo sob aquela tensão, pude imaginar: aquelas barricadas também mostravam um outro Brasil. Enquanto 130 milhões de brasileiros escolhiam seu governante democraticamente. Além da barricada, a disputa pelo poder não se dava pelas urnas, mas pelas armas. Ali nenhum morador escolhia a autoridade local pelo voto.
Mesmo nos poucos minutos que passamos no local, tentando encontrar o tal local de votação que, segundo disseram ficava por ali, passamos a ser observados. As autoridades locais perceberam que havia ali um carro de reportagem não autorizado.
Uma moto passou ao lado do nosso carro, com dois homens (provavelmente integrantes da quadrilha local). Um deles apontou para o nosso carro e alertou o colega da nossa presença.
Percebi que corríamos risco ali. Desisti de localizar o local de votação, entrei no carro e orientei o motorista a dar meia volta e sair daquela No Man`s Land. Senti que a qualquer momento seríamos abordados ou algo pior.
Voltei para o asfalto. Na minha mente, ficava apenas refletindo sobre aquilo. “Esse é o Rio pacificado de Sergio Cabral?”
Dias antes eu tinha passado pela Vila Vintém. Também vi a mesma barricada. Já tinha feito uma reflexão semelhante. Definitivamente, com exceção de poucas favelas da Tijuca e da zona sul, nada mudou no Rio de Janeiro. O Estado e a sociedade continuam anestesiados perante essa realidade esdrúxula que permeia o estado.
E, como já disse por aqui, não é uma UPP que vai resolver o problema. A sociedade, a política, o Estado e a polícia precisam mudar. Mudar suas atitudes, seus métodos, seus padrões, suas prioridadades.
O Rio continua o mesmo. Infelizmente. Serrinha e Vila Vintém são apenas duas das mais de 1.500 favelas do Estado que vivem essa realidade.
A população não consegue enxergar isso. Pelo menos cinco milhões de pessoas não conseguiram enxergar isso e reelegeram o nosso governador, que não fez nada (ou fez muito pouco) para resolver isso. Governador esse que não coloca os pés nessas comunidades e não faz questão nenhuma de resolver o problema delas.
Cidadãos são obrigados a conviver com balas zunindo em seus ouvidos, quando não sofrem com experiências mais radicais, como projéteis perfurando seus corpos ou até mesmo tirando suas vidas.
A história desses confrontos na Serrinha começa há muitos meses atrás. Pelo menos desde o inicio do ano, duas facções rivais vem disputando o controle da venda de drogas na Serrinha. Nada diferente do que ocorre em diversos pontos do estado do Rio de Janeiro, sem que o Estado ou a sociedade tomem atitudes concretas para impedir isso.
Situação semelhante de confrontos ocorreu, por exemplo, recentemente no morro vizinho do Juramento, onde a Cruz Vermelha (entidade especializada em atuar em zonas de guerra) tem uma base.
No último domingo (31), dia do segundo turno das eleições, diante dos tiroteios que atingiram a Serrinha durante a madrugada, fui ao local para ver se isso prejudicaria a votação na região.
Fui à escola Carmela Dutra e a Univercidade na Avenida Edgard Romero. E tudo estava tranquilo. Os eleitores votavam normalmente.
Busquei saber se existiam seções eleitorais mais próximas da Serrinha, para saber se locais de votação mais perto do local de confronto haviam sido afetados pelo confronto armado.
Minha ideia era ver se o processo democrático brasileiro estava sendo atrapalhado pela falta de democracia nas áreas carentes do Rio de Janeiro. Nas eleições de 2006, já havia presenciado tal situação absurda, quando seções eleitorais do Complexo da Maré fecharam suas portas durante um tiroteio na favela.
Moradores me indicaram que havia escolas na boca da favela que funcionavam como locais de votação. Fui então até a entrada da Serrinha para tentar localizar uma seção que pudesse ter sido afetada pelos confrontos.
A busca me levou até a entrada da favela, na Rua Pescador Josino. Não encontrei o tal local de votação (encontrei apenas uma escola fechada, a Escola Municipal Darcy do Jongo), mas pude constatar mais uma vez a realidade crua das áreas controladas por criminosos no Rio de Janeiro.
Logo depois da escola, a rua era bloqueada com barricadas. Aqueles objetos jogados no meio da rua não apenas impediam que nosso carro progredisse por aquele caminho, aquilo simbolizava uma fronteira: o asfalto e a Serrinha, onde o Estado não faz questão de se fazer presente.
Eu estava um pouco nervoso por estar por ali. Afinal, poucas horas antes, duas quadrilhas haviam travado uma encarniçada disputa armada pelo território. Os nervos dos bandidos ali naquela favela estavam a flor da pele.
Eu e o motorista paramos o carro de reportagem (caracterizado com o logo da TV Brasil) pouco antes da barricada. Saí do carro e olhei em volta. Não havia sinal de qualquer local de votação naquela área.
Olhei para as barricadas e, mesmo sob aquela tensão, pude imaginar: aquelas barricadas também mostravam um outro Brasil. Enquanto 130 milhões de brasileiros escolhiam seu governante democraticamente. Além da barricada, a disputa pelo poder não se dava pelas urnas, mas pelas armas. Ali nenhum morador escolhia a autoridade local pelo voto.
Mesmo nos poucos minutos que passamos no local, tentando encontrar o tal local de votação que, segundo disseram ficava por ali, passamos a ser observados. As autoridades locais perceberam que havia ali um carro de reportagem não autorizado.
Uma moto passou ao lado do nosso carro, com dois homens (provavelmente integrantes da quadrilha local). Um deles apontou para o nosso carro e alertou o colega da nossa presença.
Percebi que corríamos risco ali. Desisti de localizar o local de votação, entrei no carro e orientei o motorista a dar meia volta e sair daquela No Man`s Land. Senti que a qualquer momento seríamos abordados ou algo pior.
Voltei para o asfalto. Na minha mente, ficava apenas refletindo sobre aquilo. “Esse é o Rio pacificado de Sergio Cabral?”
Dias antes eu tinha passado pela Vila Vintém. Também vi a mesma barricada. Já tinha feito uma reflexão semelhante. Definitivamente, com exceção de poucas favelas da Tijuca e da zona sul, nada mudou no Rio de Janeiro. O Estado e a sociedade continuam anestesiados perante essa realidade esdrúxula que permeia o estado.
E, como já disse por aqui, não é uma UPP que vai resolver o problema. A sociedade, a política, o Estado e a polícia precisam mudar. Mudar suas atitudes, seus métodos, seus padrões, suas prioridadades.
O Rio continua o mesmo. Infelizmente. Serrinha e Vila Vintém são apenas duas das mais de 1.500 favelas do Estado que vivem essa realidade.
A população não consegue enxergar isso. Pelo menos cinco milhões de pessoas não conseguiram enxergar isso e reelegeram o nosso governador, que não fez nada (ou fez muito pouco) para resolver isso. Governador esse que não coloca os pés nessas comunidades e não faz questão nenhuma de resolver o problema delas.
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
Especialista em segurança diz que Dilma deve investir no policial e acabar com privilégios como prisão especial e foro privilegiado
Os principais desafios na área de segurança para a presidente eleita, Dilma Rousseff, são a melhoria das condições de trabalho dos policiais, o aumento do patrulhamento das fronteiras e do litoral brasileiro e o fim de privilégios, como a prisão especial e o foro privilegiado. A avaliação é do especialista em segurança pública da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jorge da Silva.
Ele, que já foi presidente do Instituto de Segurança Pública do Rio, elogia a disposição de Dilma Rousseff de incentivar a filosofia de policiamento comunitário em todos os estados, a exemplo das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) fluminenses.
Ele acredita, no entanto, que a presidente eleita precisa se concentrar também em questões fundamentais para a melhoria da segurança pública, como as condições de trabalho dos policiais, inclusive com aumento de salário.
“Nós sabemos que hoje os policiais no Brasil ganham salários irrisórios. Existe a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 300 [que prevê aumento de salário para policiais de todo o país], que o governo federal deixou de lado. As pessoas no Brasil querem que os policiais ganhem uma miséria e sejam honestos. Aí não tem condição”, diz.
O especialista afirma ainda que o governo federal deveria focar nas suas atribuições constitucionais, como a garantia da segurança das fronteiras e da costa brasileira, para impedir a ação de criminosos nessas áreas. Para isso, Jorge da Silva defende a atuação das Forças Armadas nessas regiões ou a criação de uma polícia de fronteira, a exemplo de outros países.
Na sua opinião, o governo de Dilma também deveria defender, por meio de propostas de emenda à Constituição (PEC) ou projetos de lei, o fim de privilégios existentes para alguns cidadãos, como o foro privilegiado e a prisão especial. Junto a isso, o governo federal deveria investir na reforma do sistema penitenciário.
“O sistema penitenciário existe como um depósito de gente pobre. Para mexer nisso, é preciso acabar com esses institutos, como a prisão especial e a imunidade parlamentar. O governo precisa fazer sua parte, porque, se esperar o Congresso, o Congresso não vai fazer”, afirma.
Jorge da Silva também diz que o governo de Dilma precisaria investir numa mudança de paradigma das instituições policiais, que hoje funcionam sob uma ótica militar. “A polícia brasileira, principalmente a dos estados, atua com um ethos militarista e não policial”, disse.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
Ele, que já foi presidente do Instituto de Segurança Pública do Rio, elogia a disposição de Dilma Rousseff de incentivar a filosofia de policiamento comunitário em todos os estados, a exemplo das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) fluminenses.
Ele acredita, no entanto, que a presidente eleita precisa se concentrar também em questões fundamentais para a melhoria da segurança pública, como as condições de trabalho dos policiais, inclusive com aumento de salário.
“Nós sabemos que hoje os policiais no Brasil ganham salários irrisórios. Existe a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 300 [que prevê aumento de salário para policiais de todo o país], que o governo federal deixou de lado. As pessoas no Brasil querem que os policiais ganhem uma miséria e sejam honestos. Aí não tem condição”, diz.
O especialista afirma ainda que o governo federal deveria focar nas suas atribuições constitucionais, como a garantia da segurança das fronteiras e da costa brasileira, para impedir a ação de criminosos nessas áreas. Para isso, Jorge da Silva defende a atuação das Forças Armadas nessas regiões ou a criação de uma polícia de fronteira, a exemplo de outros países.
Na sua opinião, o governo de Dilma também deveria defender, por meio de propostas de emenda à Constituição (PEC) ou projetos de lei, o fim de privilégios existentes para alguns cidadãos, como o foro privilegiado e a prisão especial. Junto a isso, o governo federal deveria investir na reforma do sistema penitenciário.
“O sistema penitenciário existe como um depósito de gente pobre. Para mexer nisso, é preciso acabar com esses institutos, como a prisão especial e a imunidade parlamentar. O governo precisa fazer sua parte, porque, se esperar o Congresso, o Congresso não vai fazer”, afirma.
Jorge da Silva também diz que o governo de Dilma precisaria investir numa mudança de paradigma das instituições policiais, que hoje funcionam sob uma ótica militar. “A polícia brasileira, principalmente a dos estados, atua com um ethos militarista e não policial”, disse.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
Morro do Encontro e Complexo do Lins sem UPP: O risco da Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá se tornar a nova Faixa de Gaza carioca
A Polícia Militar está neste momento ocupando mais uma comunidade da região da Grande Tijuca, para implantar Unidades de Polícia Pacificadora (UPP): Morro dos Macacos. Em breve, será a vez da área de São João/Matriz.
Com essas duas favelas, a Secretaria de Segurança dá mais um passo para consolidar o cinturão “pacificador” da Tijuca. Já foram ocupados o Andaraí, o Borel, a Formiga, o Salgueiro e o Turano. Há planos de brevemente ocupar a Mangueira e os complexos de favelas do Catumbi e Rio de Comprido (São Carlos, Mineira, Coroa, Fallet, Fogueteiro, Prazeres etc).
O cronograma da UPP não menciona, pelo menos por enquanto, a ocupação de duas favelas que precisariam fazer parte desse cinturão: o Morro do Encontro, que é separado do Morro dos Macacos por apenas duas ruas, e o Complexo do Lins, conjunto de favelas vizinho ao Morro do Encontro.
Ambas favelas ficam no maciço do Grajaú e são cortadas pela Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá, única ligação direta de Jacarepaguá com a Grande Tijuca. Sem uma ocupação por UPP, essas serão umas das poucas na região sem a presença policial.
A Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá já tem um histórico de arrastões, tiroteios e bloqueios por criminosos.
Diante desse histórico e do fato de ser uma das poucas áreas sem a presença permanente da polícia, a Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá pode se tornar uma nova Faixa de Gaza, um lugar perigoso para motoristas que precisam trafegar diariamente por essa via.
Por enquanto, a Grajaú-Jacarepaguá tem passado praticamente ilesa por essa onda de arrastões e assaltos que têm assolado o Rio de Janeiro. Mas esse quadro pode mudar depois da instalação da UPP nas favelas vizinhas dos Macacos e Matriz/São João e, posteriormente, de outras comunidades como a Mangueira, Fogueteiro, Prazeres, Fallet etc.
Com essas duas favelas, a Secretaria de Segurança dá mais um passo para consolidar o cinturão “pacificador” da Tijuca. Já foram ocupados o Andaraí, o Borel, a Formiga, o Salgueiro e o Turano. Há planos de brevemente ocupar a Mangueira e os complexos de favelas do Catumbi e Rio de Comprido (São Carlos, Mineira, Coroa, Fallet, Fogueteiro, Prazeres etc).
O cronograma da UPP não menciona, pelo menos por enquanto, a ocupação de duas favelas que precisariam fazer parte desse cinturão: o Morro do Encontro, que é separado do Morro dos Macacos por apenas duas ruas, e o Complexo do Lins, conjunto de favelas vizinho ao Morro do Encontro.
Ambas favelas ficam no maciço do Grajaú e são cortadas pela Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá, única ligação direta de Jacarepaguá com a Grande Tijuca. Sem uma ocupação por UPP, essas serão umas das poucas na região sem a presença policial.
A Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá já tem um histórico de arrastões, tiroteios e bloqueios por criminosos.
Diante desse histórico e do fato de ser uma das poucas áreas sem a presença permanente da polícia, a Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá pode se tornar uma nova Faixa de Gaza, um lugar perigoso para motoristas que precisam trafegar diariamente por essa via.
Por enquanto, a Grajaú-Jacarepaguá tem passado praticamente ilesa por essa onda de arrastões e assaltos que têm assolado o Rio de Janeiro. Mas esse quadro pode mudar depois da instalação da UPP nas favelas vizinhas dos Macacos e Matriz/São João e, posteriormente, de outras comunidades como a Mangueira, Fogueteiro, Prazeres, Fallet etc.
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Tropa de Elite 2 e o verdadeiro problema da segurança no Rio de Janeiro
Sugiro a quem ainda não viu o filme que não leia este artigo, já que ele revela o final da história
Ontem assisti ao filme Tropa de Elite 2 no cinema. Devo dizer que me identifiquei muito com algumas partes do filme. Em especial com o final do filme. O enredo coaduna com tudo o que venho escrevendo neste blog e no meu twitter (@vitorabdala) há meses.
Não vou aqui entrar em detalhes e nem dizer o que é verdadeiro e o que é falso no filme (até porque meu amigo Jorge Antônio Barros, o Repórter de Crime, já o fez em um artigo para o caderno Rio Show, de O Globo, na última sexta-feira, com muito mais competência do que eu poderia ter feito).
Quero apenas ressaltar uma parte importante do enredo do filme que, talvez, o espectador do filme não tenha dado a devida atenção. Uma parte que, pelo menos para mim, é a mais importante de Tropa de Elite 2: a mudança de pensamento do personagem principal do filme, Coronel Nascimento (vivido por Wagner Moura).
A mudança no pensamento de coronel Nascimento é radical, mas vai se dando vagarosamente ao longo do filme. Tropa de Elite 2 começa com coronel Nascimento pensando como um verdadeiro caveira: a eliminação do bandido é o caminho para a solução dos problemas e para a pacificação do estado do Rio de Janeiro.
Durante a cena de uma rebelião no presídio de Bangu 1, o chefe da principal facção criminosa do Rio de Janeiro toma o controle da penitenciária a fim de eliminar seus oponentes da quadrilha rival.
Nascimento, então comandante do Batalhão de Operações Especiais (Bope), é chamado a intervir para acabar com a rebelião e pensa que a solução é deixar todo mundo se matar dentro do presídio. Ele imagina que a solução é deixar que os bandidos se matem entre si e que o Bope elimine quem sobreviver.
Mas o coronel caveira logo tem seus planos frustrados porque um “intelectualzinho de esquerda, pertencente a uma ONG de direitos humanos” resolve intervir para por um fim à barbárie, a pedido do governador, que não quer mortes para que isso não afete sua reeleição. Coronel Nascimento pensa que seria muito mais fácil se não existisse o “pessoal dos direitos humanos” para defender bandido.
No final, apesar dos esforços do ativista de direitos humanos (o historiador Fraga, que depois se torna deputado estadual), o Bope acaba executando o chefe da rebelião. O episódio pega mal para Nascimento e a cúpula do governo e da segurança resolvem castigar o coronel.
Mas, para a surpresa do governo, Nascimento é aclamado pela sociedade. O caveira é aplaudido nas ruas pelo povo, que está cansado de ver sangue no Rio de Janeiro e que, por isso, paradoxalmente, defende que a polícia resolva os problemas derramando mais sangue.
A contragosto, o governador (em busca da reeleição) se vê obrigado a atender ao “povo”, para não perder votos, e pune o “herói” caveira com uma promoção. Nascimento deixa o comando do Bope e assume a Subsecretaria de Inteligência.
Na cadeira de subsecretário, Nascimento ainda mantém sua visão deturpada de resolver o crime matando traficante e vê sua nova posição hierárquica como uma oportunidade de tornar o Bope uma “máquina de guerra”.
O coronel-subsecretário continua achando que a culpa de todos os males é de duas dúzias de raquíticos favelados empunhando fuzis dentro das favelas e dos maconheiros (que, na visão deturpada de Nascimento, são os verdadeiros culpados, porque eles financiariam a guerra).
Nascimento segue em sua cruzada moral para “limpar” a cidade dos favelados raquíticos com seus fuzis. O coronel diz que sua estratégia quebra a espinha do tráfico.
Em sua visão deturpada de mundo (talvez criada durante seu exigente treinamento militar, talvez gerada pelo convívio com colegas de farda, talvez construída a partir de informações obtidas por uma mídia falso-moralista), coronel Nascimento é incapaz de ver o óbvio: o problema não são os magrinhos que, muitas vezes, sequer sabem usar as potentes armas que empunham.
O buraco é bem mais embaixo. O problema da violência tem raízes muito mais profundas do que a visão através da mira do fuzil é capaz de compreender.
Nascimento continua sendo muito eficiente para matar, de forma sistemática, a suposta “escória social”, a suposta “causa de todos os males”. Mas com todo seu treinamento militar e sua vontade de acabar com o crime, o caveira é incapaz de ver que está sendo usado apenas como um peão num jogo de xadrez bestial.
Nascimento está cegado pelo mesmo senso comum que cega toda a sociedade: o bandido pobre é mal e, ao eliminá-lo, estaremos salvando a sociedade do caos. Ele não vê que, cada vez mais, o Estado se solidariza com o crime.
No filme, as milícias se espalham pelo Estado, controladas por agentes do Estado e aceitas (até apoiadas!) pelos mais altos escalões da administração pública.
A sociedade, a imprensa e o herói caveira não vêem isso. Ninguém é capaz de perceber que o problema nunca foram os magrinhos.
É preciso que um “intelectualzinho de esquerda, ativista dos direitos humanos e suposto defensor de bandidos”, o agora deputado Fraga, chame a atenção para o novo fenômeno.
Ao contrário do coronel Nascimento, o deputado-historiador Fraga, na verdade, sabe que o problema das milícias é apenas a manifestação de mais um sintoma de uma doença que, como um câncer ou uma síndrome de imunodeficiência, vai consumindo a sociedade fluminense e brasileira.
Fraga sempre soube que o problema não era o bandidinho de merda da favela. Ele sempre soube que não adiantava eliminar 10 mil favelados. Ele sempre soube que deixar os chefes das facções se matarem dentro de um presídio decrépito não resolveria. Ele sempre soube que a carnificina proporcionada pela polícia dentro das favelas não reduziria a violência.
Fraga sempre soube que o problema é mais profundo. Ele sempre soube que um sistema penitenciário falido é uma bomba-relógio (qualquer um que conhece a história das principais facções criminosas do Brasil, todas surgidas dentro de presídios, também saberia).
Fraga sempre soube que a polícia fluminense (e a brasileira como um todo) está corrompida de cima abaixo. Ele sempre soube que as leis brasileiras só funcionam para alguns, que elas só punem os pobres. Ele sempre soube que a tal impunidade que tanto se fala na imprensa só beneficia os ricos.
Aliás, Fraga sempre soube muitas outras coisas (apesar do filme não revelar isso, eu imagino que ele sempre soube de várias outras coisas). Ele sempre soube, por exemplo, que os políticos não se interessam por resolver os problemas reais da população, porque é na pobreza, na necessidade e na ignorância que o clientelismo político se prolifera. É na desigualdade social que o sistema político se retroalimenta e que os políticos se reelegem infinitamente.
Fraga sempre soube que a sociedade brasileira é uma sociedade doente. Ele sempre soube que não adianta vigiar apenas os pobres e tapar o olho para as ilegalidades cometidos pelos ricos e poderosos. Ele sempre soube que caveirão não entra em condomínio de luxo para prender traficantes.
Fraga sempre soube que uma pessoa ferida na zona sul choca muito mais a imprensa (e consequentemente a sociedade) do que uma chacina de 30 mortos na Baixada Fluminense. Ele sempre soube que banqueiros e deputados nunca vão presos (e que seus processos sempre são prescritos antes do julgamento). Ele sempre soube que políticos bandidos dificilmente terão suas candidaturas cassadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ele sempre soube que as autoridades governamentais manipulam dados, falseiam a realidade, entorpecem a sociedade com uma falsa ideia de um Rio pacificado, mesmo que o estado viva um caos.
Ele sabe que não adianta ficar contando corpos aos milhares nas favelas, enquanto todo a polícia, a Justiça, a política, as instituições públicas existirem para defender interesses particulares.
Fraga não é burro. Fraga sempre dedicou sua vida a tentar entender a sociedade. Fraga tem uma visão mais ampla da segurança pública.
O problema é que Fraga é uma voz minoritária. Ele não consegue fazer com que sua voz reverbere fora da universidade. Ele não consegue fazer com que o povo compreenda seu pensamento. Ele não consegue nadar contra a maré do senso comum, das notícias policiais simplistas, dos programas sensacionalistas da TV, da visão predominante no botequim, do discurso governamental.
Por isso Fraga (visto equivocadamente pela sociedade como um defensor de bandidos) foi capaz de ver o fenômeno das milícias, foi capaz de ver quem eram os verdadeiros bandidos. Coisa que o coronel caveira e a sociedade não conseguiu ver de início.
Nascimento vai acordando para a verdade aos poucos, ao começar a perceber que os inimigos não eram os magrinhos da favela, mas seus colegas de Secretaria, seus subordinados na polícia, o comandante-em-chefe do estado do Rio de Janeiro (em busca de reeleição) no Palácio Guanabara.
Nascimento desperta de vez quando seu filho é fuzilado dentro do carro e quando ele próprio é alvo de um atentado promovido por policiais, a mando do ex-secretário de Segurança (e candidato a deputado federal).
Então, como se livrasse dos grilhões e saísse da caverna do mito de Platão, Nascimento acorda. Ele vê que o “intelectualzinho defensor de bandido” estava certo. Ele então decide abrir o jogo e aceita depor na CPI das Milícias.
Num final devastador, Tropa de Elite 2 mostra um coronel caveira matador se lamentando por ter sido usado como um peão num jogo de xadrez que não tem fim e no qual a sociedade e a verdadeira polícia nunca sairão ganhando. Por mais que centenas de peões policiais matem milhares de peões bandidos, os reis e rainhas nunca serão colocados em xeque.
Então, coronel Nascimento (com mais mortes nas costas do que Jason, Alien e o Predador juntos) se pergunta, como que num dilema Hamletiano: Por que matei tanta gente? Para quem matei toda essa gente?
A resposta é: Nascimento matou toda aquela gente para que o jogo sujo de faz-de-conta continuasse. As autoridades de segurança fingem que resolvem o problema matando bandidos e inocentes, ocupando favelas, fazendo operações policiais, instalando Unidades de Polícia (pseudo)Pacificadora, para que toda a sujeira continue acontecendo. Para que os esquemas de corrupção continuem ocorrendo. Para que o dinheiro para a campanha continue entrando nos cofres dos candidatos. Para que a sociedade ache que o problema está sendo resolvido. Para que deputados, prefeitos, senadores e governadores continuem sendo eleitos e reeleitos.
Então, Nascimento encerra o filme com uma pergunta que bate como um verdadeiro soco no estômago dos fluminenses (principalmente duas semanas depois do resultado de uma eleição estadual): quem é o culpado por isso tudo?
Afinal, quem mantém todo esse sistema funcionando? Quem vai manter esse sistema por pelo menos mais quatro anos? Quem é capaz de mudar o sistema com o simples teclar em uma urna eletrônica?
Ontem assisti ao filme Tropa de Elite 2 no cinema. Devo dizer que me identifiquei muito com algumas partes do filme. Em especial com o final do filme. O enredo coaduna com tudo o que venho escrevendo neste blog e no meu twitter (@vitorabdala) há meses.
Não vou aqui entrar em detalhes e nem dizer o que é verdadeiro e o que é falso no filme (até porque meu amigo Jorge Antônio Barros, o Repórter de Crime, já o fez em um artigo para o caderno Rio Show, de O Globo, na última sexta-feira, com muito mais competência do que eu poderia ter feito).
Quero apenas ressaltar uma parte importante do enredo do filme que, talvez, o espectador do filme não tenha dado a devida atenção. Uma parte que, pelo menos para mim, é a mais importante de Tropa de Elite 2: a mudança de pensamento do personagem principal do filme, Coronel Nascimento (vivido por Wagner Moura).
A mudança no pensamento de coronel Nascimento é radical, mas vai se dando vagarosamente ao longo do filme. Tropa de Elite 2 começa com coronel Nascimento pensando como um verdadeiro caveira: a eliminação do bandido é o caminho para a solução dos problemas e para a pacificação do estado do Rio de Janeiro.
Durante a cena de uma rebelião no presídio de Bangu 1, o chefe da principal facção criminosa do Rio de Janeiro toma o controle da penitenciária a fim de eliminar seus oponentes da quadrilha rival.
Nascimento, então comandante do Batalhão de Operações Especiais (Bope), é chamado a intervir para acabar com a rebelião e pensa que a solução é deixar todo mundo se matar dentro do presídio. Ele imagina que a solução é deixar que os bandidos se matem entre si e que o Bope elimine quem sobreviver.
Mas o coronel caveira logo tem seus planos frustrados porque um “intelectualzinho de esquerda, pertencente a uma ONG de direitos humanos” resolve intervir para por um fim à barbárie, a pedido do governador, que não quer mortes para que isso não afete sua reeleição. Coronel Nascimento pensa que seria muito mais fácil se não existisse o “pessoal dos direitos humanos” para defender bandido.
No final, apesar dos esforços do ativista de direitos humanos (o historiador Fraga, que depois se torna deputado estadual), o Bope acaba executando o chefe da rebelião. O episódio pega mal para Nascimento e a cúpula do governo e da segurança resolvem castigar o coronel.
Mas, para a surpresa do governo, Nascimento é aclamado pela sociedade. O caveira é aplaudido nas ruas pelo povo, que está cansado de ver sangue no Rio de Janeiro e que, por isso, paradoxalmente, defende que a polícia resolva os problemas derramando mais sangue.
A contragosto, o governador (em busca da reeleição) se vê obrigado a atender ao “povo”, para não perder votos, e pune o “herói” caveira com uma promoção. Nascimento deixa o comando do Bope e assume a Subsecretaria de Inteligência.
Na cadeira de subsecretário, Nascimento ainda mantém sua visão deturpada de resolver o crime matando traficante e vê sua nova posição hierárquica como uma oportunidade de tornar o Bope uma “máquina de guerra”.
O coronel-subsecretário continua achando que a culpa de todos os males é de duas dúzias de raquíticos favelados empunhando fuzis dentro das favelas e dos maconheiros (que, na visão deturpada de Nascimento, são os verdadeiros culpados, porque eles financiariam a guerra).
Nascimento segue em sua cruzada moral para “limpar” a cidade dos favelados raquíticos com seus fuzis. O coronel diz que sua estratégia quebra a espinha do tráfico.
Em sua visão deturpada de mundo (talvez criada durante seu exigente treinamento militar, talvez gerada pelo convívio com colegas de farda, talvez construída a partir de informações obtidas por uma mídia falso-moralista), coronel Nascimento é incapaz de ver o óbvio: o problema não são os magrinhos que, muitas vezes, sequer sabem usar as potentes armas que empunham.
O buraco é bem mais embaixo. O problema da violência tem raízes muito mais profundas do que a visão através da mira do fuzil é capaz de compreender.
Nascimento continua sendo muito eficiente para matar, de forma sistemática, a suposta “escória social”, a suposta “causa de todos os males”. Mas com todo seu treinamento militar e sua vontade de acabar com o crime, o caveira é incapaz de ver que está sendo usado apenas como um peão num jogo de xadrez bestial.
Nascimento está cegado pelo mesmo senso comum que cega toda a sociedade: o bandido pobre é mal e, ao eliminá-lo, estaremos salvando a sociedade do caos. Ele não vê que, cada vez mais, o Estado se solidariza com o crime.
No filme, as milícias se espalham pelo Estado, controladas por agentes do Estado e aceitas (até apoiadas!) pelos mais altos escalões da administração pública.
A sociedade, a imprensa e o herói caveira não vêem isso. Ninguém é capaz de perceber que o problema nunca foram os magrinhos.
É preciso que um “intelectualzinho de esquerda, ativista dos direitos humanos e suposto defensor de bandidos”, o agora deputado Fraga, chame a atenção para o novo fenômeno.
Ao contrário do coronel Nascimento, o deputado-historiador Fraga, na verdade, sabe que o problema das milícias é apenas a manifestação de mais um sintoma de uma doença que, como um câncer ou uma síndrome de imunodeficiência, vai consumindo a sociedade fluminense e brasileira.
Fraga sempre soube que o problema não era o bandidinho de merda da favela. Ele sempre soube que não adiantava eliminar 10 mil favelados. Ele sempre soube que deixar os chefes das facções se matarem dentro de um presídio decrépito não resolveria. Ele sempre soube que a carnificina proporcionada pela polícia dentro das favelas não reduziria a violência.
Fraga sempre soube que o problema é mais profundo. Ele sempre soube que um sistema penitenciário falido é uma bomba-relógio (qualquer um que conhece a história das principais facções criminosas do Brasil, todas surgidas dentro de presídios, também saberia).
Fraga sempre soube que a polícia fluminense (e a brasileira como um todo) está corrompida de cima abaixo. Ele sempre soube que as leis brasileiras só funcionam para alguns, que elas só punem os pobres. Ele sempre soube que a tal impunidade que tanto se fala na imprensa só beneficia os ricos.
Aliás, Fraga sempre soube muitas outras coisas (apesar do filme não revelar isso, eu imagino que ele sempre soube de várias outras coisas). Ele sempre soube, por exemplo, que os políticos não se interessam por resolver os problemas reais da população, porque é na pobreza, na necessidade e na ignorância que o clientelismo político se prolifera. É na desigualdade social que o sistema político se retroalimenta e que os políticos se reelegem infinitamente.
Fraga sempre soube que a sociedade brasileira é uma sociedade doente. Ele sempre soube que não adianta vigiar apenas os pobres e tapar o olho para as ilegalidades cometidos pelos ricos e poderosos. Ele sempre soube que caveirão não entra em condomínio de luxo para prender traficantes.
Fraga sempre soube que uma pessoa ferida na zona sul choca muito mais a imprensa (e consequentemente a sociedade) do que uma chacina de 30 mortos na Baixada Fluminense. Ele sempre soube que banqueiros e deputados nunca vão presos (e que seus processos sempre são prescritos antes do julgamento). Ele sempre soube que políticos bandidos dificilmente terão suas candidaturas cassadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ele sempre soube que as autoridades governamentais manipulam dados, falseiam a realidade, entorpecem a sociedade com uma falsa ideia de um Rio pacificado, mesmo que o estado viva um caos.
Ele sabe que não adianta ficar contando corpos aos milhares nas favelas, enquanto todo a polícia, a Justiça, a política, as instituições públicas existirem para defender interesses particulares.
Fraga não é burro. Fraga sempre dedicou sua vida a tentar entender a sociedade. Fraga tem uma visão mais ampla da segurança pública.
O problema é que Fraga é uma voz minoritária. Ele não consegue fazer com que sua voz reverbere fora da universidade. Ele não consegue fazer com que o povo compreenda seu pensamento. Ele não consegue nadar contra a maré do senso comum, das notícias policiais simplistas, dos programas sensacionalistas da TV, da visão predominante no botequim, do discurso governamental.
Por isso Fraga (visto equivocadamente pela sociedade como um defensor de bandidos) foi capaz de ver o fenômeno das milícias, foi capaz de ver quem eram os verdadeiros bandidos. Coisa que o coronel caveira e a sociedade não conseguiu ver de início.
Nascimento vai acordando para a verdade aos poucos, ao começar a perceber que os inimigos não eram os magrinhos da favela, mas seus colegas de Secretaria, seus subordinados na polícia, o comandante-em-chefe do estado do Rio de Janeiro (em busca de reeleição) no Palácio Guanabara.
Nascimento desperta de vez quando seu filho é fuzilado dentro do carro e quando ele próprio é alvo de um atentado promovido por policiais, a mando do ex-secretário de Segurança (e candidato a deputado federal).
Então, como se livrasse dos grilhões e saísse da caverna do mito de Platão, Nascimento acorda. Ele vê que o “intelectualzinho defensor de bandido” estava certo. Ele então decide abrir o jogo e aceita depor na CPI das Milícias.
Num final devastador, Tropa de Elite 2 mostra um coronel caveira matador se lamentando por ter sido usado como um peão num jogo de xadrez que não tem fim e no qual a sociedade e a verdadeira polícia nunca sairão ganhando. Por mais que centenas de peões policiais matem milhares de peões bandidos, os reis e rainhas nunca serão colocados em xeque.
Então, coronel Nascimento (com mais mortes nas costas do que Jason, Alien e o Predador juntos) se pergunta, como que num dilema Hamletiano: Por que matei tanta gente? Para quem matei toda essa gente?
A resposta é: Nascimento matou toda aquela gente para que o jogo sujo de faz-de-conta continuasse. As autoridades de segurança fingem que resolvem o problema matando bandidos e inocentes, ocupando favelas, fazendo operações policiais, instalando Unidades de Polícia (pseudo)Pacificadora, para que toda a sujeira continue acontecendo. Para que os esquemas de corrupção continuem ocorrendo. Para que o dinheiro para a campanha continue entrando nos cofres dos candidatos. Para que a sociedade ache que o problema está sendo resolvido. Para que deputados, prefeitos, senadores e governadores continuem sendo eleitos e reeleitos.
Então, Nascimento encerra o filme com uma pergunta que bate como um verdadeiro soco no estômago dos fluminenses (principalmente duas semanas depois do resultado de uma eleição estadual): quem é o culpado por isso tudo?
Afinal, quem mantém todo esse sistema funcionando? Quem vai manter esse sistema por pelo menos mais quatro anos? Quem é capaz de mudar o sistema com o simples teclar em uma urna eletrônica?
quinta-feira, 7 de outubro de 2010
Ao tentar mostrar que Rio de Janeiro está pacificado, Lula convida cidadãos a visitar Complexos do Alemão e Manguinhos
O problema é que as duas favelas citadas por Lula não são ocupadas por Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Pelo contrário, figuram entre os principais redutos de bandidos do Rio de Janeiro
Causou constrangimento, uma declaração do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, hoje (7) em uma cerimônia em Angra dos Reis, ao tentar elogiar o “governo” de Sérgio Cabral, seu aliado político.
Ao tentar mostrar que Sérgio Cabral conseguiu “pacificar” o Rio de Janeiro, Lula diz que o estado não aparece mais nas páginas de polícia dos jornais e que agora, graças a Cabral, é possível visitar favelas como o Complexo do Alemão e Manguinhos, na zona norte da cidade, e Pavão-Pavãozinho, na zona sul.
Lula queria dizer que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) trouxeram paz ao Rio de Janeiro. Mas seu tiro acabou saindo pela culatra. Das três favelas citadas por Lula, apenas o Pavão tem UPP. Alemão e Manguinhos não estão controladas pela polícia pacificadora.
Pelo contrário, Alemão e Manguinhos são dois dos principais redutos de quadrilhas armadas do Rio de Janeiro. O Complexo do Alemão é considerado o quartel-general de uma quadrilha que domina centenas de favelas no estado do Rio.
Já Manguinhos é o grande responsável pela alcunha “Faixa de Gaza”, dada à região que inclui a própria favela, à vizinha Jacarezinho e às vias que passam em seu entorno (Linha Amarela, Leopoldo Bulhões, Dom Hélder Câmara, Avenida dos Democráticos, Viaduto de Benfica).
Presidente, sabe o que vai acontecer ao cidadão que resolver seguir sua dica e visitar as favelas do Alemão e de Manguinhos? É certo que esse cidadão será abordado por bandidos fortemente armados que escarnecem da política de segurança medíocre de Cabral e esse mesmo cidadão terá que explicar sua presença naquele espaço.
O cidadão terá sorte se for liberado sem sofrer, pelo menos, o trauma psicológico de ser abordado por bandidos de fuzis e metralhadoras.
Presidente Lula, pelo visto, parece que o senhor, mesmo sendo um político profissional e um governante capaz, caiu no conto do vigário da propaganda político-eleitoral das UPP de Sérgio Cabral.
Presidente Lula, me parece que a propaganda de Cabral foi tão eficaz que te fez crer que as UPP mudaram a realidade do estado do Rio de Janeiro.
Sinto te informar, presidente. Mas o senhor foi ludibriado com essa propaganda, assim como o foram 5 milhões de fluminenses que reelegeram nosso nobre governador.
As UPP não são tão boas quanto a propaganda do governo do estado do Rio de Janeiro as fazem parecer. Elas são uma política extremamente restritas. Elas atendem a menos de 2,5% da população fluminense e a apenas cerca de 2% das comunidades carentes do estado.
E essas tais UPP só atendem às áreas mais nobres do estado, justamente as regiões menos violentas e onde mora a parte mais rica da população fluminense. Logo o senhor, que defende tanto a igualdade entre pobres e ricos, deveria atentar para esse detalhe.
E os 97,5% restantes da população? E as outras 1.500 favelas do estado que continuam controladas por bandidos armados no Rio de Janeiro? E as ruas? As vias expressas? Bem, essas continuam sendo tão violentas quanto eram há um, dois, três, dez, 20 anos atrás.
Os arrastões, as guerras de quadrilhas, as balas perdidas, os ataques a policiais, a corrupção da polícia mostram isso.
Então, atenção, presidente: antes de acreditar na propaganda do governo de Sérgio Cabral, procure se informar. E evite convidar a população para entrar em áreas que ainda continuam e, ao que tudo indica, continuarão por muitos anos, controladas por bandidos armados.
Causou constrangimento, uma declaração do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, hoje (7) em uma cerimônia em Angra dos Reis, ao tentar elogiar o “governo” de Sérgio Cabral, seu aliado político.
Ao tentar mostrar que Sérgio Cabral conseguiu “pacificar” o Rio de Janeiro, Lula diz que o estado não aparece mais nas páginas de polícia dos jornais e que agora, graças a Cabral, é possível visitar favelas como o Complexo do Alemão e Manguinhos, na zona norte da cidade, e Pavão-Pavãozinho, na zona sul.
Lula queria dizer que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) trouxeram paz ao Rio de Janeiro. Mas seu tiro acabou saindo pela culatra. Das três favelas citadas por Lula, apenas o Pavão tem UPP. Alemão e Manguinhos não estão controladas pela polícia pacificadora.
Pelo contrário, Alemão e Manguinhos são dois dos principais redutos de quadrilhas armadas do Rio de Janeiro. O Complexo do Alemão é considerado o quartel-general de uma quadrilha que domina centenas de favelas no estado do Rio.
Já Manguinhos é o grande responsável pela alcunha “Faixa de Gaza”, dada à região que inclui a própria favela, à vizinha Jacarezinho e às vias que passam em seu entorno (Linha Amarela, Leopoldo Bulhões, Dom Hélder Câmara, Avenida dos Democráticos, Viaduto de Benfica).
Presidente, sabe o que vai acontecer ao cidadão que resolver seguir sua dica e visitar as favelas do Alemão e de Manguinhos? É certo que esse cidadão será abordado por bandidos fortemente armados que escarnecem da política de segurança medíocre de Cabral e esse mesmo cidadão terá que explicar sua presença naquele espaço.
O cidadão terá sorte se for liberado sem sofrer, pelo menos, o trauma psicológico de ser abordado por bandidos de fuzis e metralhadoras.
Presidente Lula, pelo visto, parece que o senhor, mesmo sendo um político profissional e um governante capaz, caiu no conto do vigário da propaganda político-eleitoral das UPP de Sérgio Cabral.
Presidente Lula, me parece que a propaganda de Cabral foi tão eficaz que te fez crer que as UPP mudaram a realidade do estado do Rio de Janeiro.
Sinto te informar, presidente. Mas o senhor foi ludibriado com essa propaganda, assim como o foram 5 milhões de fluminenses que reelegeram nosso nobre governador.
As UPP não são tão boas quanto a propaganda do governo do estado do Rio de Janeiro as fazem parecer. Elas são uma política extremamente restritas. Elas atendem a menos de 2,5% da população fluminense e a apenas cerca de 2% das comunidades carentes do estado.
E essas tais UPP só atendem às áreas mais nobres do estado, justamente as regiões menos violentas e onde mora a parte mais rica da população fluminense. Logo o senhor, que defende tanto a igualdade entre pobres e ricos, deveria atentar para esse detalhe.
E os 97,5% restantes da população? E as outras 1.500 favelas do estado que continuam controladas por bandidos armados no Rio de Janeiro? E as ruas? As vias expressas? Bem, essas continuam sendo tão violentas quanto eram há um, dois, três, dez, 20 anos atrás.
Os arrastões, as guerras de quadrilhas, as balas perdidas, os ataques a policiais, a corrupção da polícia mostram isso.
Então, atenção, presidente: antes de acreditar na propaganda do governo de Sérgio Cabral, procure se informar. E evite convidar a população para entrar em áreas que ainda continuam e, ao que tudo indica, continuarão por muitos anos, controladas por bandidos armados.
terça-feira, 5 de outubro de 2010
Eleições terminam e continuam os casos de violência no estado: Agora, o governador vai culpar a quem?
No período antes das eleições deste ano, pipocaram inúmeros casos de violência pelo estado do Rio de Janeiro. Arrastões na zona norte, na Baixada Fluminense e na zona sul. Guerra de bandidos em vários pontos do estado. Trocas de tiros pela cidade. Turistas feitos de reféns por bandidos em hotel de luxo em São Conrado.
Os cidadãos permaneceram impotentes, como sempre ficaram nos últimos 20 ou 30 anos no estado do Rio de Janeiro, observando a violência de bandidos, a brutalidade de policiais e a inépcia das autoridades públicas do estado.
Os episódios chegaram a dar um fôlego para os políticos de oposição ao governador Sérgio Cabral, que aproveitaram a desgraça e o caos social para tentar lucrar politicamente com isso (como sempre fazem os políticos no nosso grande Brasil).
Diante da proximidade das eleições e da incapacidade de dar uma resposta à altura para a sociedade fluminense, nosso comandante-em-chefe Sérgio Cabral resolveu assumir uma postura, no mínimo, cínica.
Em declarações à imprensa, o governador disse estranhar que as ocorrências de violência e os arrastões estivessem acontecendo justamente antes das eleições, numa clara tentativa de politizar um problema que seu governo era incapaz de resolver.
Ao responder dessa forma a um questionamento da sociedade, Cabral cometeu, pelo menos, dois erros. O primeiro deles é tentar fazer o povo acreditar que bandidos armados iam botar a cara a tapa na rua, assaltar pessoas, roubar joias e celulares para correr o risco de entrar em um embate com a polícia, simplesmente porque tinham o interesse político de desmoralizar Sérgio Cabral.
O segundo erro foi tentar fazer crer que, nos oito ou nove meses anteriores, o Rio de Janeiro tinha vivenciado um mar de rosas, sem arrastões, guerras entre quadrilhas, homicídios ou o controle armado de territórios.
Mas tudo bem, Sérgio Cabral estava envolvido no jogo político e temendo perder uma disputa eleitoral. Ele acabou recorrendo a instrumentos que políticos costumam recorrer em situações como essa.
O problema é que a eleição passou, Cabral foi reeleito por mais de 5 milhões de fluminenses (quem acompanha meu blog deve ter percebido que eu me orgulho de não fazer parte desse imenso contingente), mas o problema dos arrastões, briga de quadrilhas e tantos outros tipos de violência continuam ocorrendo diariamente no nosso estado.
As últimas ocorrências, veiculadas nos telejornais de hoje (5), foram a tentativa de invasão do Parque Alegria que resultou em intenso tiroteio, a ameaça de atentado contra a delegacia de Bonsucesso e a ocorrência de mais um assalto na Rua Presidente Carlos Campos (localizada em frente ao Palácio Guanabara, sede do governo).
E agora, Cabral? Vai culpar a quem?
A quem o governador, primeiro responsável pela política de segurança do estado, pode culpar além de si próprio por ser incapaz de reduzir de forma consistente, nos três anos e nove meses em que governou, a violência no estado do Rio de Janeiro.
Os cidadãos permaneceram impotentes, como sempre ficaram nos últimos 20 ou 30 anos no estado do Rio de Janeiro, observando a violência de bandidos, a brutalidade de policiais e a inépcia das autoridades públicas do estado.
Os episódios chegaram a dar um fôlego para os políticos de oposição ao governador Sérgio Cabral, que aproveitaram a desgraça e o caos social para tentar lucrar politicamente com isso (como sempre fazem os políticos no nosso grande Brasil).
Diante da proximidade das eleições e da incapacidade de dar uma resposta à altura para a sociedade fluminense, nosso comandante-em-chefe Sérgio Cabral resolveu assumir uma postura, no mínimo, cínica.
Em declarações à imprensa, o governador disse estranhar que as ocorrências de violência e os arrastões estivessem acontecendo justamente antes das eleições, numa clara tentativa de politizar um problema que seu governo era incapaz de resolver.
Ao responder dessa forma a um questionamento da sociedade, Cabral cometeu, pelo menos, dois erros. O primeiro deles é tentar fazer o povo acreditar que bandidos armados iam botar a cara a tapa na rua, assaltar pessoas, roubar joias e celulares para correr o risco de entrar em um embate com a polícia, simplesmente porque tinham o interesse político de desmoralizar Sérgio Cabral.
O segundo erro foi tentar fazer crer que, nos oito ou nove meses anteriores, o Rio de Janeiro tinha vivenciado um mar de rosas, sem arrastões, guerras entre quadrilhas, homicídios ou o controle armado de territórios.
Mas tudo bem, Sérgio Cabral estava envolvido no jogo político e temendo perder uma disputa eleitoral. Ele acabou recorrendo a instrumentos que políticos costumam recorrer em situações como essa.
O problema é que a eleição passou, Cabral foi reeleito por mais de 5 milhões de fluminenses (quem acompanha meu blog deve ter percebido que eu me orgulho de não fazer parte desse imenso contingente), mas o problema dos arrastões, briga de quadrilhas e tantos outros tipos de violência continuam ocorrendo diariamente no nosso estado.
As últimas ocorrências, veiculadas nos telejornais de hoje (5), foram a tentativa de invasão do Parque Alegria que resultou em intenso tiroteio, a ameaça de atentado contra a delegacia de Bonsucesso e a ocorrência de mais um assalto na Rua Presidente Carlos Campos (localizada em frente ao Palácio Guanabara, sede do governo).
E agora, Cabral? Vai culpar a quem?
A quem o governador, primeiro responsável pela política de segurança do estado, pode culpar além de si próprio por ser incapaz de reduzir de forma consistente, nos três anos e nove meses em que governou, a violência no estado do Rio de Janeiro.
sábado, 2 de outubro de 2010
Guerra de quadrilhas, arrastões, balas perdidas e vítimas da violência policial: Um Rio que não muda
A guerra entre bandidos em Santa Cruz, a retomada da favela da Palmeirinha pelo tráfico depois da desarticulação da milícia local, o tiro disparado por policiais em um juiz durante uma blitz hoje e os constantes arrastões no estado do Rio de Janeiro nos revelam algo triste. Apesar de toda euforia em torno das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), percebo que nada mudou no cenário de segurança do Rio de Janeiro.
A esmagadora maioria das favelas do Rio de Janeiro ainda precisa viver entre uma das opções: a milícia ou o tráfico. Nada mudou em relação a 1994 e 95, época da Operação Rio, de ocupação militar das favelas. Diria até que o Rio piorou de 94/95 para cá, porque as milícias surgiram como um novo agente no caos criminal fluminense.
Naquela época, assim como hoje, o povo e os governantes acreditavam que podiam resolver um problema social com ocupação das favelas. De lá para cá, devem ter ocorrido umas 3 mil ocupações militares (incluindo aí as policiais) temporárias ou permanentes de favelas, e nada mudou.
Continuamos sem poder entrar nas favelas sem precisar pedir autorização para uma liderança criminal local. Continuamos com o constante risco de sermos atingidos por balas perdidas no nosso estado.
Continuamos sem poder trafegar por nossa cidade e por nosso estado sem ter o risco de ser abordado por bandidos armados nas ruas do Rio de Janeiro. Continuamos sem poder estacionar nosso carro nas ruas, porque há o risco de serem levados ou arrombados em plena luz do dia.
Continuamos sem poder andar com objetos de valor em coletivos do Rio de Janeiro porque, a qualquer momento, podemos ser abordados por uma arma e sermos roubados. Continuamos sendo possíveis alvos de policiais despreparados.
Os tiroteios e guerras entre quadrilhas continuam em todo o Rio, com o agravante de que, agora, 15 anos depois, o interior também sofre. Volta Redonda, Resende, Teresópolis, Angra dos Reis, Cabo Frio, Macaé, Campos, Rio Bonito sofrem com guerras entre quadrilhas.
Assim, como aconteceu no resto do Brasil, o crime se interiorizou no Rio de Janeiro, e não vem tendo qualquer atenção das autoridades de segurança. A questão só piora (apesar de índices criminais suspeitos, provavelmente manipulados por um governo em busca de reeleição mostrarem melhora).
A história recente do Rio de Janeiro é marcada por operações e ocupações militares de favelas (sempre restritas) e sem qualquer resultado prático. Mas todos comemoram uma política de ocupação (UPP), sem se preocupar em reformar nossas instituições, política e sociedade.
Sem querer ser exagerado, em 2025, estaremos discutindo os mesmos problemas, pedindo as mesmas ocupações e sofrendo a mesma violência.
A esmagadora maioria das favelas do Rio de Janeiro ainda precisa viver entre uma das opções: a milícia ou o tráfico. Nada mudou em relação a 1994 e 95, época da Operação Rio, de ocupação militar das favelas. Diria até que o Rio piorou de 94/95 para cá, porque as milícias surgiram como um novo agente no caos criminal fluminense.
Naquela época, assim como hoje, o povo e os governantes acreditavam que podiam resolver um problema social com ocupação das favelas. De lá para cá, devem ter ocorrido umas 3 mil ocupações militares (incluindo aí as policiais) temporárias ou permanentes de favelas, e nada mudou.
Continuamos sem poder entrar nas favelas sem precisar pedir autorização para uma liderança criminal local. Continuamos com o constante risco de sermos atingidos por balas perdidas no nosso estado.
Continuamos sem poder trafegar por nossa cidade e por nosso estado sem ter o risco de ser abordado por bandidos armados nas ruas do Rio de Janeiro. Continuamos sem poder estacionar nosso carro nas ruas, porque há o risco de serem levados ou arrombados em plena luz do dia.
Continuamos sem poder andar com objetos de valor em coletivos do Rio de Janeiro porque, a qualquer momento, podemos ser abordados por uma arma e sermos roubados. Continuamos sendo possíveis alvos de policiais despreparados.
Os tiroteios e guerras entre quadrilhas continuam em todo o Rio, com o agravante de que, agora, 15 anos depois, o interior também sofre. Volta Redonda, Resende, Teresópolis, Angra dos Reis, Cabo Frio, Macaé, Campos, Rio Bonito sofrem com guerras entre quadrilhas.
Assim, como aconteceu no resto do Brasil, o crime se interiorizou no Rio de Janeiro, e não vem tendo qualquer atenção das autoridades de segurança. A questão só piora (apesar de índices criminais suspeitos, provavelmente manipulados por um governo em busca de reeleição mostrarem melhora).
A história recente do Rio de Janeiro é marcada por operações e ocupações militares de favelas (sempre restritas) e sem qualquer resultado prático. Mas todos comemoram uma política de ocupação (UPP), sem se preocupar em reformar nossas instituições, política e sociedade.
Sem querer ser exagerado, em 2025, estaremos discutindo os mesmos problemas, pedindo as mesmas ocupações e sofrendo a mesma violência.
terça-feira, 28 de setembro de 2010
NY Times diz que policiais impedem turistas de entrar no Morro do Cantagalo
Turistas podem pegar elevador para chegar até mirante do Cantagalo, mas são desencorajados por policiais a pegar elevador que vai do mirante até a favela com UPP
Uma reportagem do caderno de turismo do New York Times sobre o Rio de Janeiro traz uma informação um tanto curiosa. Trata-se de um guia para aproveitar a cidade, em 36 horas, para além das praias: 36 Hours in Rio de Janeiro.
Lá pelo meio da matéria, o repórter resolve falar sobre o novo mirante do Cantagalo, construído em frente à favela, hoje “controlada” por uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).
O repórter (ou a repórter, não dá para saber) Aric Chen diz que o mirante oferece uma diferente visão do Rio de Janeiro:
“Esqueça aquelas visões perfeitas de cartão-postal a partir do Pão-de-Açúcar e do Corcovado. Nesse verão, como parte de um esforço para melhor integrar as favelas com a cidade, o Rio revelou uma cintilante torre de elevador que se ergue por mais de 20 andares para conectar Ipanema com a favela do Cantagalo acima. Na esquina das Ruas Teixeira de Melo e Barão da Torre, pertinho da Praça General Osório, essa progressiva peça de arquitetura tem um deque de observação com vistas para Ipanema e Copacabana”, elogia o repórter.
Mas é aí que surge o desapontamento do repórter do NY Times. Provavelmente ao buscar conhecer o exótico mundo das favelas cariocas, depois de se ver tão perto do Cantagalo, Aric parece ter tentado chegar aos elevadores que ligam o mirante à comunidade carente.
O repórter, no entanto, parece ter sido impedido ou desencorajado a prosseguir em sua empreitada por policiais:
“Guardas podem impedi-lo de pegar o segundo grupo de elevadores para a favela propriamente dita”, afirma Aric.
Ei, ei, ei... Espera aí. O que foi que eu acabei de ler? Um turista impedido pela polícia de entrar na favela? Mas por quê?
Que motivo levaria policiais a desencorajar turistas de entrar no Cantagalo? Será que há algum risco para a integridade ou a vida dos turistas? Será que há risco de os turistas serem roubados, sequestrados ou mortos?
Ué, a favela do Cantagalo não está controlada por uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) há nove meses? A propaganda do governo do Estado não diz aos cidadãos (e eleitores) que a comunidade do Cantagalo está livre da bandidagem?
O governador Sergio Cabral não tem cantado em verso e prosa as virtudes da UPP do Cantagalo (inclusive tendo gravado seu programa eleitoral no “Mirante da Paz”)? Cabral não tem repetido o mantra de que as UPP trouxeram paz ao Rio?
Por que então policiais têm impedido turistas de pegar os elevadores que ligam o mirante à favela, como relata o repórter do New York Times?
A breve passagem do artigo do New York Times poderia passar despercebido por qualquer um. Mas a mim chamou atenção, principalmente porque tem havido indícios de que o Cantagalo e o Pavão-Pavãozinho não estão livres do controle armado de bandidos.
Em julho (sete meses depois da instalação da UPP), bandidos que vendiam drogas dentro do Cantagalo trocaram tiros com policiais da UPP, mostrando a existência de controle armado na favela.
Recentemente, um banco estatal desistiu de implantar uma agência na comunidade do Pavão. O motivo oficial, segundo o banco, é que eles não teriam encontrado um imóvel adequado. Mas o verdadeiro motivo é que funcionários do banco foram três meses atrás à favela, para sondar o terreno, e deram de cara com bandidos armados de fuzis e pistolas.
Agora leio que um repórter do NY Times foi impedido pela policia de entrar na favela através do Mirante da Paz.
Na minha opinião, há algo muito estranho na UPP do Cantagalo/Pavão-Pavãozinho, que o governo do Estado não nos quer revelar. E esse segredo que o estado guarda do resto da população, provavelmente com a conivência da grande imprensa, é: a UPP não foi capaz de acabar com o controle armado ilegal nessas favelas.
Uma reportagem do caderno de turismo do New York Times sobre o Rio de Janeiro traz uma informação um tanto curiosa. Trata-se de um guia para aproveitar a cidade, em 36 horas, para além das praias: 36 Hours in Rio de Janeiro.
Lá pelo meio da matéria, o repórter resolve falar sobre o novo mirante do Cantagalo, construído em frente à favela, hoje “controlada” por uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).
O repórter (ou a repórter, não dá para saber) Aric Chen diz que o mirante oferece uma diferente visão do Rio de Janeiro:
“Esqueça aquelas visões perfeitas de cartão-postal a partir do Pão-de-Açúcar e do Corcovado. Nesse verão, como parte de um esforço para melhor integrar as favelas com a cidade, o Rio revelou uma cintilante torre de elevador que se ergue por mais de 20 andares para conectar Ipanema com a favela do Cantagalo acima. Na esquina das Ruas Teixeira de Melo e Barão da Torre, pertinho da Praça General Osório, essa progressiva peça de arquitetura tem um deque de observação com vistas para Ipanema e Copacabana”, elogia o repórter.
Mas é aí que surge o desapontamento do repórter do NY Times. Provavelmente ao buscar conhecer o exótico mundo das favelas cariocas, depois de se ver tão perto do Cantagalo, Aric parece ter tentado chegar aos elevadores que ligam o mirante à comunidade carente.
O repórter, no entanto, parece ter sido impedido ou desencorajado a prosseguir em sua empreitada por policiais:
“Guardas podem impedi-lo de pegar o segundo grupo de elevadores para a favela propriamente dita”, afirma Aric.
Ei, ei, ei... Espera aí. O que foi que eu acabei de ler? Um turista impedido pela polícia de entrar na favela? Mas por quê?
Que motivo levaria policiais a desencorajar turistas de entrar no Cantagalo? Será que há algum risco para a integridade ou a vida dos turistas? Será que há risco de os turistas serem roubados, sequestrados ou mortos?
Ué, a favela do Cantagalo não está controlada por uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) há nove meses? A propaganda do governo do Estado não diz aos cidadãos (e eleitores) que a comunidade do Cantagalo está livre da bandidagem?
O governador Sergio Cabral não tem cantado em verso e prosa as virtudes da UPP do Cantagalo (inclusive tendo gravado seu programa eleitoral no “Mirante da Paz”)? Cabral não tem repetido o mantra de que as UPP trouxeram paz ao Rio?
Por que então policiais têm impedido turistas de pegar os elevadores que ligam o mirante à favela, como relata o repórter do New York Times?
A breve passagem do artigo do New York Times poderia passar despercebido por qualquer um. Mas a mim chamou atenção, principalmente porque tem havido indícios de que o Cantagalo e o Pavão-Pavãozinho não estão livres do controle armado de bandidos.
Em julho (sete meses depois da instalação da UPP), bandidos que vendiam drogas dentro do Cantagalo trocaram tiros com policiais da UPP, mostrando a existência de controle armado na favela.
Recentemente, um banco estatal desistiu de implantar uma agência na comunidade do Pavão. O motivo oficial, segundo o banco, é que eles não teriam encontrado um imóvel adequado. Mas o verdadeiro motivo é que funcionários do banco foram três meses atrás à favela, para sondar o terreno, e deram de cara com bandidos armados de fuzis e pistolas.
Agora leio que um repórter do NY Times foi impedido pela policia de entrar na favela através do Mirante da Paz.
Na minha opinião, há algo muito estranho na UPP do Cantagalo/Pavão-Pavãozinho, que o governo do Estado não nos quer revelar. E esse segredo que o estado guarda do resto da população, provavelmente com a conivência da grande imprensa, é: a UPP não foi capaz de acabar com o controle armado ilegal nessas favelas.
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Verbas do plano nacional de combate ao crack devem ser liberadas a partir de dezembro
Os R$ 140 milhões do Plano de Enfrentamento ao Crack e Outras Drogas, destinados à ampliação das redes de atenção a usuários nos municípios brasileiros, devem começar a ser liberados a partir de dezembro deste ano. A previsão é da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad).
Os editais para a criação de mais de 6 mil leitos para dependentes químicos e de casas de acolhimento e para a capacitação de profissionais foram publicados ontem (23) no Diário Oficial da União. Para ter acesso aos recursos, os municípios devem enviar seus projetos ao governo federal no prazo de até 45 dias.
Com os projetos nas mãos, a secretária nacional adjunta de Políticas sobre Drogas, Paulina Duarte, espera que o governo possa avaliá-los e iniciar a distribuição dos recursos no prazo de até 30 dias.
“O dinheiro é para leitos de hospitais gerais, comunidades terapêuticas, Caps AD 24 horas (Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas), casas de acolhimento transitório. Também há editais para universidades públicas para formação permanente dos profissionais da rede de saúde e da assistência social”, disse.
Paulina Duarte e o secretário nacional de Políticas sobre Drogas, general Paulo Roberto Uchoa, participaram hoje (24), no Rio de Janeiro, da cerimônia de posse dos membros do recém-instalado Conselho Municipal Antidrogas da cidade do Rio.
Segundo o general Uchoa, até o final do ano, um esboço sobre a proposta de mudança da legislação brasileira sobre drogas deverá ser concluído pelo grupo de trabalho coordenado pela Senad. A lei sobre drogas brasileira é de 2006, mas o governo federal acredita que pode aprimorar o texto.
Entre as alterações previstas está uma distinção mais clara entre a figura do usuário de drogas, que não é punido com prisão, e a do traficante, que pode ser condenado a até 15 anos de prisão.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
Os editais para a criação de mais de 6 mil leitos para dependentes químicos e de casas de acolhimento e para a capacitação de profissionais foram publicados ontem (23) no Diário Oficial da União. Para ter acesso aos recursos, os municípios devem enviar seus projetos ao governo federal no prazo de até 45 dias.
Com os projetos nas mãos, a secretária nacional adjunta de Políticas sobre Drogas, Paulina Duarte, espera que o governo possa avaliá-los e iniciar a distribuição dos recursos no prazo de até 30 dias.
“O dinheiro é para leitos de hospitais gerais, comunidades terapêuticas, Caps AD 24 horas (Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas), casas de acolhimento transitório. Também há editais para universidades públicas para formação permanente dos profissionais da rede de saúde e da assistência social”, disse.
Paulina Duarte e o secretário nacional de Políticas sobre Drogas, general Paulo Roberto Uchoa, participaram hoje (24), no Rio de Janeiro, da cerimônia de posse dos membros do recém-instalado Conselho Municipal Antidrogas da cidade do Rio.
Segundo o general Uchoa, até o final do ano, um esboço sobre a proposta de mudança da legislação brasileira sobre drogas deverá ser concluído pelo grupo de trabalho coordenado pela Senad. A lei sobre drogas brasileira é de 2006, mas o governo federal acredita que pode aprimorar o texto.
Entre as alterações previstas está uma distinção mais clara entre a figura do usuário de drogas, que não é punido com prisão, e a do traficante, que pode ser condenado a até 15 anos de prisão.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
A verdade sobre a política de expansão das UPP
Por que o governador-candidato diz uma coisa para o TRE e outra coisa para o eleitor?
Já escrevi inúmeras vezes aqui e no Twitter que é impossível de se cumprir a promessa do governador Sérgio Cabral de colocar, até 2014, Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) em todas as favelas controladas por criminosos no Rio de Janeiro (o que dá algo entre 1.500 e duas mil comunidades).
A proposta é inviável não só pelo curto espaço de tempo prometido pelo governador-candidato, mas também porque isso exigiria um aumento extraordinário de efetivo da Polícia Militar (imagino que seria necessário, ao menos, dobrar o efetivo) e possuiria um orçamento anual proibitivo (principalmente em um estado onde o governador diz que precisa dos royalties do petróleo para reajustar salários do funcionalismo público).
Mas o surpreendente é que, apesar de Cabral informar para os eleitores, em todas entrevistas, debates e programas eleitorais, que vai cumprir essa promessa absurda, seu programa de governo oficial, entregue ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RJ) diz o contrário.
Segundo o plano de governo homologado na Justiça Eleitoral (que pode ser acessado nesse link e, depois, clicando em “proposta de governo”), a promessa de Cabral é infinitamente mais modesta. No plano, Cabral se compromete apenas a levar UPP diretamente a 600 mil pessoas (número de pessoas que moram em um raio de 1 km do epicentro das favelas). Indiretamente (pessoas que moram em um raio de 1 a 2 km do epicentro das favelas), o governo prevê atender a apenas 1,5 milhão de pessoas.
Consideremos que o estado do Rio de Janeiro tem 16 milhões de habitantes, que todas as cidades grandes e médias do Grande Rio e do interior têm favelas e que essas favelas, em geral, se situam em áreas urbanas (portanto onde se localiza a maior parte da população).
Sendo assim, se Cabral cumprisse o que ele está prometendo oralmente em seu programa eleitoral e nas entrevistas e levasse UPP a todas as favelas até 2014, ele precisaria atender a algo como 2 a 3 milhões de pessoas diretamente e algo entre 6 e 8 milhões de pessoas indiretamente (pelo menos).
Mas Cabral diz, claramente, ao TRE, que ele é só pretende levar UPP a 600 mil pessoas diretamente e 1,5 milhão indiretamente (se não confia em mim leia, você mesmo, o programa de governo de Cabral ou mesmo o site do governador www.sergiocabral15.com.br).
A proposta oficial do governador, homologada na Justiça Eleitoral, prevê um número CINCO VEZES MENOR do que o que Cabral promete ao eleitor em sua campanha na TV e em comícios.
Minha conclusão é que, no discurso para o povão, Cabral está inflando o alcance das UPP para parecer que a política da polícia pacificadora é voltada para todo o estado. Em seu discurso popular, Cabral diz que o morador do subúrbio, da zona oeste, da Baixada e do interior vai ser beneficiado com a política.
Mas, para o TRE, Cabral assume o discurso realista. UPP só para 600 mil pessoas. UPP não é para o estado todo, é apenas para umas poucas áreas privilegiadas.
O problema é que o povão não vai acessar o site do TRE ou o site do governador para perceber a distorção. O povão vai acreditar no que Cabral está prometendo de boca. Logo, o que valerá, para o eleitor, é uma promessa absurda que o governador e a Justiça Eleitoral sabem que não será cumprida.
Para se ter uma ideia, hoje as UPP atendem a algo em torno de 400 mil pessoas diretamente (dentro do raio de 1 km) e 900 mil pessoas indiretamente (dentro do raio de 2 km), em 35 favelas e em sete bairros. Se Cabral cumprir apenas o que foi prometido ao TRE, ele vai aumentar em apenas 50% o alcance das UPP, nos próximos quatro anos.
E o que é mais surpreendente em toda essa história é que, se Cabral está se comprometendo oficialmente a levar UPP a apenas mais 200 mil pessoas, isso significa que, dos três grandes complexos de favela (Alemão, Maré e Rocinha), apenas um poderá ganhar polícia pacificadora (se ganhar). E eu aposto na Rocinha, porque ela fica na zona sul.
Logo, acabo de comprovar o que venho dizendo há semanas. A promessa de levar UPP para todas as favelas controladas por bandidos é mentirosa.
Já escrevi inúmeras vezes aqui e no Twitter que é impossível de se cumprir a promessa do governador Sérgio Cabral de colocar, até 2014, Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) em todas as favelas controladas por criminosos no Rio de Janeiro (o que dá algo entre 1.500 e duas mil comunidades).
A proposta é inviável não só pelo curto espaço de tempo prometido pelo governador-candidato, mas também porque isso exigiria um aumento extraordinário de efetivo da Polícia Militar (imagino que seria necessário, ao menos, dobrar o efetivo) e possuiria um orçamento anual proibitivo (principalmente em um estado onde o governador diz que precisa dos royalties do petróleo para reajustar salários do funcionalismo público).
Mas o surpreendente é que, apesar de Cabral informar para os eleitores, em todas entrevistas, debates e programas eleitorais, que vai cumprir essa promessa absurda, seu programa de governo oficial, entregue ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RJ) diz o contrário.
Segundo o plano de governo homologado na Justiça Eleitoral (que pode ser acessado nesse link e, depois, clicando em “proposta de governo”), a promessa de Cabral é infinitamente mais modesta. No plano, Cabral se compromete apenas a levar UPP diretamente a 600 mil pessoas (número de pessoas que moram em um raio de 1 km do epicentro das favelas). Indiretamente (pessoas que moram em um raio de 1 a 2 km do epicentro das favelas), o governo prevê atender a apenas 1,5 milhão de pessoas.
Consideremos que o estado do Rio de Janeiro tem 16 milhões de habitantes, que todas as cidades grandes e médias do Grande Rio e do interior têm favelas e que essas favelas, em geral, se situam em áreas urbanas (portanto onde se localiza a maior parte da população).
Sendo assim, se Cabral cumprisse o que ele está prometendo oralmente em seu programa eleitoral e nas entrevistas e levasse UPP a todas as favelas até 2014, ele precisaria atender a algo como 2 a 3 milhões de pessoas diretamente e algo entre 6 e 8 milhões de pessoas indiretamente (pelo menos).
Mas Cabral diz, claramente, ao TRE, que ele é só pretende levar UPP a 600 mil pessoas diretamente e 1,5 milhão indiretamente (se não confia em mim leia, você mesmo, o programa de governo de Cabral ou mesmo o site do governador www.sergiocabral15.com.br).
A proposta oficial do governador, homologada na Justiça Eleitoral, prevê um número CINCO VEZES MENOR do que o que Cabral promete ao eleitor em sua campanha na TV e em comícios.
Minha conclusão é que, no discurso para o povão, Cabral está inflando o alcance das UPP para parecer que a política da polícia pacificadora é voltada para todo o estado. Em seu discurso popular, Cabral diz que o morador do subúrbio, da zona oeste, da Baixada e do interior vai ser beneficiado com a política.
Mas, para o TRE, Cabral assume o discurso realista. UPP só para 600 mil pessoas. UPP não é para o estado todo, é apenas para umas poucas áreas privilegiadas.
O problema é que o povão não vai acessar o site do TRE ou o site do governador para perceber a distorção. O povão vai acreditar no que Cabral está prometendo de boca. Logo, o que valerá, para o eleitor, é uma promessa absurda que o governador e a Justiça Eleitoral sabem que não será cumprida.
Para se ter uma ideia, hoje as UPP atendem a algo em torno de 400 mil pessoas diretamente (dentro do raio de 1 km) e 900 mil pessoas indiretamente (dentro do raio de 2 km), em 35 favelas e em sete bairros. Se Cabral cumprir apenas o que foi prometido ao TRE, ele vai aumentar em apenas 50% o alcance das UPP, nos próximos quatro anos.
E o que é mais surpreendente em toda essa história é que, se Cabral está se comprometendo oficialmente a levar UPP a apenas mais 200 mil pessoas, isso significa que, dos três grandes complexos de favela (Alemão, Maré e Rocinha), apenas um poderá ganhar polícia pacificadora (se ganhar). E eu aposto na Rocinha, porque ela fica na zona sul.
Logo, acabo de comprovar o que venho dizendo há semanas. A promessa de levar UPP para todas as favelas controladas por bandidos é mentirosa.
PRF vai abrir processo administrativo contra policiais do Rio acusados de corrupção
O novo superintendente regional da Polícia Rodoviária Federal no Rio de Janeiro, Antônio Vital, informou que deve abrir, ainda hoje (22), um processo administrativo contra sete policiais acusados de corrupção. Os sete servidores, entre eles integrantes da cúpula da PRF no Rio, já foram afastados e tiveram prisão preventiva decretada pela Justiça na última sexta-feira (17).
O processo administrativo, que pode resultar na expulsão dos policiais, só pode ser aberto pelo superintendente regional. Mas, como o superintendente Carlos Hamilton Pinheiro também foi denunciado à Justiça, o cargo ficou vago. Só agora, com a chegada do novo superintendente, um pernambucano que está há 16 anos na PRF, será possível abrir o processo.
“Nós temos interesse em esmiuçar a investigação administrativa, porque o processo já está correndo penalmente. O intuito é dar uma resposta à sociedade. Um desvio de conduta não é privilégio da Polícia Rodoviária Federal, nem do servidor público. Mas, como Estado, temos o dever de prestar a informação do que nós fazemos”, disse.
Segundo Vital, a Polícia Rodoviária tomará cuidado para não fazer qualquer pré-julgamento dos agentes. Todos os acusados terão direito a ampla defesa no processo administrativo.
Vital, que assumiu o cargo ontem (21), disse que a PRF não admite corrupção e pediu à sociedade que denuncie qualquer caso de desvio de conduta de seus agentes à instituição.
Na última semana, o Ministério Público Federal denunciou à Justiça sete agentes da Polícia Rodoviária Federal por suspeita da prática de corrupção. Mais três pessoas também foram denunciadas por causa da suspeita de participarem de um esquema com o objetivo de contribuir para a campanha do inspetor Marcelo Lessa, ex-chefe substituto de policiamento, a deputado federal.
O processo administrativo, que pode resultar na expulsão dos policiais, só pode ser aberto pelo superintendente regional. Mas, como o superintendente Carlos Hamilton Pinheiro também foi denunciado à Justiça, o cargo ficou vago. Só agora, com a chegada do novo superintendente, um pernambucano que está há 16 anos na PRF, será possível abrir o processo.
“Nós temos interesse em esmiuçar a investigação administrativa, porque o processo já está correndo penalmente. O intuito é dar uma resposta à sociedade. Um desvio de conduta não é privilégio da Polícia Rodoviária Federal, nem do servidor público. Mas, como Estado, temos o dever de prestar a informação do que nós fazemos”, disse.
Segundo Vital, a Polícia Rodoviária tomará cuidado para não fazer qualquer pré-julgamento dos agentes. Todos os acusados terão direito a ampla defesa no processo administrativo.
Vital, que assumiu o cargo ontem (21), disse que a PRF não admite corrupção e pediu à sociedade que denuncie qualquer caso de desvio de conduta de seus agentes à instituição.
Na última semana, o Ministério Público Federal denunciou à Justiça sete agentes da Polícia Rodoviária Federal por suspeita da prática de corrupção. Mais três pessoas também foram denunciadas por causa da suspeita de participarem de um esquema com o objetivo de contribuir para a campanha do inspetor Marcelo Lessa, ex-chefe substituto de policiamento, a deputado federal.
PRF pretende usar até 600 motos e dez aeronaves nas Olimpíadas de 2016 no Rio
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) pretende usar até 600 motocicletas e dez aeronaves de patrulhamento e resgate durante os Jogos Olímpicos de 2016, que ocorrerão no Rio de Janeiro. A informação foi divulgada hoje (22) pelo coordenador-geral de Operações da PRF, inspetor Alvarez Simões.
O efetivo que será usado pela Polícia Rodoviária durante o período dos jogos, no estado do Rio, ainda não foi definido. A PRF acredita, no entanto, que serão necessários mais homens do que o número empregado durante os Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007, quando o efetivo foi de 2 mil agentes.
O número de motocicletas previsto para as Olimpíadas é três vezes superior aos 200 veículos usados no Pan de 2007, segundo a PRF. Entre as dez aeronaves, a maioria é de helicópteros de resgate.
O planejamento ainda não foi concluído e ainda precisa ser entregue ao governo federal, que, posteriormente, fechará o esquema de segurança das Olimpíadas junto com as informações de outros órgãos, como a Polícia Federal.
O novo superintendente da PRF no Rio de Janeiro, Antônio Vital, assumiu o cargo ontem (21) depois que o antigo superintendente, Carlos Hamilton Pinheiro, foi afastado, na última semana, acusado de envolvimento em um esquema de corrupção. Mesmo antes do afastamento de Pinheiro, o nome de Vital já estava definido para cuidar do início da preparação do estado para as Olimpíadas.
Vital disse que, na preparação para os Jogos, a Polícia Rodoviária pretende transformar a superintendência do Rio em uma polícia moderna e modelo para o resto do país.
“Dada a importância do estado e os eventos que estão previstos, o planejamento estratégico da polícia visa a transformar o Rio de Janeiro em um protótipo a ser seguido pelos outros estados. Primordialmente, precisamos preparar o policial rodoviário federal para as demandas, com um visão nova e cosmopolita, que fale outras línguas, o que é necessário para uma polícia moderna. Precisamos de uma polícia que atenda bem o cidadão”, disse.
Entre os projetos está aumentar o efetivo atual no Rio de Janeiro de 700 agentes para mais de mil até os Jogos. O efetivo complementar para as Olimpíadas será coberto por agentes remanejados de outros estados, assim como ocorreu no Pan.
Outras propostas são modernizar os postos de polícia, criar grupos de combate ao crime em cada uma das delegacias da PRF no Rio, ampliar a integração com as forças de segurança estaduais e intensificar operações conjuntas com a Receita Federal.
Em 2011, a PRF passará a dividir o espaço com outros órgãos de segurança estaduais e federais, no centro de controle integrado que está sendo construído no Rio para a Copa do Mundo de 2014, que também será realizada no Brasil, e as Olimpíadas de 2016.
O efetivo que será usado pela Polícia Rodoviária durante o período dos jogos, no estado do Rio, ainda não foi definido. A PRF acredita, no entanto, que serão necessários mais homens do que o número empregado durante os Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007, quando o efetivo foi de 2 mil agentes.
O número de motocicletas previsto para as Olimpíadas é três vezes superior aos 200 veículos usados no Pan de 2007, segundo a PRF. Entre as dez aeronaves, a maioria é de helicópteros de resgate.
O planejamento ainda não foi concluído e ainda precisa ser entregue ao governo federal, que, posteriormente, fechará o esquema de segurança das Olimpíadas junto com as informações de outros órgãos, como a Polícia Federal.
O novo superintendente da PRF no Rio de Janeiro, Antônio Vital, assumiu o cargo ontem (21) depois que o antigo superintendente, Carlos Hamilton Pinheiro, foi afastado, na última semana, acusado de envolvimento em um esquema de corrupção. Mesmo antes do afastamento de Pinheiro, o nome de Vital já estava definido para cuidar do início da preparação do estado para as Olimpíadas.
Vital disse que, na preparação para os Jogos, a Polícia Rodoviária pretende transformar a superintendência do Rio em uma polícia moderna e modelo para o resto do país.
“Dada a importância do estado e os eventos que estão previstos, o planejamento estratégico da polícia visa a transformar o Rio de Janeiro em um protótipo a ser seguido pelos outros estados. Primordialmente, precisamos preparar o policial rodoviário federal para as demandas, com um visão nova e cosmopolita, que fale outras línguas, o que é necessário para uma polícia moderna. Precisamos de uma polícia que atenda bem o cidadão”, disse.
Entre os projetos está aumentar o efetivo atual no Rio de Janeiro de 700 agentes para mais de mil até os Jogos. O efetivo complementar para as Olimpíadas será coberto por agentes remanejados de outros estados, assim como ocorreu no Pan.
Outras propostas são modernizar os postos de polícia, criar grupos de combate ao crime em cada uma das delegacias da PRF no Rio, ampliar a integração com as forças de segurança estaduais e intensificar operações conjuntas com a Receita Federal.
Em 2011, a PRF passará a dividir o espaço com outros órgãos de segurança estaduais e federais, no centro de controle integrado que está sendo construído no Rio para a Copa do Mundo de 2014, que também será realizada no Brasil, e as Olimpíadas de 2016.
terça-feira, 21 de setembro de 2010
O Brasil e a corrupção: uma sociedade doente é uma sociedade violenta
Recentemente tivemos o desprazer de ver dois casos de bandidagem em altos escalões da hierarquia pública do nosso país. Um deles ocorreu no círculo político do longínquo estado do Amapá, no extremo norte da Amazônia brasileira, envolvendo a cúpula do governo estadual. O outro mostra um esquema de corrupção na cúpula da Superintendência fluminense da Polícia Rodoviária Federal.
No primeiro, temos uma quadrilha, composta por governador e ex-governador, suspeita de desviar R$ 300 milhões em recursos públicos que deveriam ser investidos na educação básica no estado do Amapá. Só para se ter uma idéia, R$ 300 milhões equivale a 11% do PIB do setor público no estado amazônico (estimado em R$ 2,7 bilhões, segundo dados de 2007 do IBGE).
Isso significa que uma quadrilha de pessoas, cuja função era zelar pelo bem comum e defender os interesses da população do Amapá, confiscou 11% do dinheiro que poderia tornar melhor a vida de 630 mil pessoas.
Bem, essa quadrilha, formada, segundo a Polícia Federal, por 18 marginais, que roubou R$ 300 milhões do meu, do seu, do nosso bolso, ficou presa por alguns dias e foi solta. Os chefes do bando (segundo a Polícia Federal), nada menos do que o governador do estado e o ex-governador (hoje candidato ao Senado), voltaram ao estado.
O governador reassumiu o governo do estado, como se nada tivesse acontecido, e deve reassumir sua campanha pela reeleição (provavelmente custeada pelo dinheiro que foi desviado do Fundeb e do Fundef). O ex-governador também provavelmente vai reassumir sua campanha ao Senado, sem qualquer pudor.
Já no segundo caso, temos uma quadrilha de policiais rodoviários federais, ou seja, pessoas armadas e equipadas com o dinheiro do contribuinte. Nada menos do que dez pessoas, entre elas o superintendente regional do Rio de Janeiro, tiveram suas prisões preventivas decretadas pela 1a Vara Federal Criminal do Rio, por crimes como formação de quadrilha, corrupção (quando o agente pede ou aceita propina), concussão (isto é, quando o agente exige a propina) e prevaricação (quando o agente deixa de cumprir com sua função, permitindo que o crime seja cometido).
Investigações do Ministério Público Federal mostram que o esquema criminoso permitia a infratores da lei retirarem seus veículos irregulares de um pátio da Polícia Rodoviária, com o aval dos agentes públicos.
Além disso, um dos agentes, que concorre a um cargo político nessas eleições, permitia que os veículos apreendidos fossem usados em comunidades carentes com vistas a se promover politicamente nesses currais eleitorais. Outra acusação é que esse mesmo policial rodoviário usava carros e recursos da PRF em sua campanha eleitoral.
A denúncia do MPF mostra ainda outros crimes, como a liberação de um comerciante chinês com dinheiro suspeito, mediante o pagamento de uma propina de R$ 10 mil para financiar a campanha do agente.
Já os chefes desse policial faziam vista grossa para as atitudes sem limite do marginal, a fim de que pudessem lucrar com a eleição do bandido. Pelo menos é isso que diz a denúncia do Ministério Público, que foi aceita pela Justiça Federal.
Os dois casos revelam algo que todos já sabemos. O Brasil é um país corrupto. A corrupção está em todas as esferas da nossa sociedade. Está na política, na polícia, na Justiça, nas forças armadas, nos órgãos públicos, nas organizações comunitárias, nas famílias, nas relações individuais. Enfim está em todo lugar.
Nós, brasileiros, somos afetos à corrupção. Afinal, não só recorremos rotineiramente a ela como também ficamos impassíveis quando esquemas de desvio de dinheiro público ou de cobrança de propina se descortinam ante nossos olhos.
No caso do Amapá, por exemplo, é chocante não só ver que governador e ex-governador são soltos depois de ficarem apenas uma semana presos, como os dois acusados são recebidos com festa por 20 mil pessoas ao chegarem em seus estados.
São 20 mil pessoas comemorando a soltura e a volta para casa de alguém que é acusado de roubar dinheiro de seu bolso, dinheiro que seria usado para dar educação e um futuro melhor a seus filhos.
É como se você tivesse sua casa arrombada por um bandido e todos seus bens, surrupiados. E, depois de uma semana, recebesse esse bandido com uma grande feijoada em sua homenagem. E mais, ainda aceitasse que esse mesmo bandido voltasse a gerenciar suas economias e suas vidas.
É realmente assombroso ver também, por exemplo, como um deputado federal do maior estado brasileiro, acusado em diversos processos de desvio de verbas públicas e envio desse dinheiro para contas em paraísos fiscais.
E esse mesmo deputado não só circula solto pela nossa sociedade como é eleito e reeleito para representar as mesmas pessoas que foram roubadas por ele na Câmara dos Deputados. E o pior, esse deputado nunca é condenado, porque seus processos caducam no vagaroso (de forma proposital) trâmite das altas cortes do país.
Não podemos nos esquecer das últimas denúncias de tráfico de influência dentro da Casa Civil, o braço direito da Presidência da República. Os exemplos de corrupção e imoralidade no país são infinitos. Vão desde o atropelador assassino que aceita pagar propina para o policial militar não prendê-lo até o filho de ministro que se usa do cargo da mãe para lucrar milhões, às custas do povo brasileiro.
Temos, portanto, duas constatações tristes sobre a corrupção no nosso país. A primeira é a impunidade, que, em geral, beneficia apenas aqueles que tem poder político e econômico no nosso país. A segunda é a relação amistosa (e até amorosa) que o povo brasileiro tem com a corrupção.
Uma das explicações para isso estaria no fato de que o Estado brasileiro nunca existiu de fato. Desde os tempos da colônia, em que fomos divididos em capitanias hereditárias (e privadas) somos um país dominado por interesses particulares.
Em minha opinião, o Estado brasileiro nunca funcionou com o objetivo de proporcionar o bem-estar da sociedade. O Brasil sempre serviu aos interesses daqueles que detêm o poder econômico e político no país.
São as obras milionárias voltadas para enriquecer empreiteiras (e políticos), são os projetos e emendas direcionados para favorecer os financiadores de campanha, são as decisões judiciais que beneficiam amigos e aqueles que podem comprar sentenças, são os hospitais públicos mantidos na pindaíba a fim de favorecer o mercado planos de saúde, é a falta de investimento em transporte alternativo para beneficiar as empresas de ônibus, é a entrada de pessoas nas estruturas públicas para buscar benefícios pessoais, é a imunidade parlamentar, é a prisão especial para quem tem ensino superior, é a inviolabilidade do juiz etc.
Os exemplos de interesses particularistas que dominam o Estado brasileiro são inúmeros e não faz sentido ficar enumerando-os todos aqui.
O que importa aqui é que isso vem sendo feito aqui no país há anos. Ou melhor, há séculos. E séculos de uso do Estado para servir a interesses particulares (de quem tem poder político e econômico) servem para minar a credibilidade de qualquer nação perante seus cidadãos.
Quem, no Brasil, pode acreditar no Estado quando o Estado serve como uma agência reguladora de interesses privados, que usa a propina e a barganha política como suas moedas oficiais?
Ninguém além daqueles poucos que se beneficiam dessa situação. A grande maioria da população não enxerga o Estado brasileiro como um representante legítimo de seus interesses e nem acredita que esse Estado sirva para garantir seus direitos fundamentais à educação, saúde, moradia, segurança, trabalho e à vida.
O que me assusta, no entanto, é que, em vez dessa grande maioria da população (que, apesar de não acreditar no Estado, o mantém funcionando com seus impostos e seus votos), se levantar e exigir que esse Estado funcione, que seus órgãos cumpram a lei e que seus representantes defendam seus interesses, ela parece querer participar do jogo-sujo.
Sem conseguir o atendimento adequado do Estado e sem receber o mesmo tratamento que o supercidadão (aquele que tem o poder político e econômico), o cidadão comum tenta recorrer às moedas oficiais do Estado Brasileiro (a corrupção, o jeitinho, a barganha política, a troca de favores, o tráfico de influência).
É o cidadão que molha a mão do PM para evitar ser multado, porque não conseguiu marcar sua vistoria do carro em tempo adequado. É o cidadão que pergunta se você conhece alguém naquela repartição pública para agilizar seu processo, já que o tempo oficial da burocracia é inacreditavelmente moroso. É o cidadão que troca seu voto para conseguir um encaminhamento cirúrgico, assinado por um político, porque a fila de espera das cirurgias naquele hospital público é gigantesca. É o cidadão que paga a propina para que a patrulinha da PM estacione em frente a sua loja, já que o Estado não garante sua segurança por meios normais.
O problema é que, ao recorrer ao jogo-sujo, o cidadão cria um círculo vicioso dentro do Estado brasileiro, onde tudo só se resolve pela via ilegal, pela via da propina. O cidadão perde a oportunidade de mudar a realidade social do país, perde a oportunidade de exigir o cumprimento do princípio constitucional de igualdade para todos.
Mas por que estou escrevendo sobre isso em um blog de Segurança Pública? Justamente porque eu acredito que a ineficácia do Estado, a corrupção, os privilégios concedidos a supercidadãos, o jogo sujo político, entre outros males, contribuem para criar uma sociedade doente.
E sociedades doentes tendem a desenvolver sintomas desagradáveis como a violência. E os sintomas não desaparecem enquanto a sociedade estiver doente. Não adiantam Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), investigações policiais, aumento de efetivo da polícia, criação de batalhões, metas de redução de crimes etc.
Nada disso melhora o sintoma, enquanto há um Estado desacreditado, uma grande desigualdade entre os cidadãos e uma população que acredita que a via adequada para se resolver problemas é a VIA ILEGAL.
A violência é apenas uma conseqüência...
No primeiro, temos uma quadrilha, composta por governador e ex-governador, suspeita de desviar R$ 300 milhões em recursos públicos que deveriam ser investidos na educação básica no estado do Amapá. Só para se ter uma idéia, R$ 300 milhões equivale a 11% do PIB do setor público no estado amazônico (estimado em R$ 2,7 bilhões, segundo dados de 2007 do IBGE).
Isso significa que uma quadrilha de pessoas, cuja função era zelar pelo bem comum e defender os interesses da população do Amapá, confiscou 11% do dinheiro que poderia tornar melhor a vida de 630 mil pessoas.
Bem, essa quadrilha, formada, segundo a Polícia Federal, por 18 marginais, que roubou R$ 300 milhões do meu, do seu, do nosso bolso, ficou presa por alguns dias e foi solta. Os chefes do bando (segundo a Polícia Federal), nada menos do que o governador do estado e o ex-governador (hoje candidato ao Senado), voltaram ao estado.
O governador reassumiu o governo do estado, como se nada tivesse acontecido, e deve reassumir sua campanha pela reeleição (provavelmente custeada pelo dinheiro que foi desviado do Fundeb e do Fundef). O ex-governador também provavelmente vai reassumir sua campanha ao Senado, sem qualquer pudor.
Já no segundo caso, temos uma quadrilha de policiais rodoviários federais, ou seja, pessoas armadas e equipadas com o dinheiro do contribuinte. Nada menos do que dez pessoas, entre elas o superintendente regional do Rio de Janeiro, tiveram suas prisões preventivas decretadas pela 1a Vara Federal Criminal do Rio, por crimes como formação de quadrilha, corrupção (quando o agente pede ou aceita propina), concussão (isto é, quando o agente exige a propina) e prevaricação (quando o agente deixa de cumprir com sua função, permitindo que o crime seja cometido).
Investigações do Ministério Público Federal mostram que o esquema criminoso permitia a infratores da lei retirarem seus veículos irregulares de um pátio da Polícia Rodoviária, com o aval dos agentes públicos.
Além disso, um dos agentes, que concorre a um cargo político nessas eleições, permitia que os veículos apreendidos fossem usados em comunidades carentes com vistas a se promover politicamente nesses currais eleitorais. Outra acusação é que esse mesmo policial rodoviário usava carros e recursos da PRF em sua campanha eleitoral.
A denúncia do MPF mostra ainda outros crimes, como a liberação de um comerciante chinês com dinheiro suspeito, mediante o pagamento de uma propina de R$ 10 mil para financiar a campanha do agente.
Já os chefes desse policial faziam vista grossa para as atitudes sem limite do marginal, a fim de que pudessem lucrar com a eleição do bandido. Pelo menos é isso que diz a denúncia do Ministério Público, que foi aceita pela Justiça Federal.
Os dois casos revelam algo que todos já sabemos. O Brasil é um país corrupto. A corrupção está em todas as esferas da nossa sociedade. Está na política, na polícia, na Justiça, nas forças armadas, nos órgãos públicos, nas organizações comunitárias, nas famílias, nas relações individuais. Enfim está em todo lugar.
Nós, brasileiros, somos afetos à corrupção. Afinal, não só recorremos rotineiramente a ela como também ficamos impassíveis quando esquemas de desvio de dinheiro público ou de cobrança de propina se descortinam ante nossos olhos.
No caso do Amapá, por exemplo, é chocante não só ver que governador e ex-governador são soltos depois de ficarem apenas uma semana presos, como os dois acusados são recebidos com festa por 20 mil pessoas ao chegarem em seus estados.
São 20 mil pessoas comemorando a soltura e a volta para casa de alguém que é acusado de roubar dinheiro de seu bolso, dinheiro que seria usado para dar educação e um futuro melhor a seus filhos.
É como se você tivesse sua casa arrombada por um bandido e todos seus bens, surrupiados. E, depois de uma semana, recebesse esse bandido com uma grande feijoada em sua homenagem. E mais, ainda aceitasse que esse mesmo bandido voltasse a gerenciar suas economias e suas vidas.
É realmente assombroso ver também, por exemplo, como um deputado federal do maior estado brasileiro, acusado em diversos processos de desvio de verbas públicas e envio desse dinheiro para contas em paraísos fiscais.
E esse mesmo deputado não só circula solto pela nossa sociedade como é eleito e reeleito para representar as mesmas pessoas que foram roubadas por ele na Câmara dos Deputados. E o pior, esse deputado nunca é condenado, porque seus processos caducam no vagaroso (de forma proposital) trâmite das altas cortes do país.
Não podemos nos esquecer das últimas denúncias de tráfico de influência dentro da Casa Civil, o braço direito da Presidência da República. Os exemplos de corrupção e imoralidade no país são infinitos. Vão desde o atropelador assassino que aceita pagar propina para o policial militar não prendê-lo até o filho de ministro que se usa do cargo da mãe para lucrar milhões, às custas do povo brasileiro.
Temos, portanto, duas constatações tristes sobre a corrupção no nosso país. A primeira é a impunidade, que, em geral, beneficia apenas aqueles que tem poder político e econômico no nosso país. A segunda é a relação amistosa (e até amorosa) que o povo brasileiro tem com a corrupção.
Uma das explicações para isso estaria no fato de que o Estado brasileiro nunca existiu de fato. Desde os tempos da colônia, em que fomos divididos em capitanias hereditárias (e privadas) somos um país dominado por interesses particulares.
Em minha opinião, o Estado brasileiro nunca funcionou com o objetivo de proporcionar o bem-estar da sociedade. O Brasil sempre serviu aos interesses daqueles que detêm o poder econômico e político no país.
São as obras milionárias voltadas para enriquecer empreiteiras (e políticos), são os projetos e emendas direcionados para favorecer os financiadores de campanha, são as decisões judiciais que beneficiam amigos e aqueles que podem comprar sentenças, são os hospitais públicos mantidos na pindaíba a fim de favorecer o mercado planos de saúde, é a falta de investimento em transporte alternativo para beneficiar as empresas de ônibus, é a entrada de pessoas nas estruturas públicas para buscar benefícios pessoais, é a imunidade parlamentar, é a prisão especial para quem tem ensino superior, é a inviolabilidade do juiz etc.
Os exemplos de interesses particularistas que dominam o Estado brasileiro são inúmeros e não faz sentido ficar enumerando-os todos aqui.
O que importa aqui é que isso vem sendo feito aqui no país há anos. Ou melhor, há séculos. E séculos de uso do Estado para servir a interesses particulares (de quem tem poder político e econômico) servem para minar a credibilidade de qualquer nação perante seus cidadãos.
Quem, no Brasil, pode acreditar no Estado quando o Estado serve como uma agência reguladora de interesses privados, que usa a propina e a barganha política como suas moedas oficiais?
Ninguém além daqueles poucos que se beneficiam dessa situação. A grande maioria da população não enxerga o Estado brasileiro como um representante legítimo de seus interesses e nem acredita que esse Estado sirva para garantir seus direitos fundamentais à educação, saúde, moradia, segurança, trabalho e à vida.
O que me assusta, no entanto, é que, em vez dessa grande maioria da população (que, apesar de não acreditar no Estado, o mantém funcionando com seus impostos e seus votos), se levantar e exigir que esse Estado funcione, que seus órgãos cumpram a lei e que seus representantes defendam seus interesses, ela parece querer participar do jogo-sujo.
Sem conseguir o atendimento adequado do Estado e sem receber o mesmo tratamento que o supercidadão (aquele que tem o poder político e econômico), o cidadão comum tenta recorrer às moedas oficiais do Estado Brasileiro (a corrupção, o jeitinho, a barganha política, a troca de favores, o tráfico de influência).
É o cidadão que molha a mão do PM para evitar ser multado, porque não conseguiu marcar sua vistoria do carro em tempo adequado. É o cidadão que pergunta se você conhece alguém naquela repartição pública para agilizar seu processo, já que o tempo oficial da burocracia é inacreditavelmente moroso. É o cidadão que troca seu voto para conseguir um encaminhamento cirúrgico, assinado por um político, porque a fila de espera das cirurgias naquele hospital público é gigantesca. É o cidadão que paga a propina para que a patrulinha da PM estacione em frente a sua loja, já que o Estado não garante sua segurança por meios normais.
O problema é que, ao recorrer ao jogo-sujo, o cidadão cria um círculo vicioso dentro do Estado brasileiro, onde tudo só se resolve pela via ilegal, pela via da propina. O cidadão perde a oportunidade de mudar a realidade social do país, perde a oportunidade de exigir o cumprimento do princípio constitucional de igualdade para todos.
Mas por que estou escrevendo sobre isso em um blog de Segurança Pública? Justamente porque eu acredito que a ineficácia do Estado, a corrupção, os privilégios concedidos a supercidadãos, o jogo sujo político, entre outros males, contribuem para criar uma sociedade doente.
E sociedades doentes tendem a desenvolver sintomas desagradáveis como a violência. E os sintomas não desaparecem enquanto a sociedade estiver doente. Não adiantam Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), investigações policiais, aumento de efetivo da polícia, criação de batalhões, metas de redução de crimes etc.
Nada disso melhora o sintoma, enquanto há um Estado desacreditado, uma grande desigualdade entre os cidadãos e uma população que acredita que a via adequada para se resolver problemas é a VIA ILEGAL.
A violência é apenas uma conseqüência...
terça-feira, 14 de setembro de 2010
Cerca de 480 presos provisórios deverão votar nas eleições deste ano no Rio
As eleições deste ano no Rio contarão com o voto de 478 presos provisórios, que estão detidos em nove carceragens e unidades socioeducativas do estado. Entre os eleitores que estão nessa situação, 167 são jovens infratores. Os dados foram divulgados pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Segundo as leis brasileiras, presos que ainda não tenham sido condenados mantêm seus direitos políticos. A documentação dos presos, para que eles possam votar, foi garantida por meio de uma parceria da Procuradoria Regional Eleitoral com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Para garantir os mesários nessas carceragens, o corregedor regional eleitoral do Rio, juiz Luiz de Mello Serra, explica que o TRE pediu ajuda a outros órgãos públicos e à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
“Por meio de um ato, pediu-se apoio às comunidades, como a Ordem dos Advogados, como a Defensoria Pública, aos próprios guardas penitenciários e às pessoas que trabalham nessas unidades prisionais. É um grupo grande de pessoas envolvidas que vão trabalhar como mesários nesses locais”, disse Serra.
O TRE instalará urnas apenas nas carceragens que têm, pelo menos, 20 eleitores: as unidades para jovens infratores João Luiz Alves, Santo Expedito e de Belford Roxo, e as carceragens da Polícia Civil de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, São Gonçalo, São João de Meriti, Mesquita e Araruama.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
Segundo as leis brasileiras, presos que ainda não tenham sido condenados mantêm seus direitos políticos. A documentação dos presos, para que eles possam votar, foi garantida por meio de uma parceria da Procuradoria Regional Eleitoral com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Para garantir os mesários nessas carceragens, o corregedor regional eleitoral do Rio, juiz Luiz de Mello Serra, explica que o TRE pediu ajuda a outros órgãos públicos e à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
“Por meio de um ato, pediu-se apoio às comunidades, como a Ordem dos Advogados, como a Defensoria Pública, aos próprios guardas penitenciários e às pessoas que trabalham nessas unidades prisionais. É um grupo grande de pessoas envolvidas que vão trabalhar como mesários nesses locais”, disse Serra.
O TRE instalará urnas apenas nas carceragens que têm, pelo menos, 20 eleitores: as unidades para jovens infratores João Luiz Alves, Santo Expedito e de Belford Roxo, e as carceragens da Polícia Civil de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, São Gonçalo, São João de Meriti, Mesquita e Araruama.
*Reportagem publicada na Agência Brasil
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
Programa Dedic será expandido... para a zona sul: Mais um capítulo de nossa política seletiva (e excludente) de segurança
Expansão do programa, que já funciona em áreas nobres do estado, para outras áreas nobres, mostra que nossas políticas de segurança cidadãs só beneficiam as classes mais altas
Li no jornal O Globo que o Programa de Dedicação Integral ao Cidadão (Dedic), uma ideia promissora da Polícia Civil, vai se expandir para o restante do estado, depois de seis meses de experiência na zona sul e Tijuca. Adivinha para onde o programa será levado nesta segunda etapa?
Não precisa pensar muito. Pensa para onde são levadas as principais políticas de segurança e ordem públicas no Rio de Janeiro. Pensa onde foram implantadas as operações de choque de ordem, onde existem os maiores efetivos policiais, onde existem câmeras de monitoramento de segurança, onde foram instaladas as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), enfim para onde o Estado sempre olha com carinho.
Se você pensou na zona sul e outras áreas mais nobres da cidade (Barra e arredores e Tijuca) acertou.
Está claro que uma política de atendimento integral ao cidadão jamais chegará primeiro (se é que chegará) ao subúrbio, à zona oeste, à Baixada, ao Grande Rio ou ao interior.
Para quem não sabe, o Dedic é um programa da Polícia Civil que permite ao cidadão pré-registrar uma ocorrência pela internet e depois receber o inspetor policial em sua própria casa, para finalizar o registro.
O programa foi iniciado nas delegacias de... (adivinhem)... Copacabana, Leblon, Gávea, Barra, Tijuca e Icaraí (área nobre de Niterói)...
Campo Grande também foi contemplado, mas imagino que seja muito mais para ocultar uma a preferência escancarada à zona sul do que por genuína intenção de melhorar a vida do cidadão de “Big Field”.
Agora, na anunciada expansão do Dedic para o “resto da cidade”, leio no Globo, que os próximos felizardos a receberem o programa de “dedicação integral” são os moradores de... (tchan, tchan, tchan, tchan!!!)... Ipanema, Recreio, Flamengo, Botafogo e Vila Isabel...
Claro, Taquara e Tanque (em Jacarepaguá) também vão receber o programa. Mas lembrem-se de que é lá que ficam os novos projetos imobiliários nobres da cidade e é lá que ficará o coração das Olimpíadas Rio 2016.
Nenhuma novidade. Subúrbio, zona oeste, Grande Rio e interior vão ser beneficiados depois (sabe-se lá Deus quando), segundo informação do chefe da Polícia Civil, Alan Turnowski.
É a mesma lorota contada pelo nosso governador Sérgio Cabral, que, em campanha em busca da reeleição, continua ludibriando a população, dizendo que vai levar as UPP para TODO o estado, quando isso (comprovadamente) não está em seus planos.
Nossa história mostra que cidadãos mais pobres, que sempre foram tratados como pessoas de segunda classe por nossas autoridades públicas, não costumam receber tal tratamento VIP.
Você por acaso imagina um morador de Costa Barros ou de Acari sendo tão bem tratado pelo nosso Estado. Olhando para o atual governo estadual e para todos os demais que o precederam, não consigo imaginar isso.
Pelo contrário. Consigo imaginar esses cidadãos esperando quatro horas numa delegacia e sendo mal tratado pelo policial. Consigo imaginar também esse cidadão tendo seus filhos mortos pela polícia, com projéteis de fuzis que foram pagos com o dinheiro de seus próprios impostos. Mas não os vejo sendo tão bem tratados pelo Estado.
O engraçado é que, quem elege nossos governadores, prefeitos, deputados, senadores e outras espécies parasitárias eleitorais, são sempre as populações mais pobres (porque somam mais eleitores).
Mas uma vez terminadas as eleições, essas pessoas nunca vêem o Rio dos Benefícios irrigando suas vidas. Nossos políticos sempre tratam de desviar esses rios, com programas de transposição, para as áreas da cidade onde vivem e transitam seus financiadores de campanha.
Enfim, essa é uma história que se repete no nosso Rio de Janeiro e no nosso Brasil como um todo.
Li no jornal O Globo que o Programa de Dedicação Integral ao Cidadão (Dedic), uma ideia promissora da Polícia Civil, vai se expandir para o restante do estado, depois de seis meses de experiência na zona sul e Tijuca. Adivinha para onde o programa será levado nesta segunda etapa?
Não precisa pensar muito. Pensa para onde são levadas as principais políticas de segurança e ordem públicas no Rio de Janeiro. Pensa onde foram implantadas as operações de choque de ordem, onde existem os maiores efetivos policiais, onde existem câmeras de monitoramento de segurança, onde foram instaladas as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), enfim para onde o Estado sempre olha com carinho.
Se você pensou na zona sul e outras áreas mais nobres da cidade (Barra e arredores e Tijuca) acertou.
Está claro que uma política de atendimento integral ao cidadão jamais chegará primeiro (se é que chegará) ao subúrbio, à zona oeste, à Baixada, ao Grande Rio ou ao interior.
Para quem não sabe, o Dedic é um programa da Polícia Civil que permite ao cidadão pré-registrar uma ocorrência pela internet e depois receber o inspetor policial em sua própria casa, para finalizar o registro.
O programa foi iniciado nas delegacias de... (adivinhem)... Copacabana, Leblon, Gávea, Barra, Tijuca e Icaraí (área nobre de Niterói)...
Campo Grande também foi contemplado, mas imagino que seja muito mais para ocultar uma a preferência escancarada à zona sul do que por genuína intenção de melhorar a vida do cidadão de “Big Field”.
Agora, na anunciada expansão do Dedic para o “resto da cidade”, leio no Globo, que os próximos felizardos a receberem o programa de “dedicação integral” são os moradores de... (tchan, tchan, tchan, tchan!!!)... Ipanema, Recreio, Flamengo, Botafogo e Vila Isabel...
Claro, Taquara e Tanque (em Jacarepaguá) também vão receber o programa. Mas lembrem-se de que é lá que ficam os novos projetos imobiliários nobres da cidade e é lá que ficará o coração das Olimpíadas Rio 2016.
Nenhuma novidade. Subúrbio, zona oeste, Grande Rio e interior vão ser beneficiados depois (sabe-se lá Deus quando), segundo informação do chefe da Polícia Civil, Alan Turnowski.
É a mesma lorota contada pelo nosso governador Sérgio Cabral, que, em campanha em busca da reeleição, continua ludibriando a população, dizendo que vai levar as UPP para TODO o estado, quando isso (comprovadamente) não está em seus planos.
Nossa história mostra que cidadãos mais pobres, que sempre foram tratados como pessoas de segunda classe por nossas autoridades públicas, não costumam receber tal tratamento VIP.
Você por acaso imagina um morador de Costa Barros ou de Acari sendo tão bem tratado pelo nosso Estado. Olhando para o atual governo estadual e para todos os demais que o precederam, não consigo imaginar isso.
Pelo contrário. Consigo imaginar esses cidadãos esperando quatro horas numa delegacia e sendo mal tratado pelo policial. Consigo imaginar também esse cidadão tendo seus filhos mortos pela polícia, com projéteis de fuzis que foram pagos com o dinheiro de seus próprios impostos. Mas não os vejo sendo tão bem tratados pelo Estado.
O engraçado é que, quem elege nossos governadores, prefeitos, deputados, senadores e outras espécies parasitárias eleitorais, são sempre as populações mais pobres (porque somam mais eleitores).
Mas uma vez terminadas as eleições, essas pessoas nunca vêem o Rio dos Benefícios irrigando suas vidas. Nossos políticos sempre tratam de desviar esses rios, com programas de transposição, para as áreas da cidade onde vivem e transitam seus financiadores de campanha.
Enfim, essa é uma história que se repete no nosso Rio de Janeiro e no nosso Brasil como um todo.
sexta-feira, 27 de agosto de 2010
Estado do Rio de Janeiro não cria seu conselho estadual de políticas de drogas e compromete estratégias contra o tráfico
Senad lamenta a inexistência do conselho, que envolve governo e sociedade na luta contra as drogas, no estado do Rio e diz que políticas de prevenção e recuperação de usuários fica comprometida
Ontem tive a oportunidade de participar da abertura da II Conferência Latinoamericana sobre Drogas, que aconteceu na Faculdade de Direito da UFRJ. Assisti à abertura como jornalista, pois fazia a cobertura do evento pela agências de notícias onde trabalho.
Durante a abertura, a fala de um dos palestrantes de me chamou a atenção. Tratou-se do secretário nacional de Políticas sobre Drogas da Presidência da República, o general Paulo Roberto Uchoa.
Apesar de pertencer a um governo aliado do governo estadual do Rio de Janeiro, Uchoa lamentou profundamente a inexistência de um conselho estadual para políticas de drogas no estado do Rio.
General Uchoa disse que, sem os conselhos estaduais funcionando, o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas não vai funcionar com êxito. A instituição do sistema foi determinada pela Lei Antidrogas brasileira (11.343 de 2006).
De acordo com a lei, o sistema tem a finalidade de articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com:
I - a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
II - a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas.
Segundo o general, para que o sistema tenha êxito, é preciso que estados, como o Rio de Janeiro, tenham seus conselhos de políticas para as drogas funcionando.
Para Uchoa, sem o conselho funcionando, fica difícil bolar estratégias de prevenção (a prevenção é o que impede o surgimento de novos usuários de drogas) e recuperação de usuários.
Se entendi bem o que falou o czar da luta contra as drogas no Brasil, sem o conselho estadual, as estratégias de redução da demanda por entorpecentes no Rio de Janeiro ficam capengas.
E especialistas são quase unânimes em afirmar que, enquanto houver demanda, haverá tráfico de drogas. Ou seja, por mais que se combata a oferta de drogas, o tráfico não acabará, porque sempre haverá uma forma de levar o produto proibido ao público consumidor.
O paradoxo dessa história é que o governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, se gaba de estar combatendo, sem trégua, o tráfico.
Espera aí. Se Cabral não criou o conselho estadual de políticas sobre drogas (Lembre-se que o sistema nacional dos conselhos de segurança é uma proposta da lei de 2006. Cabral assumiu em 2007 e passou um mandato inteiro sem criar o conselho). Se a Senad diz que, sem o conselho, a política de redução da demanda fica comprometida. Se os especialistas dizem que o tráfico não acaba enquanto houver demanda. Como o governador pode dizer que o estado do Rio de Janeiro está combatendo o tráfico sem trégua?
Uma política contra as drogas que não se orienta para a redução da demanda é como se fosse um cachorro correndo atrás do próprio rabo.
Fica óbvio que a política sobre drogas do Rio de Janeiro não está no caminho certo, por mais que o governador e a imprensa queiram nos convencer do contrário.
O que fez o governo do Rio de Janeiro em relação às drogas? Bem, basicamente duas coisas. A primeira delas foi repetir a mesma coisa que seus antecessores vinham fazendo há 20 anos. Operações policiais rotineiras na favela, com trocas de tiros, mortes, balas perdidas e sem qualquer resultado prático.
A segunda foi criar uma política chamada de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), que tomou para si o conceito de políticas anteriores, como o Gpae (Policiamento em áreas especiais), ampliou o efetivo policial (que nessas estratégias anteriores era reduzido) e passou a ocupar favelas do Rio de Janeiro.
Mas, na prática, como funcionam as UPP? As unidades pacificadoras, na prática, trabalham com a lógica da ocupação territorial. Isso significa que elas têm o objetivo básico de ocupar um território antes ocupado por uma quadrilha armada. Ou seja, elas têm expulsado as quadrilhas das favelas que elas ocupam. Isso mesmo, expulsando. Não desarticulando-as, mas expulsando-as. Que isso fique bem claro.
Além disso, são poucas as UPP para o tamanho do problema fluminense. O Rio tem entre 1.500 e 2 mil favelas controladas por grupos armados. Até hoje, apenas 35 favelas receberam UPP. A previsão da Secretaria de Segurança do estado é estender o projeto para, no máximo, cerca de 150 favelas.
Enfim, o que quero dizer aqui é que a principal política de segurança do Rio de Janeiro (as tão celebradas UPP) têm um efeito muito limitado sobre o tráfico de drogas no estado.
Elas atuam sobre o território. Mas a maioria dos criminosos envolvidos com a venda de drogas continua solta, apenas mudando de endereço. Ou permanecendo em seu endereço, mas sem usar aquele fuzilzão (recorrendo apenas a uma pistolinha para garantir seus negócios).
As UPP tampouco atacam os arsenais das quadrilhas (até porque muitas quadrilhas retiram suas armas da favela, já que o governador os avisa da ocupação policial antecipadamente). Ou seja, os grupos criminosos continuam armados e vão usar suas armas em outra freguesia.
Quanto às drogas, elas não parecem ser o foco principal das UPP, tendo em vista que a venda de entorpecentes continua nas favelas, mesmo com a ocupação policial. O próprio secretário de segurança, José Mariano Beltrame, já afirmou, em diversas ocasiões, que o objetivo das UPP não é acabar com o tráfico.
Se o quadro já não fosse ruim o suficiente, tomamos conhecimento de que o estado do Rio de Janeiro não tem uma estratégia (ou pelo menos tem uma estratégia capenga) para atacar o principal motivador do tráfico: a demanda por drogas.
Bem, sem acabar com a demanda, com as armas e com os criminosos, o que vai acontecer é que os consumidores vão comprar a droga, onde quer que ela esteja.
Por mais que você ocupe favelas, enquanto houver gente querendo fumar, cheirar ou se picar, sempre haverá espaços no estado que os criminosos possam ocupar para manter suas atividades ilegais.
Ontem tive a oportunidade de participar da abertura da II Conferência Latinoamericana sobre Drogas, que aconteceu na Faculdade de Direito da UFRJ. Assisti à abertura como jornalista, pois fazia a cobertura do evento pela agências de notícias onde trabalho.
Durante a abertura, a fala de um dos palestrantes de me chamou a atenção. Tratou-se do secretário nacional de Políticas sobre Drogas da Presidência da República, o general Paulo Roberto Uchoa.
Apesar de pertencer a um governo aliado do governo estadual do Rio de Janeiro, Uchoa lamentou profundamente a inexistência de um conselho estadual para políticas de drogas no estado do Rio.
General Uchoa disse que, sem os conselhos estaduais funcionando, o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas não vai funcionar com êxito. A instituição do sistema foi determinada pela Lei Antidrogas brasileira (11.343 de 2006).
De acordo com a lei, o sistema tem a finalidade de articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com:
I - a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
II - a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas.
Segundo o general, para que o sistema tenha êxito, é preciso que estados, como o Rio de Janeiro, tenham seus conselhos de políticas para as drogas funcionando.
Para Uchoa, sem o conselho funcionando, fica difícil bolar estratégias de prevenção (a prevenção é o que impede o surgimento de novos usuários de drogas) e recuperação de usuários.
Se entendi bem o que falou o czar da luta contra as drogas no Brasil, sem o conselho estadual, as estratégias de redução da demanda por entorpecentes no Rio de Janeiro ficam capengas.
E especialistas são quase unânimes em afirmar que, enquanto houver demanda, haverá tráfico de drogas. Ou seja, por mais que se combata a oferta de drogas, o tráfico não acabará, porque sempre haverá uma forma de levar o produto proibido ao público consumidor.
O paradoxo dessa história é que o governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, se gaba de estar combatendo, sem trégua, o tráfico.
Espera aí. Se Cabral não criou o conselho estadual de políticas sobre drogas (Lembre-se que o sistema nacional dos conselhos de segurança é uma proposta da lei de 2006. Cabral assumiu em 2007 e passou um mandato inteiro sem criar o conselho). Se a Senad diz que, sem o conselho, a política de redução da demanda fica comprometida. Se os especialistas dizem que o tráfico não acaba enquanto houver demanda. Como o governador pode dizer que o estado do Rio de Janeiro está combatendo o tráfico sem trégua?
Uma política contra as drogas que não se orienta para a redução da demanda é como se fosse um cachorro correndo atrás do próprio rabo.
Fica óbvio que a política sobre drogas do Rio de Janeiro não está no caminho certo, por mais que o governador e a imprensa queiram nos convencer do contrário.
O que fez o governo do Rio de Janeiro em relação às drogas? Bem, basicamente duas coisas. A primeira delas foi repetir a mesma coisa que seus antecessores vinham fazendo há 20 anos. Operações policiais rotineiras na favela, com trocas de tiros, mortes, balas perdidas e sem qualquer resultado prático.
A segunda foi criar uma política chamada de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), que tomou para si o conceito de políticas anteriores, como o Gpae (Policiamento em áreas especiais), ampliou o efetivo policial (que nessas estratégias anteriores era reduzido) e passou a ocupar favelas do Rio de Janeiro.
Mas, na prática, como funcionam as UPP? As unidades pacificadoras, na prática, trabalham com a lógica da ocupação territorial. Isso significa que elas têm o objetivo básico de ocupar um território antes ocupado por uma quadrilha armada. Ou seja, elas têm expulsado as quadrilhas das favelas que elas ocupam. Isso mesmo, expulsando. Não desarticulando-as, mas expulsando-as. Que isso fique bem claro.
Além disso, são poucas as UPP para o tamanho do problema fluminense. O Rio tem entre 1.500 e 2 mil favelas controladas por grupos armados. Até hoje, apenas 35 favelas receberam UPP. A previsão da Secretaria de Segurança do estado é estender o projeto para, no máximo, cerca de 150 favelas.
Enfim, o que quero dizer aqui é que a principal política de segurança do Rio de Janeiro (as tão celebradas UPP) têm um efeito muito limitado sobre o tráfico de drogas no estado.
Elas atuam sobre o território. Mas a maioria dos criminosos envolvidos com a venda de drogas continua solta, apenas mudando de endereço. Ou permanecendo em seu endereço, mas sem usar aquele fuzilzão (recorrendo apenas a uma pistolinha para garantir seus negócios).
As UPP tampouco atacam os arsenais das quadrilhas (até porque muitas quadrilhas retiram suas armas da favela, já que o governador os avisa da ocupação policial antecipadamente). Ou seja, os grupos criminosos continuam armados e vão usar suas armas em outra freguesia.
Quanto às drogas, elas não parecem ser o foco principal das UPP, tendo em vista que a venda de entorpecentes continua nas favelas, mesmo com a ocupação policial. O próprio secretário de segurança, José Mariano Beltrame, já afirmou, em diversas ocasiões, que o objetivo das UPP não é acabar com o tráfico.
Se o quadro já não fosse ruim o suficiente, tomamos conhecimento de que o estado do Rio de Janeiro não tem uma estratégia (ou pelo menos tem uma estratégia capenga) para atacar o principal motivador do tráfico: a demanda por drogas.
Bem, sem acabar com a demanda, com as armas e com os criminosos, o que vai acontecer é que os consumidores vão comprar a droga, onde quer que ela esteja.
Por mais que você ocupe favelas, enquanto houver gente querendo fumar, cheirar ou se picar, sempre haverá espaços no estado que os criminosos possam ocupar para manter suas atividades ilegais.
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